Descrição de chapéu Moda

Grifes brasileiras de moda praia invadem Miami, e genéricos surfam na onda

Balneário americano vira epicentro do consumo desse estilo ensolarado

Fotos que ilustram a capa da Ilustrada na versão impressa de 14/12 (à esq. edição nacional e à dir. edição São Paulo) Hudson Rennan/Folhapress

Pedro Diniz
Miami e São Paulo

Peça a qualquer estrangeiro para definir o estilo brasileiro e a resposta será sempre a mesma, um misto de cor, sensualidade e roupas curtas. Quase por instinto, a moda praia virá à cabeça, mas não do jeito que os brasileiros enxergam seus panos para a areia.

Parece haver um desajuste entre a idealização do hemisfério Norte sobre o estilo dos trópicos e o que o sul quer vender como design original. E é Miami, nos Estados Unidos, novo destino de marcas nacionais que querem expandir os tentáculos para além-mar, o maior centro dessa confusão.

Enquanto etiquetas luxuosas como Água de Coco, Cia. Marítima e PatBo começam a entrar no mercado abraçadas aos shoppings do entorno da baía de Biscayne, nos últimos cinco anos a convulsiva South Beach virou endereço de lojas com o adjetivo “Brazilian style”, ou estilo brasileiro, impresso abaixo do nome principal, muitas vezes em espanhol. 

Entre ruas entupidas de turistas e lojas da rede popular Surf Style dispostas ao longo da avenida Collins, via hoteleira paralela à orla cinematográfica da Ocean Drive e transversal à consumista Lincoln Road, o Brasil é um selo de graça e visual sexy. Só que genérico.

No pequeno espaço da Blue Body Brazil, por exemplo, toda a sorte de estampas se aperta nas araras, tingindo modelos de biquínis cavados, do tipo asa delta, e um ou outro maiô igualmente colorido com a fauna e a flora brasileiras. Há pouca diversidade de modelos, mas uma vasta oferta de desenhos mirabolantes.

A vendedora explica que o dono da loja desenha e produz as peças no Brasil, mas, assim como na maioria dos pontos visitados, ninguém sabia dizer a procedência nem as características do tal estilo brasileiro.

“É o tamanho da calcinha”, arrisca Christian Farinas, dono da Agua Dulce. Aberta há três meses, a loja vende biquínis, maiôs e sungas para uma clientela louca pelas micropeças ditas brasileiras. Ditas, porque, o estilista confessa, são todas produzidas localmente com tecidos chineses. 

O tamanho P de um look “brasileiro” é pelo menos três vezes menor, embora 30% mais caro, do que os do país concorrente, a Colômbia. Assim como a Austrália, o país latino-americano passou a investir em propaganda de seu “beachwear” e já vê surgir uma marola de “Colombian style” nas artérias de consumo.

A diferença, Farinas diz, é que os colombianos são reconhecidos pela estética carnavalesca, com aplicações de brilho, canutilhos e franjas. Bem diferente do que sua vizinha, a Bikini Brasil, oferece.

Um diferencial da Bikini é trabalhar com marcas brasileiras, embora a maioria delas esteja bem longe da praia. O hit de vendas é a Sol & Energia, baseada no cerrado goiano, onde a água é escassa e um dos litorais mais próximos é o do Guarujá (SP), a 1.010 km.

O sucesso da loja, a vendedora Angelica Walker explica, são os biquínis cortininha e os fios dentais com laços. “Desde que a loja foi reformada para só vender beachwear brasileiro, há cinco anos, houve um boom de vendas. Acho que é porque Miami é festiva. Sabe, você não vai ver gente de Boston usando essa roupa”, diz.

Walker tem razão. Além da Flórida, apenas a Califórnia e o balneário dos Hamptons, em Nova York, podem ser considerados alvos para a moda brasileira fincar o guarda-sol. Contudo, a areia dessas praias, a estilista Adriana Degreas afirma, é movediça por causa da sazonalidade das vendas, sempre vinculadas ao verão.

“Ainda que o mundo esteja se apropriando do valor subjetivo do ‘beachwear’ brasileiro, os estrangeiros estão comprando a cultura do corpo, ou seja, o bumbum brasileiro, os procedimentos estéticos brasileiros, o biquíni cavado para tomar sol”, diz Degreas.

Ela, que tem duas lojas em regiões nobres, não está no miolo sulista da praia de Miami porque, ainda que o fluxo seja intenso, a região teria ficado “decadente” para a moda. 

Assim como as marcas nacionais de moda praia se posicionam hoje, a estilista é famosa pelo segmento “praia de luxo”, com visual que apela para novos cortes, curvas, customização e matéria-prima para além da lycra básica.

Concorrência mesmo o Brasil só enfrentaria com marcas australianas, apontadas por estilistas como a mais nova pedra no sapato desse ideal colorido-sexy-desnudado que os estrangeiros têm sobre nós. “Incomoda, e muito”, acrescenta Degreas.

Benny Rosset, dono do grupo que leva seu sobrenome e da estrelada etiqueta Cia. Marítima, faz coro. “O sol que bate lá, na Austrália, é o mesmo que bate aqui. Ela representa o pecado e o perigo pelos quais nossa praia é reconhecida”, diz o empresário. Assim como fez a cearense Água de Coco neste ano, a Cia. Marítima abriu duas lojas na Flórida de olho na febre “Brazilian style”.

“Há um entendimento melhor do mercado americano em encarar a moda praia não apenas como acessório, mas também como estilo de vida. Ainda são muito tradicionais, usam preto e não descombinam as peças, mas estão abertos a experimentar”, explica.

Embora Rosset acredite que os EUA estejam na crista da onda dos eventos de moda praia —o Miami Swim Week substituiu o extinto Fashion Rio como plataforma de desfiles praianos—, não vê a majestade brasileira ameaçada. “Só a gente detém a ciência da modelagem de praia, que estica de um jeito diferente e precisa de tempo para execução.”

Lenny Niemeyer, talvez a mais importante estilista de moda praia do país, e Amir Slama, fundador da Rosa Chá e pioneiro na exportação do estilo nacional quando, nos anos 2000, foi o primeiro a desfilar biquínis na semana de moda de Nova York, veem os balneários cada vez mais tropicais.

Apostando no comércio online e “sem esforço”, Slama diz ter triplicado as exportações de sua marca homônima. Japão, China, Suécia e, claro, EUA, somam 20% das vendas.

“Com a desaceleração do Brasil, olhamos mais uma vez para fora. Acho que tem dado certo, porque, mesmo com essa moda dos shorts grandes, os jovens europeus já estão aderindo à sunga, peça muito brasileira”, diz o estilista.

Niemeyer, por sua vez, acredita que o comportamento do brasileiro é o que mantém o país em alta lá fora, porque é dele “de onde a graça parte”.

“Nosso estilo vai além da areia, é a camisa, é a saia, é o short, é o biquíni. O cartão-postal é a forma como as mulheres constroem seus personagens, misturando, adaptando. Damos certo porque nossa praia não é um trabalho só de estilista, é dos brasileiros”, diz.

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.