Descrição de chapéu

Documentário sobre Burle Marx faz com que o público quase sinta algum aroma herbal

Filme se concentra na produção e na filosofia criativa do humanista que amava a botânica

Bruno Ghetti
Veneza

Filme Paisagem – Um Olhar Sobre Roberto Burle Marx

  • Classificação Livre
  • Direção João Vargas Penna

O pequeno Roberto tinha só 9 anos quando ganhou de uma tia uma planta rara, da espécie Alocasia cuprea. Ficou tão emocionado com o presente que, naquela noite, não conseguiu pregar os olhos.

Uma criança de comportamento tão incomum já mereceria um documentário, mas depois de adulto se tornaria um tema ainda melhor: viraria um dos maiores paisagistas do planeta e também um grande artista plástico, além do descobridor de ao menos 30 novas espécies de plantas.

Em “Filme Paisagem – Um Olhar Sobre Roberto Burle Marx”, o diretor João Vargas Penna discorre sobre a trajetória do arquiteto/paisagista mencionado no título, com foco em sua produção e sua filosofia criativa.
 

Uma narração em primeira pessoa (na voz de Amir Haddad) sugere o depoimento de um Burle Marx no fim da vida, rememorando sua história e revelando seu pensamento sobre seu ofício, que mesclava humanismo e amor pela botânica. Muitas das falas complementam verbalmente visitas a algumas das criações mais importantes do paisagista, entre parques, calçadas e jardins de cidades como Rio, Recife e Paris. O longa inclui também cenas de arquivo do próprio Burle Marx e trechos reencenados alusivos a episódios de sua vida.

Como Burle Marx, o diretor tem apreço especial pelas plantas brasileiras, que surgem particularmente vistosas, altivas. E Penna busca filmá-las de modo que as imagens instiguem respostas sensoriais dos espectadores, como se estivessem diante daquela vegetação.

Às vezes, o cineasta de fato consegue que o público quase sinta algum aroma herbal ou perceba a textura de alguma pétala. Mas filmar paisagens criadas pela intervenção humana tem lá suas limitações, que estão implícitas em uma frase do próprio Burle Marx: “O jardim é a natureza organizada”.


Ou seja: vegetais em ambientes ordenados pelo homem se ressentem de um tipo extra de vitalidade —de selvageria, de luta por sobrevivência —que é quase exclusiva das plantas que vivem no caos da natureza bruta, intocada. Já por definição, o longa de Penna estava fadado a enfrentar esse desafio.

A locução avoenga de Haddad é uma escolha coerente, e por grande parte do filme funciona bem. Mas a longo prazo, sua combinação com as imagens tem um efeito um tanto soporífero; por fim, vê-se que as plantas eram mesmo o elemento mais vivaz do filme.

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