Série revela artistas que povoaram o subterrâneo do pop nacional

'História Secreta do Pop Brasileiro' traz músicos que fizeram sucesso e sumiram do mapa

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São Paulo

A série “História Secreta do Pop Brasileiro” entrega realmente o que o título promete. Em oito episódios, o documentário criado e dirigido pelo jornalista André Barcinski revela artistas que produziram boa parte da música popular dos últimos 40 anos, sem o devido crédito.

No próximo dia 17, os três primeiros episódios, seguidos de um debate, serão exibidos no CineSesc, dentro da programação do In-Edit, festival de documentários musicais. Depois, a série terá exibição completa na programação.

“A ideia era mostrar bastidores que quase ninguém conhece”, diz o diretor. Com narração de Arrigo Barnabé, os episódios têm divisão temática.

Falam de cantores brasileiros que usavam pseudônimos para fingir que eram astros estrangeiros, de músicos que gravaram milhares de discos sem ter seus nomes creditados neles, ou de LPs de covers comuns nas décadas de 1970 e 1980, com sucessos da época regravados por músicos e cantores que imitavam os artistas originais.

 

Barcinski pensou na possibilidade de um filme ou uma série sobre esse universo subterrâneo do pop nacional quando escreveu seu livro “Pavões Misteriosos”, lançado em 2014.  Nas entrevistas com artistas de destaque no pop brasileiro entre 1973 e 1984, ele começou a escutar repetidas vezes nomes de músicos muito ativos nas gravações de grandes sucessos populares.

Foi assim que ele chegou à banda Os Carbonos, um fenômeno que mereceu um episódio da série só dedicado ao grupo. “Todo mundo dizia que os Carbonos tinham gravado as bases de suas músicas”, diz ele.

Um procedimento padrão era uma banda de estúdio gravar a parte instrumental, para que depois o cantor pusesse por cima o vocal. Em quase todos os discos, o cantor brilhava e não havia preocupação de informar quem tocava nas faixas. “Eles são a banda com mais discos vendidos no Brasil, sem dúvida.”

Os irmãos Carezzato, integrantes dos Carbonos, podem ser ouvidos em sucessos nacionais como “Fuscão Preto”, de Almir Rogério, “Feiticeira”, de Carlos Alexandre, ou “É o Amor”, de Zezé di Camargo & Luciano.

Para o jornalista, eles são operários da música, encarando o que fazem sem o menor glamour. “Era cartão de ponto mesmo, literalmente. Eles não têm a menor ideia de quantos discos gravaram. Eles falaram que no mínimo trabalhavam em um disco por dia, durante 35 anos, de segunda a sexta. Se você fizer a conta, dá algo entre 8.000 e 9.000 discos. Estamos falando de quase 100 mil músicas!”

O episódio sobre a explosão da música infantil é um bom exemplo de enormes talentos sem reconhecimento. “Todo mundo conhece o Balão Mágico, mas quem escreveu as músicas? Quem gravou? Edgard Poças escreveu as músicas do Balão, do Polegar, do Dominó. Um cara culto, que gostava de bossa nova. É o pai da cantora Céu. Escreveu ‘Superfantástico’ e o Balão explodiu no Brasil inteiro.”

O humor é farto por toda a série, que abre com “Os Clones”, episódio sobre artistas brasileiros que eram reproduções descaradas de nomes estrangeiros. O Genghis Khan, por exemplo, era cópia de um grupo alemão de mesmo nome, sucesso na época das discotecas. A entrevista com o vocalista e dançarino Jorge Danel é uma das melhores da série.

Barcinski disse ter ficado impressionado com a vida do artista, que percorreu o mundo. “Ele dançou com Marlene Dietrich, foi bailarino do Lido de Paris. Culto, fala cinco idiomas, foi amigo de Grande Otelo, e hoje só é reconhecido como o careca do Genghis Khan. Dançou de sunga abrindo show dos Menudos, se apresentou em Serra Pelada para 30 mil garimpeiros!”

Outro episódio para arrancar gargalhadas é “Os Falsos Gringos”, que explica a onda forte nos anos 1970 de brasileiros gravando como se fossem cantores americanos. Muitos depois se tornariam famosos mostrando o rosto, como Dudu França, Jessé e um iniciante Fabio Jr., que estourou nas paradas em 1973 com o single “Don’t Let Me Cry”, sob o pseudônimo Mark Davis.

Uma grande revelação para muita gente é a proliferação dos “discos fantasmas”. Eram álbuns de covers, em que cantores e músicos regravam sucessos imitando os artistas originais. Barcinski explica que gravar cover é legal. Dois álbuns que venderam muito foram “genéricos” de trilhas sonoras: do filme “Os Embalos de Sábado à Noite” e da novela “Água Viva”, da Globo.

“Se você escrever na capa ‘músicas do filme tal ou da novela tal’, não está errado. As músicas realmente estão nas trilhas”, diz Barcinski. O problema era quando os discos ocultavam a informação de que se tratava de um álbum cover. “Alguns faziam pior, colocavam fotos dos artistas originais nas capas.” 

Uma das informações mais surpreendentes é que os discos cover de “Embalos de Sábado à Noite” e “Água Viva - Internacional” são hoje muito mais valiosos para colecionadores do que os originais.

Segundo o diretor, todas as gravadoras fizeram isso, grandes ou pequenas. “A Som Livre não pode reclamar de nada. Na trilha da novela ‘Dancin’ Days’ tem um medley dos Bee Gees que é na verdade tocado pelos Carbonos e cantado pelas garotas do grupo Harmony Cats!”

Esses artistas veteranos foram levados ao estúdio por Barcinski e o diretor musical Hélio Costa Manso, e muitos números são apresentados. “Dudu França fez uma versão de arrepiar de ‘Feelings’, do Morris Albert”, diz Barcinski, citando o pseudônimo de Mauricio Alberto, outro “falso gringo”, como Costa Manso, que gravou com o nome Steve McLean.

Produzido pela gravadora Kuarup, “A História Secreta do Pop Brasileiro” terá as exibições no festival In-Edit, que começa no dia 12 em São Paulo, e deve ser exibida no canal Music Box Brasil em julho. A banda Sunday, que Helio Costa Manso criou em 1970 e ainda está em atividade, fará shows com a trilha sonora da série. No dia 21, se apresenta no Blue Note, no Conjunto Nacional, com o show “Hits Again: História Secreta do Pop Brasileiro”.

Todos os episódios

‘Os Clones’
As imitações brasileiras de Trini Lopez, Genghis Khan e Dee D. Jackson

‘Falsos Gringos’ 
Brasileiros que fingiam ser estrangeiros

‘Os Carbonos’ 
A banda que gravou dezenas de milhares de músicas

‘Discos-fantasmas’ 
A explosão dos álbuns de covers sem créditos

‘O Coral’ 
A história dos vocalistas de apoio

‘A Explosão da Música Infantil’ 
Os nomes por trás de Xuxa, Balão Mágico, Trem da Alegria

‘Os Bailes’ 
As bandas reveladas em domingueiras

‘Mister Sam’ 
O lendário produtor argentino que descobriu Gretchen, Nahim e os Black Juniors

Onde ver  

  • Seg. (17), 21h, no Cinesesc, três primeiros episódios e debate
  • Sáb. (21). na Galeria Olido - 15h (episódios 1 a 4), 17h (5 a 8) e 19h (show da banda Sunday com trilha da série)
  • Dom. (23), na Cinemateca -18h (episódios de 1 a 4) e 20h (5 a 8).

Mais informações em  http://br.in-edit.org

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