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Antes um novelão com sexo e horror, 'GoT' se tornou só uma narrativa convencional

O que parecia inovador agora se encaixa na boa e velha saga do herói

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O festival de sangue, sexo e horror que deixou os espectadores vidrados agora chega à sua reta final. "Game of Thrones" não foi aclamada só por suas intrigas palacianas regadas a soft porn, mas por ser em tese o auge de uma inovação narrativa das séries.

É claro, a internet, que costuma se revelar uma enorme sala de televisão, às vezes acha que o mundo foi inventado ontem. A série inspirada nos livros de George R. R. Martin sempre foi um novelão —ótimo, mas um novelão.

 

Também não é o caso de ser injusto, a série trouxe inovações sim. E não só para a forma de consumir conteúdo na TV, mas também do ponto de vista dramatúrgico e narrativo —ou pelo menos assim parecia até sua fase final.

Lá em 2011, fomos apresentados a uma saga de fantasia que parecia algo atípica. Na indústria do entretenimento, a maior parte das histórias do gênero tomam como molde algo que se convencionou chamar de jornada do herói, uma estrutura temática e narrativa que remonta aos enredos mitológicos.

"Game of Thrones" não parecia seguir essa fórmula ao pé da letra. Primeiro, não havia um herói claro à vista ou, quando alguém parecia cumprir o papel, logo morria uma morte brutal —enforcado, decapitado, atravessado por uma lança enorme em uma batalha homérica.

Dessa forma, a série parecia muito mais apoiada nos personagens e suas relações do que em uma trama mítica maior. Agora, próximo do fim, o programa se revela uma narrativa convencional. O que parecia inovador agora se encaixa na boa e velha saga do herói, que finalmente deu as caras —seu nome é Jon Snow e ele se encaixa com perfeição na fórmula.

Para começar, é o único personagem bonzinho e com ideais de nobreza —sem graça, portanto— em uma série repleta dos maiores malvadões. Nem a malandragem típica de alguns heróis Jon detém —lembremos Ulisses enganando o Ciclope na "Odisseia".

Outro elemento típico é a origem nobre perdida e reencontrada. Quando o conhecemos, Jon é o filho bastardo do chefe da Casa Stark. Na penúltima temporada, descobrimos que ele descende dos Targaryen e é o herdeiro por direito do Trono de Ferro —ou seja, o sangue de sua família não é só azul, mas mágico.

Além disso a orfandade, o exílio e o reencontro de sua verdadeira identidade são outros temas recorrentes. Até a manjada viagem ao mundo dos mortos seguida de um retorno triunfal Jon fez.

Vale lembrar que os Targaryen, que transformam dragões ferozes em cachorrinhos de madame, estão ligados ao fogo, enquanto os Stark são do gelo. A conciliação dos opostos na figura do herói marca o seu reencontro consigo mesmo a resolução do conflito que move sua jornada.

O tal do inverno de que tanto falavam finalmente chegou e é o apocalipse que, sim, traz consigo a destruição, mas também a purificação de um mundo corrompido pela maldade. O uso eficiente dessa estrutura narrativa, que faz parte da herança cultural da humanidade, ajuda a explicar o sucesso da série. Mas não se surpreenda se, ao fim de "Game of Thrones", os justos forem recompensados, os vis forem punidos e a ordem, restabelecida.

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