A minissérie "Se Eu Fechar os Olhos Agora", de Ricardo Linhares, chega nesta segunda (15) à Globo como um caso único.
É a primeira obra feita pela TV aberta brasileira adquirida e veiculada antes pela TV paga, por meio do Now. O título estreou na plataforma de vídeo sob demanda da Net e da Claro em agosto do ano passado, por R$ 29,90.
O produto que chega oito meses depois à TV é o mesmo. Mas Linhares, autor de várias novelas e acostumado a perder a atenção do telespectador para a campainha de casa que toca bem na hora em que a mocinha pronuncia uma frase crucial na tela, sabe que a relação do espectador com a TV é diferente quando ele está pagando.
"Quando a pessoa está assistindo à série pelo Now, ela para o que está fazendo para ver, porque pagou e escolheu ver, não é no meio do jantar."
Há uma semana, a atração entrou também no menu do GloboPlay, para assinantes.
Inspirada em livro de Edney Silveste, a trama gira em torno do assassinato de Anita (Thainá Duarte), uma cobiçada jovem, e é permeado pelo racismo em sua pior fase —a da falsa cordialidade com os descendentes de escravos.
A história se desenrola em uma cidade do interior fluminense nos anos 1960, onde orbita a figura do prefeito hipócrita Adriano (Murilo Benício), casado com Isabel (Débora Falabella, sua mulher também fora da ficção).
O feminismo é um dos pontos fortes do enredo, representado pela falsa submissão de Isabel, a primeira-dama, e a emancipada Adalgisa (Mariana Ximenes), ousada para a sociedade provinciana e misógina de que faz parte. "Cresci num universo absolutamente machista. A gente não viveu essa época, mas viveu coisas que tem que suportar até hoje em termos de sociedade", diz Benício.
O prefeito é só um dos personagens que se escondem sob falsa fachada. A premissa levou o diretor Carlos Manga Jr., o Manguinha, a optar pela estética do cinema noir.
Em meio a adultos cheios de pecados, destaca-se um dupla de garotos disposta a investigar o crime —Eduardo (Xande Valois) e Paulo (João Gabriel D'Aleluia), este último se tornará Milton Gonçalves, que narra a história em flashback.
O projeto foi uma sugestão do próprio Linhares à Globo. Silvestre havia sugerido a adaptação de uma série de contos seus. Queria algo como o filme argentino "Relatos Selvagens", com três ou quatro histórias diferentes por episódio. "Eu disse a ele: isso não funciona na TV aberta. Mesmo 'Black Mirror', que é supersofisticada, é vista por um público segmentado e tem uma história por episódio."
Após declinar da primeira sugestão, propôs a adaptação de "Se eu Fechar os Olhos" com a condição de que pudesse criar em cima do original. "O livro é muito bom, mas rende um longa-metragem, não tem fôlego para uma minissérie em dez capítulos." Silvestre topou.
Adalgisa, a personagem vanguardista de Mariana Ximenes, por exemplo, é uma criação exclusiva da série. Ubiratan, o misterioso idoso vivido por Antonio Fagundes, teve sua importância muito ampliada na TV, com um enredo de busca por uma enteada que não existe no original. E Geraldo Bastos, papel de Gabriel Braga Nunes, citado muito rapidamente no livro, teve presença ampliada na série para a figura do industrial dos anos 1960 que demonstra interesse em entrar para a política.
Com Jonas Bloch e Betty Faria, o elenco traz rara participação de Renato Borghi na TV.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.