Evento sobre economia criativa trata de como a cultura melhora cidades

Gestores de programas no Reino Unido e na Colômbia estão entre palestrantes do MICBR 2018

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Biblioteca España, na cidade colombiana de Medellín, onde unidades como esta colaboraram para alterar índices de criminalidade; prédios da biblioteca parecem grandes rochas negras, enormes contra o panorama da favela onde se localizam, no alto de um morro
Biblioteca España, na cidade colombiana de Medellín, onde unidades como esta colaboraram para alterar índices de criminalidade - Divulgação
São Paulo

“Para ter uma empresa hoje, o que você precisa é de um smartphone e de um cachorro. O cachorro para acordá-lo de manhã, e o smartphone para fazer negócios”, diz John Newbigin.

Ele é hoje um dos maiores especialistas em economia criativa, credencial obtida quando assessorou o ministro da Cultura britânico na implantação de políticas públicas para o setor, nos anos 1990. 

Naquela década, ele viu como cidades podem ser requalificadas por meio da economia criativa —tema sobre o qual vai falar em São Paulo, em palestra no Mercado das Indústrias Criativas do Brasil.

O evento, que ocupa diversos espaços da cidade entre os dias 5 e 11 de novembro, tem por objetivo gerar negócios no setor econômico que compreende atividades como design, moda, games e música, todas fortemente influenciadas pelas tecnologias digitais. 

Segundo Newbigin, quando lideranças locais colaboram com artistas —por exemplo, ao disponibilizar espaços de trabalho por preços acessíveis em prédios abandonados—, o resultado é a revitalização de regiões degradadas. 

Ele cita como exemplo bem-sucedido o caso da Custard Factory, em Birmingham, segunda maior cidade inglesa. 

Uma iniciativa público-privada renovou a fábrica de alimentos abandonada pelos seus proprietários após o racionamento e os limites de produção impostos pela Segunda Guerra, conforme explica o site do local. O retrofit tornou o prédio atrativo para profissionais criativos.

Inaugurada em 1993, a “fábrica” abriga atualmente 500 negócios, entre eles lojas independentes e festivais. O resultado foi a valorização do antes deteriorado bairro de Digbeth. “Esse exemplo pode ser repetido em todas as cidades da Europa”, afirma Newbigin. 

Mas e na América Latina? Para o especialista, é falso acreditar que países ricos tenham mais chances de desenvolverem seus setores criativos do que economias emergentes. Ele cita estudos da União Europeia segundo os quais o crescimento mais rápido do setor se dá nos países latinos, na África e na Ásia. 

O segredo para o desenvolvimento, argumenta, é baseado em um tripé: adotar leis que “valorizem a pesquisa e o desenvolvimento”, ter um sistema educacional que forme jovens “espertos, gentis e curiosos”, e lideranças políticas capazes de “entender a importância da criatividade”. 

Em países de baixa escolaridade e grande desigualdade social, como o Brasil, é importante fazer com que comunidades marginalizadas possam acessar cadeias de distribuição a partir de suas habilidades e boas ideias, independentemente do grau de instrução.

“A economia digital pode ser inclusiva. Você não precisa de um PhD para ser bem-sucedido, e sim de uma boa ideia e de networking”, diz Newbigin.

Ele diz ainda que “a rica herança brasileira no esporte e na cultura popular são ativos poderosos, que distinguem o país” perante os concorrentes. 

Estudo divulgado este ano pelo Ministério da Cultura estima que a economia criativa represente 2,6% do PIB brasileiro. Apesar de relativamente pequeno em relação ao total do PIB, o setor teve crescimento de quase 70% nos últimos dez anos.

Um exemplo latino de como as metrópoles podem ser revitalizadas por meio da cultura vem da Colômbia.

O ex-secretário de Cultura Cidadã e de Desenvolvimento Social de Medellín, Jorge Melguizo, fala no evento sobre a sua experiência com as bibliotecas-parque, que alçaram a segunda cidade do país a exemplo mundial de diminuição das taxas de criminalidade pela cultura.

As bibliotecas vêm sendo construídas em bairros pobres do município desde 2006. Mas sua função vai além do empréstimo de livros: são também parques e pontos de encontro, suprindo a falta de espaços públicos na cidade. 

Além disso, abrigam teatros, escolas de música, centros de empreendedorismo e oferecem internet de graça. Há, hoje, nove unidades em funcionamento; a mais conhecida é a España, no bairro de Santo Domingo Favio.

Melguizo explica que as bibliotecas-parque não são como “meteoritos que caem” nos bairros humildes. 
“A comunidade está envolvida desde a concepção do projeto. Todos estão engajados: crianças, jovens do primeiro ano do ensino médio, adultos. O prédio é só a manifestação visível.” 

Ele chama o processo todo de “arquitetura social” ou “arquitetura de intempérie”, por não se tratar somente da inauguração de um edifício, e sim de uma modificação mais profunda no modo de vida dos habitantes do bairro.

Os equipamentos culturais fazem parte de um plano maior, que colocou a cultura como chave no desenvolvimento de Medellín a partir de 2004 —anualmente, 5% do orçamento da cidade vai para a área, um aumento considerável em relação aos 0,63% destinados antes. 

Como resultado, a cidade, que já foi capital do cartel de Pablo Escobar, diminuiu em 95% o número de mortes violentas nos últimos 20 anos.

Mercado das Indústrias Criativas do Brasil - MICBR 2018

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