Descrição de chapéu

Pedro Rovai equilibrou ambição artística e desejos do espectador

Produtor de 'Tainá' e 'Qualquer Gato Vira-Lata' morreu nesta quinta (1º), aos 80 anos

Pedro Rovai, produtor de 'Tainá' e 'Qualquer Gato Vira-Lata'
São Paulo

Pedro Carlos Rovai foi um grande contador de histórias, no cinema ou fora dele. Mais do que de seus livros, tenho uma lembrança muito nítida dele contanto, durante um almoço, o dia em que um grupo de membros do cinema novo o chamou para um encontro.

Não sou capaz de lembrar de todos, mas havia uns quatro ou cinco e entre eles, seguramente, Leon Hirschman e Cacá Diegues foram citados. Eles queriam o apoio de Rovai para um “pacto com a burguesia nacional”. Ao que Rovai respondeu claro, faz todo sentido. Mas,completou, quem é a burguesia nacional? Leon saltou na frente e falou: “Você”.

Rovai contava a história ao final ria a bandeiras despregadas, com o mesmo humor que o levou a seus maiores sucessos, a começar por “A Viúva Virgem”, que criou a comédia erótica à brasileira. Impossível saber se inventou essa história ou se isso de fato aconteceu. Era, talvez, uma maneira de Rovai expressar o quanto, para ele, a política pode estar perto, ao mesmo tempo, da insânia e da galhofa.

Depois veio a comédia de costumes “Ainda Agarro Essa Vizinha”, provavelmente seu melhor filme, mais ou menos na mesma linha de sua estreia com “Adultério à Brasileira”.

Talvez fosse essa sua capacidade de se conectar com o cinema popular, de buscar e encontrar um público ao qual o cinema novo não tinha acesso, o que motivou o estranho encontro. Com efeito, Rovai vinha de outra linhagem, a de Luís Sergio Person, de quem foi assistente em “São Paulo S.A.”.

Essa intuição para o tino o conduziu ao longo dos anos 1970: como que se desinteressou pela direção e investiu com força na produção, do melhor ao pior, mas com o êxito necessário para seguir em frente. Entre outros, destacam-se filmes de Antônio Calmon (“Gente Fina É Outra Coisa”. “O Bom Marido”, “Nos Embalos de Ipanema”), adaptações de Nelson Rodrigues (“Beijo na Boca” e “Bonitinha Mas Ordinária”, ambas de Braz Chediak) ou Cassandra Rios (“Ariella”, de John Herbert).

Os anos 1980 e 90 foram de silêncio. O retorno no começo do século, no entanto, foi retumbante, com o êxito dos três filmes infanto-juvenis da série “Tainá” (2000, 2004 e 2011, respectivamente). Nem por isso deixou de lado o público mais adulto, retornando à comédia de costumes com “Qualquer Gato Vira-Lata”, 1 2 2 (2011 e 2015, respectivamente).

Num país com mórbida tendência a condenar o sucesso, Pedro Carlos Rovai, morto na última quinta feira aos 80 anos, foi um dos poucos produtores a se equilibrar por tanto tempo entre a ambição artística e o desejo dos espectadores. Um ponto fora da curva, mas a ser retido e estudado.

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