Em 1996, “A Excêntrica Família de Antônia” derrotou “O Quatrilho” na disputa pelo Oscar de melhor filme estrangeiro. No original, apenas “Antonia”. Ao que parece, ainda existem “famílias excêntricas” para atiçar o público nas traduções brasileiras.
Acaba de estrear “A Excêntrica Família de Gaspard”, terceiro longa-metragem do francês Antony Cordier. Sem o chiste do título original, que menciona um casamento ("Gaspard Va au Mariage").
A promessa de uma festa com coroinhas e cachepô dura poucos minutos. A veterinária Peggy (Marina Foïs) introduz o braço em, digamos, determinada cavidade de um animal. Peggy é da tal excêntrica família de Gaspard (Félix Moati).
O rapaz acabou de conhecer Laura (Laetitia Dosch), acorrentada em uma ferrovia durante manifestação contra experiências nucleares. Aliás, mesmo no estilo cômico, Dosch mantém a atuação trêmula pela qual ficou conhecida em “Jovem Mulher” (2017).
Gaspard convida Laura para acompanhá-lo no casamento do pai, Max (Johan Heldenbergh), um sátiro. Laura também conhece Coline (Christa Théret) e Virgile (Guillaume Gouix), irmãos de Gaspard. Todos administram um zoológico.
Aparente contradição: o libertário Max defende a permanência dos bichos no zoológico, algo que as “manifs” atuais não toleram. Já Coline imagina-se ursa. Literalmente. Carrega nas costas a pele de uma ursa e cheira pessoas.
Cordier não procura explicações cartesianas. O filme é uma coleção de gags visuais, não realistas, “tongue in cheek”, como se Amélie Poulain encontrasse Wes Anderson e explorasse conflitos familiares, até mesmo incesto.
Curioso notar que o diretor-roteirista utiliza elementos da infância –cores, histórias sobre o passado da família, invenções–, bem distante de “Duchas Frias” (2005), retrato da adolescência e seus hormônios.
No recente “A Noite Devorou O Mundo”, o diretor Dominique Rocher deixou no set brinquedos antigos do protagonista, para ambientá-lo no zombie movie. “As Boas Maneiras”, de Juliana Rojas e Marco Dutra, segue na linha de contos de fada, entre outros tantos mistérios, sempre com os pés fora do chão.
O universo infantil não é ingênuo e alegre o tempo todo. Exatamente por isso, o filme acerta ao fazer uma dedicatória à falecida atriz Christine Pascal e à diretora Catherine Breillat. Ambas carregam uma doçura triste, ausente de facilidades.
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