Andy Warhol emerge profético em retrospectiva em Nova York

Mostra no museu Whitney esquadrinha obra do artista que captou a ascensão do poder da imagem

Danielle Brant
Nova York

Uma busca superficial por Andy Warhol no Google Imagens devolve fotos suas usando a peruca loira com a qual ainda é identificado, além de resultados exibindo técnicas de reprodução em série de Marilyn  Monroe e da sopa enlatada Campbell’s.

O resultado da busca é de fato superficial. Warhol produziu curtas nos anos 1960 que passeavam por gêneros diferentes —em um deles, “John Washing” (1963), um homem nu lava louça em silêncio durante quatro minutos e meio.

Foi também um artista que testou o expressionismo abstrato, no extremo de pedir a pessoas que urinassem sobre um de seus trabalhos, “Oxidation Painting” (1978).

Warhol era mais que um homem com uma peruca engraçada, resume Donna De Salvo, curadora e vice-diretora para iniciativas internacionais do Museu Whitney, em Nova York.

Ela é responsável pela retrospectiva “Andy Warhol - From A to B and Back Again”, maior mostra sobre o artista em um museu americano nos últimos 30 anos. A exposição fica em cartaz até o fim de março.

De Salvo conheceu Warhol em 1986, um ano antes da morte do artista. Na época, ela era curadora na Dia Art Foundation, que tinha uma grande coleção de Warhol.

“Eu comecei a fazer exposições para a coleção e entrei em contato com o artista. Isso despertou meu interesse no trabalho dele”, conta De Salvo.

A aproximação ajudou a despir a aura em torno do americano. “Foi muito transformador conhecê-lo e conseguir trabalhar com ele.”

A exposição explora a versatilidade de Warhol em diferentes técnicas. Há pinturas, esculturas, impressões e reproduções, desenhos, vídeos, programas de televisão e exemplos do trabalho publicitário que o tornaria famoso.

Em algum sentido, diz a curadora, Warhol pode ser percebido como um visionário. “Ele tinha um desejo de registrar tudo. Fala muito com nossa cultura digital. Agora fazemos tudo com celulares”, diz. 

“Essa é a outra coisa que mostra como Warhol foi muito profético em entender a tecnologia e o que ela daria a nós, mas também esse desejo que temos, ou que pelo menos ele tinha, de documentar tudo.”

Há uma identificação com a geração jovem, que olha para o artista com as lentes da era digital. “O mundo mudou, mas, em muitas formas, Warhol intuitivamente sabia. Não acho que era uma estratégia, ele era muito afiado em entender a cultura visual e o que era possível fazer na arte.”

Os admiradores das obras mais famosas do americano também não se decepcionam. As icônicas Marilyn estão lá, assim como a Mona Lisa e as reproduções de sopas Campbell’s e garrafas de Coca-Cola.

Estão ainda retratos de outras celebridades, como Pelé, Aretha Franklin, Giorgio Armani e Truman Capote. E as pinturas de Mao Tse-tung, com cores e ênfases diferentes —em uma delas, o ditador usa blush rosa e sombra azul.

A mostra evidencia uma etapa sombria de sua obra, em que investiga o lado obscuro do sonho americano a partir de desastres e mortes. 

São fotos de tragédias, como acidentes de carro, ou agressões, como a repressão que se seguiu a uma manifestação pacífica de ativistas negros.

Ele também dedicou atenção ao acontecimento da década, o assassinato do presidente John F. Kennedy, em 1963. Um trabalho mostra a então primeira-dama, Jacqueline Kennedy, antes do homicídio, depois da confirmação da morte e ao empossar o vice, Lyndon Johnson.

A proximidade com a morte também moldou seu trabalho. Em 1968, ele foi baleado pela escritora Valerie Solanas, que achou que ele iria roubar um de seus manuscritos.

Warhol chegou a ser declarado morto e ficou dois meses no hospital. Pelo resto da vida, usou um colete cirúrgico para manter os órgãos no lugar.

“O atentado influenciou seu trabalho. Ele mudou a maneira como o escritório funcionava, colocou vidro à prova de balas, ficou com medo de andar pelas ruas”, conta De Salvo.

“Ele tinha uma preocupação com a mortalidade que se acelerou. Quando você é jovem, não se preocupa tanto. Isso se tornou mais real para ele.”

No trabalho, deixou de lado parte da produção de curtas e começou a enfocar o negócio. Muitas obras retrataram essa experiência de quase morte, como crânios e revólveres.

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