Quem considera as últimas campanhas presidenciais nos Estados Unidos e no Brasil agressivas não conhece a disputa que reelegeu Viktor Orbán na Hungria no ano passado.
Um outdoor da campanha dele mostrava uma multidão de refugiados e a palavra “stop” em primeiro plano. Outro retratava um dos principais candidatos da oposição, o ex-premiê Ferenc Gyurcsany, com um enorme alicate amarelo nas mãos, como se estivesse pronto para cortar a cerca erguida na fronteira que impede a entrada de imigrantes.
Os bastidores da eleição que deu o quarto mandato ao primeiro-ministro Orbán numa vitória acachapante são o tema do documentário “Hungria 2018”, exibido no festival É Tudo Verdade.
Comparado a Trump, Neatanyahu ou mesmo Bolsonaro, Orbán é um líder de relevância geopolítica menor. No firmamento da extrema direita, contudo, ele é peixe grande. Seu discurso nacionalista e xenófobo se espraia muito além das fronteiras do pequeno país europeu de 10 milhões de pessoas.
O filme mostra atos de campanha em que assessores de Orbán desfilam sua lista de fantasmas para os eleitores: imigrantes islâmicos, é claro, são a ameaça principal, mas há também entidades abstratas como a ONU e “Bruxelas” (ou seja, a União Europeia), prontas para impor os valores perigosos do globalismo.
Na Alemanha, diz um orador, não se veem mais brancos heterossexuais andando despreocupadamente nas ruas, resultado de um país que abraçou o multiculturalismo.
O bilionário húngaro George Soros, embora more nos EUA e não tenha relação com a política local, é malhado sem dó, como se sozinho fosse comprar a Hungria e transformá-la numa Disneylândia.
O próprio Orbán aparece no documentário quase que exclusivamente em outdoors, com um sorriso um tanto sinistro, com poucas exceções. Uma delas, quando entoa de maneira algo ridícula uma canção tradicional húngara.
As câmeras acompanham bem mais a campanha do opositor Gyurcsany, que deu acesso total aos produtores do filme. É um político europeu à moda antiga: moderado, afável e fumante compulsivo. A impressão que fica é de ser uma figura decente.
Sua trajetória em comícios esvaziados inspira simpatia e pena em doses iguais. Na praça de uma pequena cidade, Gyurcsany promete aos parcos eleitores uma política mais calma. Lembra a quixotesca campanha de Alckmin no ano passado. Mas lá, como cá, os eleitores estavam sem paciência para o discurso moderado.
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