Com destaque para o bloco asiático, seleção do Indie consegue surpreender

Além do novo de Lav Diaz, festival traz ao CineSesc o sensorial Longa Jornada Noite Adentro

Cássio Starling Carlos
São Paulo

A tradicional temporada de festivais do segundo semestre ganha corpo nesta semana com o Indie largando à frente da pirataria e exibindo, de 12 a 19 de setembro no CineSesc, 14 títulos vistos há poucos meses nas seleções de Berlim, Roterdã, Sundance, Cannes e Locarno.

O cobertor cada vez mais curto dos patrocínios, que forçou o adiamento do Festival do Rio, também compromete eventos menores. Embora esteja mais magra e sem a habitual retrospectiva de um autor raro, a programação do Indie deste ano não deixa de lado a vocação para surpreender.

O bloco asiático é o principal destaque. Depois de dois anos em silêncio, Lav Diaz retorna com “Estação do Diabo”, no qual reconstitui episódios de desaparecimentos, execuções e torturas nas Filipinas, quando o ditador Ferdinando Marcos implantou uma lei marcial que suspendeu os direitos civis em 1972.

O passado se confunde com o presente do regime linha-dura do atual presidente, Rodrigo Duterte, no uso cíclico e dilatado que Diaz faz do tempo em seus filmes. Aqui, os diálogos cantados são uma escolha que, em vez de amenizar, intensifica o terror.

O outro lado da abundância chinesa aparece em “Um Elefante Sentado Quieto”, primeiro e último longa de Hu Bo, que se suicidou aos 29 anos após finalizá-lo. Seu gesto radical se anuncia na crônica desesperada de três personagens acuados, símbolos negativos do êxito a qualquer preço.

Os devotos de experimentalismos narrativos devem engrossar a fila de “Longa Jornada Noite Adentro”, mistério sensorial do chinês Bi Gan, que culmina com uma sequência sem cortes de 45 minutos em 3D.

Integrante da seção Um Certo Olhar deste ano em Cannes, o filme é, para os mais entusiasmados, “um inesperado fruto do encontro de Wong Kar-wai com Andrei Tarkóvski”, enquanto céticos viram nele “muito estilo e nenhuma substância”.

Cena do filme “Estação do Diabo”, do filipino Lav Diaz
Cena do filme “Estação do Diabo”, do filipino Lav Diaz - Divulgação

Os eternos retornos da história são tratados em duas ficções de base documental. “Os Indesejados da Europa” percorre a trilha nos Pireneus usada em 1939 pelos militantes antifascistas em fuga das forças franquistas ao final da Guerra Civil Espanhola. Um ano depois, outra leva de perseguidos, entre os quais o filósofo Walter Benjamin, utilizou o mesmo trecho na tentativa de escapar dos nazistas.

“Lamaland” retorna a Nova Germânia e descobre dois descendentes de sobreviventes do projeto de colônia ariana que Elisabeth, irmã de Nietzsche, pretendeu fundar com o marido na selva paraguaia no final do século 19.

Dois trabalhos inclassificáveis reiteram a vocação do Indie de exibir obras que expandem os limites do cinema.

O filme “ ★ ​” (o nome é grafado apenas com o símbolo), do austríaco Johann Lurf, reúne imagens de estrelas extraídas de mais de 500 filmes. Das colagens baratas do primeiro cinema às formas mais que perfeitas geradas por computador, as massas luminosas celestes são arrancadas do contexto narrativo para reconfigurar um mapa vertiginoso da história do cinema.

A exibição das três partes de “La Flor” é talvez a única oportunidade de conhecer o projeto monstruoso do argentino Mariano Llinás. 

Filmado ao longo de nove anos e com um total de quase 14 horas, “La Flor” traduz para o cinema a paixão dos argentinos por narrativas desmesuradas, com tramas que se bifurcam, personagens contrabandeados e superposições de gêneros. Não custa lembrar que não vai estrear no Netflix daqui a pouco e talvez nunca.

Festival Indie
Abertura na quarta (12), às 20h30, no CineSesc, r. Augusta, 2.075. Até 19/9. Programação em indiefestival.com.br. Ingr.: R$ 12

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