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Netflix renova série 'Friends' em seu catálogo e reacende disputa pelo streaming

Companhias de mídia vão ter de escolher que conteúdo restringir a seus serviços sob demanda

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Anna Nicolaou
Nova York | Financial Times

No começo do mês, a Netflix deu um susto nos devotos da série "Friends". Por dois dias, pareceu que a sitcom sairia da programação do serviço de streaming em janeiro —e a perspectiva deprimiu os fãs.

Randall Stephenson, presidente-executivo da AT&T, que depois de adquirir a Time Warner agora controla os direitos da série, garantiu aos investidores no dia 4 de dezembro que a série continuaria na Netflix por mais um ano.

A Netflix vai pagar quase US$ 100 milhões (cerca de R$ 390 milhões), o equivalente a cerca de US$ 400 mil por episódio, para garantir um programa que teve seu episódio final transmitido 14 anos atrás.

É a primeira das dezenas de decisões como essa que as companhias de mídia tradicional terão de tomar nos próximos meses. AT&T e Disney gastaram mais de US$ 150 bilhões em megafusões com o objetivo de reforçar seus arsenais de conteúdo, e estão trabalhando para lançar serviços de streaming próprios no ano que vem.

A maior parte dos executivos e analistas do setor admite que os dias em que os consumidores pagavam US$ 100 ao mês por acesso a centenas de canais de TV estão chegando ao fim. A AT&T perdeu mais de 300 mil assinantes de TV paga em seu mais recente trimestre, enquanto a Comcast perdia 106 mil.

Já a Netflix está a caminho do melhor ano de sua história, e vem conquistando 80 mil novos assinantes por dia. No entanto, a Disney fatura US$ 6 bilhões ao ano nas bilheterias de cinema e ainda gera metade de sua receita operacional com canais de TV.

As empresas de mídia precisam escolher que conteúdos vão restringir a seus próprios serviços de streaming e o que manterão disponíveis para outras plataformas, onde centenas de milhões de pessoas poderão assisti-lo. Isso não só determinará o quanto valerão seus serviços de streaming como terá impacto direto sobre seu faturamento. Analistas do grupo de pesquisa MoffettNathanson preveem que os esforços de streaming da Disney reduzirão as receitas de seu estúdio de cinema e de sua divisão de redes de mídia em US$ 1,4 bilhão, pelo ano fiscal de 2020.

"Vai ser uma briga boa, por algum tempo", disse John Malone, presidente-executivo da Liberty Media, à rede de notícias CNBC, no mês passado. "A questão é determinar quanto eles estão dispostos a sofrer ao remover os direitos dos distribuidores atuais para que possam criar apetite, ou fome, por sua marca e seu conteúdo".

"Temos um desastre a caminho", disse Jonathan Taplin, produtor de cinema indicado ao Oscar e autor do livro "Move Fast and Break Things". Segundo ele, "no final do processo, só restarão três concorrentes gigantes. Não dez, e nem mesmo seis. Essa é a aposta que a Netflix está fazendo. Quando chegarem aos 200 milhões ou 250 milhões de assinantes, terão todo o poder e todo mundo terá de distribuir conteúdo por intermédio deles".

Ted Sarandos, o vice-presidente de conteúdo da Netflix, disse na semana passada que a companhia planeja encarar a competição por meio de forte investimento em programação própria. "É melhor para nós que possamos decidir nosso destino", ele disse. A Netflix tem uma grande vantagem inicial no streaming, com 140 milhões de assinantes em todo o mundo, anos de experiência, e capacidade e disposição para investir pesado em conteúdo —a empresa colocou títulos de dívida de alto rendimento no mercado para financiar seus programas originais, com a mais recente emissão, em outubro, atingindo o valor de US$ 2 bilhões.

Enquanto isso, a AT&T precisa encontrar cautelosamente um caminho entre decisões de negócios de curto prazo, tais como aceitar os US$ 100 milhões da Netflix, e o compromisso de apostar em longo prazo no seu serviço de streaming. Por meio da WarnerMedia, ela tem o maior catálogo de conteúdo de Hollywood, fruto de décadas de investimentos. Mas se entregar a distribuição desse catálogo Netflix, como ela atrairá usuários para sua plataforma?

"A questão é: você quer colher de imediato os frutos de seu negócio ou quer estar por aqui dentro de um século?", disse Brian Wieser, analista do grupo de pesquisa Pivotal Research,.

Por enquanto, a AT&T escolheu postergar essa decisão. Não decidiu se continuará licenciando "Friends" para a Netflix em 2020, quando presumivelmente vai querer lançar seu serviço de streaming, de acordo com pessoas informadas sobre a negociação.

Bob Iger, presidente-executivo da Disney, disse que o novo serviço de streaming Disney+ vai atender aos "superfãs" de produtos de imenso sucesso, como os filmes da série Star Wars e os do universo Marvel. O objetivo "não é necessariamente competir por volume, mas competir por qualidade", ele disse.

A mensagem da AT&T é semelhante. Stephenson disse que a empresa não quer se tornar "outra Netflix, em termos de ser um armazém de conteúdo", comparando a Netflix ao Walmart.

Nos próximos anos, haverá reacomodações, com a chegada de um número estonteante de serviços de streaming oferecidos por empresas que variam de Discovery a Apple. O risco é que a incursão ao streaming resulte em uma solução insatisfatória para todos. Quando conteúdo for retirado de algumas plataformas para ser colocado em outras, os consumidores ficarão confusos e as empresas de mídia terão investido bilhões para desenvolver serviços que não têm qualquer garantia de sucesso.

O que é certo é que haverá mais decisões a tomar sobre os programas vistos como mais importantes de cada acervo. Os analistas dizem que a próxima grande transação pode envolver "The Office", a série mais assistida na Netflix, de acordo com a 7Park, que rastreia audiências televisivas. A NBCUniversal, controlada pela Comcast, detém os direitos sobre "The Office", e se recusou a comentar o contrato.

"Se a Netflix se dispôs a pagar tudo isso para ficar com 'Friends' por mais um tempo, pode apostar que a corrida para manter ['The Office'] será igualmente intensa", disse Rich Greenfield, da administradora de investimentos BTIG.

Tradução de Paulo Migliacci

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