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'O Leão de Sete Cabeças', longa de Glauber no exílio, é tema de coleção

Volume da Coleção Folha chega às bancas em 2 de setembro

O ator francês Jean-Pierre Léaud (centro) em cena do filme ‘O Leão de Sete Cabeças’ -  Divulgação
Cristiane Martins
São Paulo

Nenhum cineasta brasileiro alcançou tanto prestígio e reconhecimento quanto o baiano Glauber Rocha, morto precocemente aos 42 anos, em 1981.

"Seus filmes continuam sendo, ainda hoje, os mais estudados de todo o cinema brasileiro, os mais respeitados pela melhor crítica e pela melhor historiografia", escreve o crítico Mateus Araújo em livro que acompanha o sexto volume da Coleção Folha Grandes Diretores no Cinema.

A edição, que chega às bancas em 2 de setembro, apresenta ao leitor um DVD de "O Leão de Sete Cabeças" (1970), primeiro longa de Glauber no exílio durante a ditadura militar, e um volume com textos que analisam sua produção.

Após receber em 1969 o prêmio de direção no Festival de Cannes por "O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro", Glauber se valeu do prestígio crescente para conseguir financiamento estrangeiro para seu próximo longa.

"O Leão de Sete Cabeças" foi filmado no Congo com uma equipe que mescla atores profissionais, a exemplo do francês Jean-Pierre Léaud (o Antoine Doinel dos longas de François Truffaut), não profissionais e figurantes.

O filme se passa em um país indeterminado da África, no qual o povo negro é oprimido por um governador de traços germânicos e seus aliados, como um padre branco, um agente americano e um político negro demagógico.

A resistência ao colonialismo é liderada por um negro chamado Zumbi e o guerrilheiro branco Pablo, que remete a Che Guevara.

Glauber alterna a trama de figuras simbólicas marcadas (colonizadoras e libertárias) com cenas de dança de membros do levante e outras demonstrações culturais, fragmentando como de costume a linha narrativa do longa.

"O filme é radicalmente contra a linguagem do cinema imperialista, ou seja, não tem a narração convencional de personagens psicológicos. Não tem conflitos internos da psicologia da ficção tradicional", explica o diretor no livro "Glauber Rocha: Esse Vulcão", de João Carlos Teixeira Gomes.

O radicalismo passa também por Eduardo Escorel, montador de outros longas do cineasta ("Terra em Transe", de 1967, entre eles) que dialogava com outras escolas, como a nouvelle vague francesa e o realismo soviético mudo.

Prolífico e precoce, Glauber desde os 16 anos produziu roteiros, livros, ensaios, peças de teatro, poesia, críticas cinematográficas e manifestos. Foram quase 20 filmes, quatro deles exibidos no Festival de Cannes, na França.

À frente do movimento conhecido como cinema novo, defendia o caráter ideológico de sua produção, a fim de conscientizar o povo e transformar a realidade cultural e política do país.

"O cinema dele não é a exposição de um programa, mas a caldeira de um pensamento em ação. E, se olha para o futuro, é por causa da violência destruidora com que se desfaz do passado", escreveu o crítico argentino David Oubiña.

Para Martin Scorsese, em artigo na revista Cahiers du Cinéma, o cineasta "não se contentava em pegar uma história e desenvolvê-la: ele criava, de fato, uma tapeçaria frenética feita de dor, de raiva e de sofrimento humano que ele observava em volta, no trabalho de tecer de sua grande inteligência".

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