Performance e realidade se misturam em produção do artista Nuno Ramos

De fones de ouvido, atores reproduzem ao vivo falas dos candidatos no debate da TV Globo

Ensaio da performance do artista visual Nuno Ramos - Bruno Santos/ Folhapress
Fernando Tadeu Moraes
São Paulo

A flauta introduz uma melodia hipnótica; no centro do palco, oito pessoas cercam uma mulher, toda vestida de branco, emparedando-a. Após alguns minutos, alguém anuncia o início do debate de candidatos à Presidência na TV Globo, o último antes do primeiro turno. 

A jaula humana então se desfaz e cada um se dirige para seu microfone, dispostos em forma de círculo. Eles colocam o terno e se tornam candidatos à Presidência do país. 

Os oito atores, de fones de ouvido, passam imediatamente a reproduzir ao vivo as falas dos candidatos. A mulher, liberta no centro do palco, inicia uma ininterrupta dança giratória. 

Na nova performance criada pelo artista Nuno Ramos, apresentada nesta quinta (4) no Galpão do Folias, os políticos se defrontam com uma dervixe (representada pela bailarina) —figura da vertente sufi do islamismo associado ao ascetismo e ao desprendimento de bens materiais.

O público lotou o espaço, pontuando com frequentes risos algumas das falas, como quando Henrique Meirelles se atrapalhou com o microfone, mas também com palmas, como quando Guilherme Boulos fala do risco de uma ditadura.


Performance e realidade se interpenetram. Em certo ponto, Ciro Gomes, tendo em frente a bailarina giratória, diz que o país dança à beira do abismo.

Em momentos escolhidos aleatoriamente por Ramos, uma sirene toca e os atores mudam de lugar, assumindo o papel de novos candidatos. 

Com as falas despersonalizadas, os candidatos se confundem, e após quase três horas de debate chega a ser difícil identifica-los apenas por seu discurso. O resultado é vertiginoso.

No final, os atores se retiram e a dervixe, de braços abertos, rodopiando sem parar no centro do palco, faz lembrar uma bússola desorientada, imagem que cabe bem para a situação errática em que o país se encontra hoje.

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