Art Basel Miami Beach perde esplendor com estafa do mercado

Mesmo calejada, mais agitada feira do mundo serve para alavancar vendas de galerias brasileiras

Silas Martí
Miami

Não foi o estouro da boiada. A maior feira de arte dos Estados Unidos parece mais calma agora que o mundo vive talvez o auge do que o mercado batizou de fadiga das feiras. Ou estafa mesmo até dos colecionadores que bancam e fazem girar o mastodôntico sistema de vendas de obras em galpões anódinos com divisórias de dry wall.

Tudo está aqui, mas do lado de fora a praia chama. E dentro as taças de champanhe bancadas por patrocinadores também parecem mais interessantes do que a arte pendurada em paredes de mentira.

Um dos maiores eventos do mercado da arte em todo o planeta, a Art Basel Miami Beach chega neste ano à 17ª edição um tanto calejada e menos esfuziante. Mas isso não impede que as galerias latino-americanas compareçam em peso e ainda tirem das vendas no balneário americano o grosso de seu sustento.

Nas primeiras horas da feira, importantes galerias brasileiras já tinham vendido boa parte de seus estandes. Um dos melhores deles, da paulistana Mendes Wood DM, que surfa na crista da onda que artistas negros experimentam no mercado, emplacou obras de Antônio Obá e Sonia Gomes, agora em cartaz no Masp, em coleções estrangeiras. Também comercializava obras de Rubem Valentim, alvo agora de uma retrospectiva no museu da avenida Paulista, e Paulo Nazareth, um dos primeiros a varrer o mundo na onda de museus e bienais em busca de redenção por um passado de negligência em relação a artistas não brancos.


Na mesma pegada afro, a galeria A Gentil Carioca vendeu trabalhos de Maxwell Alexandre e Arjan Martins, o primeiro o novo queridinho da cena global e o último um grande nome ainda subestimado pelo circuito high brow da arte contemporânea.

Outra das galerias brasileiras na feira, a Casa Triângulo trouxe pinturas de Vânia Mignone, um dos maiores destaques da atual Bienal de São Paulo, mas negociou peças de Ascânio MMM, um escultor minimalista, e Mariana Palma, pintora figurativa que beira o kitsch com estampas florais.

Num estande dedicado a um único artista, a paulistana Jaqueline Martins vendia trabalhos de Regina Vater, brasileira que viveu boa parte da vida em Nova York. Entre as peças à venda, havia trabalhos de sua fase pop, um misto de figuração surrealista com os contornos ultracoloridos de uma Wanda Pimentel ou Teresinha Soares.

Brasileiros ainda brilham em galerias estrangeiras, como a britânica Alison Jacques, que dedicou uma parede a trabalhos históricos de Lygia Clark, ainda um best-seller nacional no exterior, e vendia também trabalhos da carioca Fernanda Gomes.

Na esfera internacional, a nova-iorquina Essex Street fez uma estreia robusta na feira com grande destaque para os trabalhos de Cameron Rowland, jovem artista que discute em suas instalações a histórica tensão racial que atravessa a arte dos Estados Unidos. Ele também foi escalado para a atual Bienal de São Paulo.

Enquanto isso, os donos do mercado internacional, entre eles a americana Gagosian e a suíça Hauser & Wirth, foram mais conservadores. A primeira apostou em Richard Prince e Andy Warhol, agora alvo de uma grande retrospectiva no Whitney, em Nova York, e a segunda tinha Philip Guston, Louise Bourgeois e Larry Bell, este último um escultor minimalista da era de ouro da arte californiana com exposição em cartaz agora no Institute of Contemporary Art, em Miami.

Nesse ponto, a feira mais agitada do calendário internacional parece seguir o fluxo das tendências globais —artistas consagrados, emergentes em ascensão, investimentos seguros em tempos mais do que incertos. Mas muitos parecem mais felizes com o cenário de palmeiras balançando na brisa e praias de um azul turquesa cintilante do que com o negócio da arte.

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.