Desbravador do sertanejo, Marciano, da dupla com João Mineiro, morre aos 67 anos

Conhecido como 'O Inimitável', cantor compôs temas como 'Fio de Cabelo' e também fez dupla com Milionário

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São Paulo

Se hoje artistas como Gusttavo Lima e Marília Mendonça lotam estádios, somam bilhões de plays no YouTube e angariam fortunas em contratos, é porque pioneiros como Marciano cansaram de sujar as botas de lama em circos nos anos 1970.

O cantor sertanejo morreu nesta sexta (18), aos 67 anos, em sua casa, em São Caetano do Sul (SP), vítima de infarto.

“Não havia outros espaços; o povo ia ver trapézio, globo da morte, atirador de faca e o artista. Era um bom negócio”, diz Sérgio Reis, 78, amigo de Marciano desde aquela década.

“Artistas como eles construíram as bases do sertanejo. E a música deles se perpetuou, até hoje tocamos nos shows”, reforça Sorocaba, da dupla Fernando e Sorocaba, um dos mais relevantes compositores do sertanejo universitário.

Era um percurso de pouco glamour, ele lembra. “Não havia grandes palcos, não tinha avião pra cima e pra baixo , os carros atolavam nas estradas... Eles levavam entretenimento e alegria a locais onde não havia.”

Marciano começou a cantar com o pai. Aos 19, iniciou a parceria com João Mineiro, na qual fazia a primeira voz.

Com uma tradução romântica e urbana da música caipira que se desenvolvia no interior de São Paulo e do país desde os anos 1920, na esteira da atualização proposta por Milionário e José Rico, a dupla estreou em 1973 com o disco “Filha de Jesus”.

“Olhando para trás, eles hoje soam bregas, mas eram o que havia de mais moderno”, diz André Piunti, jornalista e especialista em sertanejo.

“Foi aquele sertanejo que assumiu o melodrama que hoje chamamos ‘sofrência’. Pode ter mudado a qualidade de gravação e a batida, mas a temática é absolutamente atual.”

Com timbre e alcance de voz marcantes, Marciano foi logo apelidado de “O Inimitável”.

Ele e João Mineiro lançaram 17 álbuns, com os quais venderam 12 milhões de cópias, no embalo de sucessos como “Ainda Ontem Chorei de Saudade”. Fizeram turnê nos Estados Unidos e chegaram a ter um programa semanal no SBT, em 1986.

Também fez sucesso como compositor —ele é um dos autores de “Fio de Cabelo”, com Darci Rossi (1947-2017), o primeiro hit do gênero a despontar nas rádios FM, em 1982, nas vozes de Chitãozinho e Xororó.

Marciano também escreveu temas como “Crises de Amor” e “Paredes Azuis”.

Em 1993, contudo, os parceiros se separaram após brigas.

“Foi justamente quando o sertanejo ia começar a estourar. Eles acabaram sendo encostados durante 20 anos”, diz Piunti.

Na sequência, Marciano saiu em carreira solo. Gravou dez álbuns e fez sucesso com músicas como “Paixão Proibida”.

Em 1998, sua canção “Miragem” foi incluída na trilha sonora da novela “Estrela de Fogo”, exibida pela Record.

E, em 2004, o cantor foi indicado ao prêmio Grammy Latino, na categoria “Melhor Disco de Música Romântica”, com o álbum ao vivo “Meu Ofício é Cantar”.

O ex-parceiro, João Mineiro, morreu em 2012, aos 74 anos.

Em 2016, Marciano se uniu a Milionário, que havia perdido a dupla José Rico em 2015.

“Nos juntamos para provar para o Brasil inteiro que nunca é tarde para começar uma nova história”, disse Marciano, à época.

Chamado de “Lendas”, o projeto dos dois virou um DVD lançado em 2016.

Nos últimos anos, Marciano passou a ser convidado por expoentes de gerações mais recentes para shows e gravações —foi assim no DVD lançado pela dupla Marcos e Belutti em 2014.

“Pelo menos ele teve a importância reconhecida enquanto vivo; isso ameniza um pouco a tristeza”, diz Piunti.

Marciano deixa a mulher, Alexandra, a filha, Marciane, e o filho, Fabiano.

Ele foi velado na sexta (18), na Câmara de São Caetano, e sepultado no Cemitério das Lágrimas, na cidade.

“É com imenso pesar que confirmamos o falecimento do cantor Marciano, o Inimitável. Nesse momento, agradecemos o carinho de todos e pedimos orações à família”, disse a família em um comunicado.

Segundo familiares, o artista não apresentava nenhum problema grave de saúde.

O cantor Fabiano Martins, filho dele, publicou nota em que lamenta a morte do pai, que só o reconheceu após um teste de DNA no "Programa do Ratinho", em 1997 —outro teste foi realizado em 2014, também em um programa televisivo.

Em 2016, Marciano processou Fabiano por danos morais após uma publicação do filho no Facebook; no processo, ele pedia indenização de R$ 20 mil.

“Todos que me conhecem sabem da péssima relação que eu tinha com meu pai, mas estou muito triste. Por mais que fôssemos afastados, era meu pai. Morre um dos maiores cantores sertanejo desse país.”

“Falar o quê nessa hora? Fico com raiva, porque os artistas não se cuidam, pensam que não vão morrer... Ele se foi muito jovem, muito moço. Deixou saudades", disse Sérgio Reis.

“Perdemos uma lenda da música sertaneja, mas, acima disso, um companheiro querido de estrada. Que Deus ampare a família, amigos e fãs”, disseram Chitãozinho e Xororó.

 
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