Mostra esconde obras de arte entre três prédios da Consolação

Em '3º Ato: o Verso', criações são vistas à distância, de pontos específicos

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'O Mundo entre Aspas', instalação de P. Ardid no elevador de cargo do edifício Louvre, no centro de São Paulo

'O Mundo entre Aspas', instalação de P. Ardid no elevador de cargo do edifício Louvre, no centro de São Paulo P. Ardid/Divulgação

São Paulo

Exibir, apresentar, mostrar. Os verbos associados a eventos de arte raramente fogem da ideia de colocar em evidência determinado objeto, ou conjunto de objetos —não à toa, convencionou-se usar etiquetas de identificação, para ninguém sair com dúvida de quais são, afinal, as obras de arte.

“Terceiro Ato: o Verso”, exposição no triângulo formado pelos edifícios Copan, Louvre e São Luiz Plaza, no centro paulistano, desafia essa ideia. Fruto do projeto Museu do Louvre Pau-Brazyl, que há quatro anos convida artistas a ocuparem o edifício Louvre, na avenida São Luís, na mostra despontam obras de arte visíveis apenas de pontos estratégicos, algumas inclusive somente por moradores de um ou de outro prédio.

Camufladas no ambiente urbano —como um lambe-lambe de Sandra Gamarra pregado em um poste na rua da Consolação que, ao invés de prometer a pessoa amada em três dias, afirma abrir portas, mentes e corações— ou simplesmente apresentadas sem muito contexto, como as palavras que o artista americano e precursor da arte conceitual Lawrence Weiner estampou no paredão ao lado do Bar do Copan (“prata fundida” e “aço inox gelado” são algumas delas), a proposta, explica um dos curadores, Guilherme Giufrida, é borrar as fronteiras entre museu e mundo. “São disparadores sutis, mas que instauram essa espécie de experiência mágica do espaço expositivo”, diz.

Sutil é uma boa palavra para descrever alguns dos trabalhos que compõem o “Terceiro Ato”. Uma intervenção do artista P. Ardid foi feita no elevador de carga do estacionamento do Louvre. Um dos ascensoristas, Marcos Antonio, 48, diz ter visto mais a obra do que qualquer outro visitante.

Já os poéticos letreiros eletrônicos instalados nas janelas de 11 apartamentos do prédio pelo duo Cinza, formado por João Turchi e Gustavo Colombini, só conseguem ser decifrados pelos vizinhos do Copan. A dificuldade de leitura fez com que alguns dos moradores do Louvre achassem que as frases eram pornográficas, conta o porteiro Pedro da Costa Silva, 68.

Há 20 anos trabalhando no prédio, Silva já viu outras duas intervenções do Museu do Louvre Pau-Brazyl. Criada em 2016, motivada pela abertura da filial do museu francês em Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos, a franquia imaginária tupiniquim do Louvre chamou artistas contemporâneos para uma ocupação do mezanino do edifício. A ideia era pensar a construção da identidade artística nacional a partir dos quatro blocos frontais, nomeados em honra aos cânones da história da arte Renoir, Rembrandt, Velázquez e da Vinci.

No ano seguinte, Lais Myrrha, destaque da 32ª Bienal de São Paulo, criou um trabalho em diálogo com o quinto bloco do prédio, localizado nos fundos, que homenageia o artista brasileiro Pedro Américo. Na performance e exposição “Desdito”, a artista reinterpretou a tela mais famosa do pintor, “Independência ou Morte!”, que retrata o momento do célebre grito de dom Pedro 1º às margens do Ipiranga.

Percebendo que, a cada exposição, eles avançavam sobre mais uma camada do prédio, os curadores Giufrida e Jéssica Varrichio dedicaram esta edição ao avesso do Louvre. Mais especificamente, ao terreno baldio localizado entre a rua da Consolação e as avenidas São Luís e Ipiranga, pertencente à Universidade de São Paulo (USP).

“Queríamos inverter as fachadas, e fazer ecoar as vozes escondidas no interior dos edifícios que circulam o espaço”, explica Giufrida. O cenário, formado por centenas de janelas que evocam uma versão ampliada do clássico de Hitchcock “Janela Indiscreta”, inspirou o título teatral de “Terceiro Ato”.

Descrito pelos curadores como “um palco de um teatro de arena, um coliseu, em que a arquibancada são cerca de 2.000 janelas que se entreolham diariamente”, o espaço foi assunto de negociações com a USP por um ano e meio, mas seu uso não foi autorizado para a mostra.

Os curadores decidiram, então, pedir aos 13 artistas convocados para a edição, cujos nomes incluem ainda Alessandra Domingues, Pia Eikaas e o duo Tetine, entre outros, que “assombrassem o terreno”.

Das obras exibidas, a que mais claramente faz referência ao terreno da USP é um lambe-lambe panorâmico de Laura Belém, colado no portão que protege a propriedade. Com os dizeres “Terra (à) Vista” —brincadeira com o terreno que se esconde atrás do gradeado—, ele esconde uma foto do lugar no “à”. O trabalho funciona como uma espécie de síntese deste “Terceiro Ato” do Museu Pau-Brazyl: nada, por ali, é evidente. A graça é descobrir.

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