Weiwei transforma encontro com Pistoletto em misto de performance e birra

Grandes nomes da arte contemporânea, os dois se reuniram neste domingo no Sesc Pinheiros

Nina Rahe
São Paulo

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O primeiro encontro entre o chinês Ai Weiwei e o italiano Michelangelo Pistoletto aconteceu na manhã deste domingo (21) nos corredores do Sesc Pinheiros.

Ali, os dois grandes nomes da arte contemporânea fizeram elogios sobre a estatura e a aparência física um do outro antes de protagonizarem o bate-papo que durou cerca de uma hora.

“É o momento da selfie”, exclamou de imediato Marcello Dantas, curador tanto da exposição que Weiwei acaba de abrir na Oca, em São Paulo, quanto da individual que Pistoletto inaugura nesta semana no Museu de Arte Contemporânea do Chile.

weiwei e pistoletto de costas
Os artistas Ai Weiwei e Michelangelo Pistoletto, em imagem publicada no Instagram do chinês - Reprodução/Instagram

Com o pedido, Weiwei viu logo a oportunidade de pegar emprestado o chapéu de Pistoletto para sair melhor na foto, despindo o italiano do adereço que se tornou quase indissociável de sua figura.

Dantas, responsável pela mediação do papo, pediu então que os artistas esperassem no camarim enquanto faria uma breve apresentação do trabalho dos dois.

Mas Weiwei se negou: “Por que nós temos que esperar? Foda-se a formalidade”, disse, recusando-se, em um primeiro momento, a se sentar na plateia ao lado de Pistoletto e, depois, a ocupar a cadeira a ele reservada no palco.

“Ficarei em pé aqui, ao lado de Pistoletto”, disse diante do público, antes de decidir, enfim, ceder. Deixou claro, já nesse momento, o tom que adotaria durante o debate —um misto de performance artística e birra infantil.

Do outro lado, Pistoletto, considerado um dos principais expoentes do movimento artístico arte povera, na década de 1960, respondeu com seriedade a perguntas sobre o início de um trabalho pautado por ações sociais: “No momento que realizei minhas 'pinturas de espelho' [obras em que o artista usa superfícies com acabamento espelhado], percebi que ali havia o infinito, mas isso me fez querer olhar para o finito, a vida que levamos dentro do infinito.”

À mesma questão, Weiwei respondeu: “Não ligo realmente para as ações sociais, mas queria estar envolvido, fazer parte”, arrancando risos da plateia e obrigando Dantas a formular outra pergunta: “Fale-me então sobre suas ações performáticas”.

E Weiwei continuou: “Você come, dorme, sonha, às vezes transa. Sou uma pessoa viva, tudo que faço é performance. Coloco água aqui e pode ser uma performance. As pessoas pensam que está cheio, mas não está cheio ainda”, completou, enquanto a água que despejava no copo começava a transbordar.

pistoletto no palco
Imagem publicada no Instagram de Weiwei mostra Pistoletto e água derramada no chão do palco do Sesc Pinheiros - Reprodução/Instagram

“Ele está fazendo piadas, mas é muito sério”, Pistoletto interferiu. E assim fez o público lembrar que estava diante do artista que se tornou um dos principais opositores do governo chinês e realizou, nos últimos anos, uma grande quantidade de trabalhos sobre a crise dos refugiados —a instalação "Law of the Journey", exposta na Oca, é só um dos exemplos.

À sucessão de respostas jocosas ou de espantosa economia de palavras, Dantas procurou introduzir questões mais complexas. Perguntou, por exemplo, o que justifica o crescimento do fascismo nos dias atuais.

“Acho que é parte da natureza humana”, resumiu Weiwei antes de questionar: “Por que os artistas precisam responder a esse tipo de pergunta?”

Pistoletto, de novo, continuou sozinho: “O significado da palavra democracia é dar poder às pessoas. Mas como você coloca as pessoas juntas para criar uma organização comum? Esse é o problema. A gente tem essa perspectiva ideológica, só que quando as pessoas possuem poder, elas trabalham por si próprias e não mais para os outros”.

Mas, assim como Ai Weiwei —que disse que, se não fosse artista, seria comediante— a plateia não estava no clima para assuntos sérios. Antes mesmo de Dantas terminar a frase dizendo que todo mundo gostaria de saber o que eles pensam sobre as eleições presidenciais, parte do público já começou a ecoar um “não”. Os dois, então, seguiram sem responder.

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