Filme brasileiro sobre metafísica do ânus é sagaz, diz crítica internacional

'A Rosa Azul de Novalis' é um dos títulos nacionais com mais chances de levar o prêmio dedicado a produções LGBT

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Berlim

Dispersos nas seções paralelas, longas brasileiros têm sido recebidos com algum entusiasmo no Festival de Berlim. Começou com a revista Variety, que listou as produções nacionais na programação do festival sob o título de “hot Brazilian titles” (algo como empolgantes longas brasileiros). Neste ano, o país tem 12 filmes no evento —igualando recorde de 2017.
 
A safra que desembarcou na Europa é carregada de politização e traz, entre outras questões, discussões sobre gênero e sexualidade às quais a mostra alemã é tradicionalmente afeita.

No ano passado, por exemplo, o Brasil foi vencedor nas duas principais categorias do prêmio Teddy, dedicado a produções LGBT, graças ao drama “Tinta Bruta”, de Filipe Matzembacher e Márcio Reolon, e ao documentário “Bixa Travesty”, de Claudia Priscilla e Kiko Goifman.

Cena do documentário 'A Rosa Azul de Novalis', exibido no Festival de Tiradentes
Cena do documentário 'A Rosa Azul de Novalis' - Divulgação

Um dos títulos nacionais com mais chances de levar o prêmio da atual edição é “A Rosa Azul de Novalis”, de Gustavo Vinagre e Rodrigo Carneiro. A proposta do filme é levar o ânus para o centro do debate social e político. Protagonista da obra, que fica na zona cinzenta entre ficção e documentário, Marcelo Diorio se contorce e cita referências que vão de Hilda Hilst a Franz Kafka.
 
A partir dessas reflexões e de tomadas que podem ofender olhares puritanos, os diretores tecem um manifesto em prol de certa visão progressista do mundo e avessa a conservadorismos de toda sorte —uma posição que passa por limar qualquer status depreciativo que possa ser embutido ao orifício anal, que ganha no filme status até metafísico.
 
“Escandaloso e vigoroso” foi a forma como foi descrito em resenha elogiosa publicada pela revista britânica Sight & Sound. “Tem sagacidade para fazer frente à crueza do que retrata.”
 
Já “fantasmagoricamente belo” foi a forma como crítica de outra publicação britânica, o site de cultura The Upcoming, se referiu ao documentário “Estou me Guardando para Quando o Carnaval Chegar”, de Marcelo Gomes (“Joaquim”, “Cinema, Aspirinas e Urubus”). Aqui, o diretor se debruça sobre a cidade pernambucana de Toritama, autoproclamada capital do jeans devido ao fato de produzir 20 milhões de pares de calça todo ano.
 
Enquanto expõe o cotidiano do povo da cidade atrás das barulhentas máquinas de costura, a narração do próprio diretor leva a uma divagação sobre as durezas do capitalismo. O tão aguardado Carnaval é a única época do ano em que os habitantes do local parecem ter folga.

 

“Gomes não apenas lida com as fábricas, mas mapeia os rostos humanos por trás delas e investiga seus laços familiares com a região. É uma tarefa difícil que é habilmente alcançada”, diz o texto do Upcoming.
 
A crítica ficou menos empolgada com “Querência”, do mineiro Helvécio Marins Jr, que conta a história de um caubói que vê sua vida descambar após lhe roubarem o gado.
 
“Sua leveza não resulta em superficialidade”, destacou outra resenha do Upcoming, que lhe conferiu três de cinco estrelas. “É como um passeio suave; talvez não revigorante, mas estimulante.” Já para o site The Film Stage, o filme “pode ser confuso às vezes”, como nas cenas em que o personagem principal rememora o roubo de que foi vítima.
 
“Divino Amor”, de Gabriel Mascaro, já havia estreado no Festival Sundance antes de desembarcar em Berlim. A distopia sobre um Brasil controlado por dirigentes neopentecostais foi saudada pela Variety como o ponatapé inicial do cinema nacional de protesto contra o governo de Bolsonaro. Para a revista Indie Wire, trata-se de um “comentário sociopolítico exuberante e intrincado”.
 
Engrossam o coro politizado outras duas produções brasileiras, “Chão”, de Camila Freitas, e “Espero a Tua (Re) Volta”, de Eliza Capai. A primeira, sobre a questão agrária, estreou com a presença de membros do MST no cinema. A outra, que rememora a ocupação de escolas por estudantes secundaristas, contou com a presença de alguns dos alunos retratados no filme.
 
Único título brasileiro na seção principal, “Marighella”, de Wagner Moura, foi programado para ter sua primeira exibição na próxima quinta (14). Já “Greta”, drama do cearense Armando Praça que traz Marco Nanini no papel de um enfermeiro homossexual, terá sessão na noite desta terça (12), dentro da mostra Panorama.
 
O jornalista se hospeda a convite do Festival de Berlim

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