No Rio, Los Hermanos finca pé na zona de conforto e faz show para convertidos

A setlist foi recheada com hits que emplacaram de 1999, quando estouraram com 'Anna Júlia', a 2005

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Rio de Janeiro

O Los Hermanos continua o mesmo, e se isso é bom ou ruim, fica a gosto do freguês.

A freguesia que encheu o Maracanã neste sábado (4) não deu sinais de que pediria seu dinheiro de volta. Verdade que já eram em sua maioria fãs devotados, que aproximam o hermanismo de uma religião.

E, para essa legião de convertidos, os profetas barbudos do pop nacional Marcelo Camelo, Rodrigo Amarante, Bruno Medina e Rodrigo Barba entregaram o que prometeram, e sem arriscar um dedo mindinho para fora da zona de conforto. A setlist foi recheada com vários dos hits que emplacaram de 1999, quando estouraram com "Anna Júlia", a 2005, lançamento do último de seus quatro discos, o "4", dois anos antes de cada hermano ir para seu canto.

De 2007 para cá, eles se reuniram em algumas ocasiões, e, apesar de Amarante ter dito durante a última delas, quatro anos atrás, que "o Los Hermanos nunca foi um negócio", a impressão que fica é outra.

Mais do que amigos com saudade uns dos outros, e vontade de criar algo novo com velhos parceiros, parecem sócios numa empreitada: uma banda consciente da forte marca que criaram e que ainda é plenamente capaz de render um dinheirinho.

Quando chegarem ao fim desta nova turnê nacional, em 18 de maio, com um show em São Paulo, eles terão passado por 11 cidades. E nelas deu até para monetizar com a venda de souvenires, como copos de R$ 10 (o semblante dos quatro gravado no plástico) e uma bolsa (uma "ecobag", prefere chamar a vendedora) de R$ 20.

A história pode ser cruel com artistas que num dia estão no auge, e no outro, se conseguem agendar apresentações em festas de 15 anos ou feiras temáticas Brasil afora já é muito.

Nesse ponto, os hermanos são um case de sucesso: não são exatamente assíduos na mídia, e ficaram um tempão sem lançar material novo (há uma faixa de 2019, aguenta que já falaremos dela). Ainda assim têm fôlego para lotar o Maracanã e arrebatar fãs histéricos ao sinal do primeiro acorde.

Depois deles, o pop-rock brasileiro não produziu grupo algum apto a essa façanha. Casa cheia num estádio desse tamanho, hoje, é algo reservado a outros filões, como o sertanejo de Marília Mendonça ou o funk de Anitta.

Mas a maré de trintões e quarentões no show (a geração que já gostava deles anos atrás) é uma pista para sacar que os hermanos têm um público fiel, mas não necessariamente renovado.

Uma plateia que vibrou com "Anna Júlia", que já deixou de ser tabu para a banda que por anos desdenhou do primeiro hit de sua carreira —introduzida no cancioneiro nacional com um clipe estrelado por Mariana Ximenes, até versão com o beatle George Harrison (1943-2001) ela ganhou.

Carro-chefe do disco de estreia dos Hermanos, lançado há 20 anos, a música sobre a "sempre tão linda" mocinha que esnobava o eu-lírico estourou numa época em que a MTV ainda dava as cartas no mainstream musical, o UOL (portal do Grupo Folha) tinha só três aninhos, Twitter, Facebook e YouTube sequer existiam, e a expressão "influenciadores digitais" soaria, no máximo, como um conceito futurístico tirado de um genérico de "Blade Runner".

"Anna Júlia" deu as caras, ela e mais 26 músicas, num setlist que liquidificou clássicos como "Sentimental" (aquela em que Amarante desafia se há alguém mais sentimental do que ele) e "Todo Carnaval Tem Seu Fim" (um chamado para "brincar de ser feliz") com a novata "Corre Corre".

A banda estava há 14 anos sem lançar música nova, hiato quebrado em abril, com este puro-sangue do hermanismo: letra e melodia entre a fofura melancólica e a sofrência hipster, sem a voltagem política que se sobrepôs nos anos em que Camelo, Amarante, Barba e Medina foram cada um cuidar da sua vida. Vide versos como "eu acho graça que a vida passa, e a solidão é mais".

Vibrações políticas mesmo, só no coro de "ei, Bolsonaro, vai tomar no cu!" que por vezes brotou do público. O que se via no palco estava mais para quatro homens feitos que acham graça que a vida passa, e a nostalgia é mais. 

Marcelo Camelo (esq.) e Rodrigo Amarante em show do Los Hermanos no Maracanã
Marcelo Camelo (esq.) e Rodrigo Amarante em show do Los Hermanos no Maracanã - Leo Aversa/Divulgação

SETLIST NO MARACANÃ

"A Flor"

"Além do que se Vê"

"Retrato pra Iaiá"

"O Vencedor"

"O Vento"

"Todo Carnaval Tem Seu Fim"

"Condicional"

"Corre Corre"

"Primeiro Andar"

"A Outra"

"Morena"

"Pois É"

"Sentimental"

"Samba a Dois"

"Tenha Dó"

"Quem Sabe"

"Descoberta"

"Anna Júlia"

"O Velho e o Moço"

"Paquetá"

"Do Sétimo Andar"

"Último Romance"

"Conversa de Botas Batidas"

BIS

"Deixa o Verão"

"Azedume"

"Pierrot"

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