Governo tira cineastas e chama grupos estrangeiros para Conselho de Cinema

Órgão é responsável pelas políticas públicas para o setor audiovisual nacional

Guilherme Genestreti
São Paulo

​O governo diminuiu o espaço de cineastas brasileiros na nova composição do Conselho Superior do Cinema, responsável por formular políticas públicas para o setor audiovisual nacional, e aumentou a presença em seus assentos de representantes de gigantes das telecomunicações e de conglomerados internacionais, como a Netflix e os estúdios de Hollywood. 

​A nova composição foi anunciada em decreto assinado pelo presidente Michel Temer e publicado nesta segunda (3) no Diário Oficial da União, e valerá para os próximos dois anos. 

É a primeira vez que integrantes da Apaci e da Abraci, associações que reúnem realizadores do país, não têm lugar no grupo --fizeram parte até o fim deste ano. ​Único cineasta que continuou entre os membros do novo conselho, Bruno Barreto não integra essas entidades de diretores.

Em composições anteriores, Cacá Diegues e André Klotzel foram diretores que participaram das reuniões. 

Chris Evans em 'Vingadores: Era de Ultron', produção da Disney, estúdio ligado à MPA
Chris Evans em 'Vingadores: Era de Ultron', produção da Disney, estúdio ligado à MPA - Jay Maidment/Disney/Marvel via AP

O conselho é composto por nove titulares e nove suplentes. Desse total, o governo reconduziu três dos antigos titulares e designou 15 novos membros –seis titulares e nove suplentes.

Entre eles estão Paula Karol Pinha, que trabalha na área de assuntos institucionais da Netflix, e José Maurício Fittipaldi, advogado que representa a MPA (Motion Picture Association of America), que reúne os grandes estúdios hollywoodianos, incluindo Disney, Warner e Fox. Leonardo Palhares, por sua vez, já falou em nome do Google e do Facebook em reuniões do conselho.

Isso significa que esses grandes grupos estrangeiros terão mais voz e voto nas futuras discussões sobre políticas públicas para a indústria cinematográfica brasileira. Temas como a cota de tela, que prevê um número de dias em que os cinemas são obrigados a exibir produções nacionais, e a regulação do VOD (vídeo sob demanda) são alguns dos tópicos discutidos pelo Conselho Superior de Cinema.

Outros dos integrantes incluem Marcelo Bechara Hobaika, que representa a TV Globo, Hiran Silveira, que representa a TV Record, e Marcio Fraccaroli, dono da Paris Filmes, distribuidora por trás dos grandes lançamentos nacionais. Já Ricardo Difini Leite, outro dos novos membros, é um exibidor que já deu declarações públicas contra a cota de tela, atualmente em exame no STF.

Procurado, o Ministério da Cultura, responsável pelas nomeações, informa que todos os nomes foram indicados após consulta formal a 49 entidades do setor. E que há, sim, realizadores no novo conselho, caso de Bruno Barreto. 

"A MPA representa as distribuidoras norte-americanas que atuam no Brasil e, portanto, integram o setor audiovisual do país", informa, via assessoria. "A advogada Paula Pinha foi indicada pela Associação Latino-Americana de VOD, que representa empresas de VOD, não pela empresa em que trabalha."

E completa: "Todas as entidades consultadas representam segmentos direta ou indiretamente impactados pela política pública de audiovisual". 

Sobre a ausência de diretores ligados às associações tradicionais, o MinC responde que não apenas Barreto representa o segmento de realizadores como também os indicados por outras entidades como a Bravi, a Conne, a Fames, a Abragames e a Apro --nenhuma delas, entretanto, é exclusiva para diretores.

"O fato digno de nota é que pela primeira vez há, de fato, um Conselho Superior de Cinema constituído a partir de uma consulta real ao setor e que representa todos os elos das cadeias de valor do audiovisual e boa parte dos segmentos do mercado."

A nova composição do Conselho Superior de Cinema

- Hiran Silveira (titular), diretor de aquisições da TV Record
- Marcos Bitelli (suplente), advogado da TAP ( associação de programadores de TV por assinatura americanos que atuam na América Latina)

- Marcelo Hobaika Bechara (titular),  diretor executivo de relações institucionais e regulação de mídias no Grupo Globo
- Maurício Fittipaldi (suplente), advogado ligado à MPA, que reúne interesses dos estúdios americanos no Brasil

- Eduardo Levy (titular), diretor-executivo do Sindicato das Empresas de Telefonia e de Serviço Celular
- Fernando Magalhães (suplente), integrante da Associação Brasileira de TV por Assinatura

- Paula Pinha  (titular), advogada ligada à Netflix
- Leonardo Palhares (suplente), advogado, já falou em nome de de Google, Facebook e Amazon em reuniões do conselho

- Simoni Mendonça (titular), produtora ligada ao Sindicato da Indústria Audiovisual do Estado de SP
- Leonardo Edde (suplente), produtor ligado ao Sindicato Interestadual da Indústria Audiovisual

-Mauro Alves Garcia (titular), diretor de TV ligado à  Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão 
- Paulo Roberto Schmidt (suplente), produtor ligado à  Associação Brasileira da Produção de Obras Audiovisuais 

- Ricardo Difini (titular), exibidor  ligado à Federação Nacional das Empresas Exibidoras
- Sandro Manfredini (suplente), presidente da Associação Brasileira das Empresas Desenvolvedoras de Games

- Márcio Fracarolli (titular), distribuidor e dono da Paris Filmes 
- Beto Rodrigues (suplente), produtor e presidente da Fundação Cinema do Rio Grande do Sul

- Bruno Barreto (titular), cineasta
- Renato Barbieri (suplente), produtor ligado à  Conexão Audiovisual Centro-Oeste, Norte e Nordeste

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