Pedro Carlos Rovai foi um grande contador de histórias, no cinema ou fora dele. Mais do que de seus livros, tenho uma lembrança muito nítida dele contanto, durante um almoço, o dia em que um grupo de membros do cinema novo o chamou para um encontro.
Não sou capaz de lembrar de todos, mas havia uns quatro ou cinco e entre eles, seguramente, Leon Hirschman e Cacá Diegues foram citados. Eles queriam o apoio de Rovai para um “pacto com a burguesia nacional”. Ao que Rovai respondeu claro, faz todo sentido. Mas,completou, quem é a burguesia nacional? Leon saltou na frente e falou: “Você”.
Rovai contava a história ao final ria a bandeiras despregadas, com o mesmo humor que o levou a seus maiores sucessos, a começar por “A Viúva Virgem”, que criou a comédia erótica à brasileira. Impossível saber se inventou essa história ou se isso de fato aconteceu. Era, talvez, uma maneira de Rovai expressar o quanto, para ele, a política pode estar perto, ao mesmo tempo, da insânia e da galhofa.
Depois veio a comédia de costumes “Ainda Agarro Essa Vizinha”, provavelmente seu melhor filme, mais ou menos na mesma linha de sua estreia com “Adultério à Brasileira”.
Talvez fosse essa sua capacidade de se conectar com o cinema popular, de buscar e encontrar um público ao qual o cinema novo não tinha acesso, o que motivou o estranho encontro. Com efeito, Rovai vinha de outra linhagem, a de Luís Sergio Person, de quem foi assistente em “São Paulo S.A.”.
Essa intuição para o tino o conduziu ao longo dos anos 1970: como que se desinteressou pela direção e investiu com força na produção, do melhor ao pior, mas com o êxito necessário para seguir em frente. Entre outros, destacam-se filmes de Antônio Calmon (“Gente Fina É Outra Coisa”. “O Bom Marido”, “Nos Embalos de Ipanema”), adaptações de Nelson Rodrigues (“Beijo na Boca” e “Bonitinha Mas Ordinária”, ambas de Braz Chediak) ou Cassandra Rios (“Ariella”, de John Herbert).
Os anos 1980 e 90 foram de silêncio. O retorno no começo do século, no entanto, foi retumbante, com o êxito dos três filmes infanto-juvenis da série “Tainá” (2000, 2004 e 2011, respectivamente). Nem por isso deixou de lado o público mais adulto, retornando à comédia de costumes com “Qualquer Gato Vira-Lata”, 1 2 2 (2011 e 2015, respectivamente).
Num país com mórbida tendência a condenar o sucesso, Pedro Carlos Rovai, morto na última quinta feira aos 80 anos, foi um dos poucos produtores a se equilibrar por tanto tempo entre a ambição artística e o desejo dos espectadores. Um ponto fora da curva, mas a ser retido e estudado.
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