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Wagner Schwartz marcha contra sanha moralista em performance 'A Boba'

Munido de uma réplica do quadro homônimo, o artista estabelece uma alternância entre sujeito e objeto

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A Boba

  • Quando Ter. (19), sex. (22) e sáb. (23), às 21h. Dom. (24), às 20h
  • Onde Teatro Cacilda Becker, r. Tito, 295
  • Preço R$ 40
  • Classificação Livre

Em “A Boba”, Wagner Schwartz provoca um diálogo entre diferentes linguagens. Munido de uma réplica do quadro homônimo de 1916, de Anita Malfatti, o artista estabelece uma alternância entre sujeito e objeto e opõe perene e efêmero. 

Ao passo que a tela da pintora está congelada no tempo, preservada como acervo de museu, legado da história e da cultura brasileiras, o gesto do performer e sua materialidade estão inscritos no agora. 
Característica da contemporaneidade, o conflito entre fugacidade e permanência pode parecer estéril ou inofensivo, mas produz resultados concretos sobre o real.

É capaz mesmo de detonar escândalos, como o do qual Schwartz foi vítima em 2017 —contexto incontornável para a leitura de “A Boba”. 

Naquele ano, durante a apresentação de “La Bête”, no Museu de Arte Moderna de São Paulo, uma criança tocou seu corpo nu.

Wagner Schwartz com réplica de quadro de Anita Malfatti
Wagner Schwartz com réplica de quadro de Anita Malfatti - Lenise Pinheiro/Folhapress

O registro em vídeo, que se alastrou nas redes sociais, foi o suficiente para uma acusação de pedofilia. Schwartz sofreu linchamento virtual, respondeu a inquéritos, recebeu ameaças de morte e enfrentou depressão. Seu mais recente espetáculo parece, assim, pesar o esforço artístico, o resultado obtido e a recepção do público. 

Ao deslocar a performance para a caixa preta do teatro —espaço pouco usual para essa linguagem—, Schwartz também desarticula a obra pictórica num gesto de simultânea sagração e profanação. Ora tenta sem sucesso equilibrar a tela sobre o palco, ora a empunha como arma em investida contra um inimigo invisível. 

Contudo, se a performance não é capaz de, literalmente, manter um quadro em pé, qual é o seu valor como produto final de tal esforço, parece perguntar-se o artista que, aos poucos, esgota-se diante da plateia. E, assim, o espetáculo aponta para outro debate, sobre a finalidade do fazer artístico —e, portanto, do espaço social ocupado pela arte e por seu criador.

Instrumentalizada, a criação artística está confinada a um sentido, a uma função social, sequestrada por agendas e grupos específicos. 

Logo, não é aleatória a escolha de Schwartz por um ícone do modernismo brasileiro, movimento que lutou, com armas de demolição, contra o discurso oficial e o nacionalismo monolítico, a favor de uma arte representativa de um país polifônico e heterogêneo. Tal embate está mais vivo do que nunca. 

Ao gosto modernista, o espetáculo ganha ares de paródia: às vezes, o performer parece representar um olhar de estupefação frente à arte —uma necessidade desesperada de lhe conferir sentido e função. Em outros momentos, a tela torna-se um escudo protetor do artista em marcha contra a sanha moralista. 

Sob perseguição oficial, o artista pega em armas. Busca produzir significado, embora ciente da sua precariedade. O efêmero e o agora, assim, se impõem. São capazes de transformar o legado histórico preservado em museu.

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