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Cinema

'Um Homem Fiel' enlaça policial, suspense e romance em conto moral

Diretor Louis Garrel, que também atua no filme, desenvolve trama francesa com suavidade e sentido de beleza

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Um Homem Fiel (L'Homme Fidèle)

  • Elenco Louis Garrel, Laetitia Casta, Lily-Rose Depp
  • Produção França, 2018
  • Direção Louis Garrel

É como se Louis Garrel, ator e diretor de “Um Homem Fiel”, quisesse demonstrar, com “Um Homem Fiel” que ainda é possível, hoje, fazer um cinema que esteja acima da divisão entre “comércio” e “arte”. Não é fácil, mas o mínimo a dizer é que consegue prender a atenção do espectador sem recorrer a baixezas, enquanto desenvolve com uma trama tipicamente francesa (ou seja, não tenta imitar o cinema americano) com suavidade e sentido da beleza.

Para tanto, seu novo filme recorre à tradição, juntando um pouco de policial, outro tanto de suspense, um quê de romance, tudo enlaçado pela ideia de conto moral.

Mas talvez fosse o caso de, para começar a conversa, perguntar por que Louis Garrel criou para si mesmo o personagem de Abel, o bom rapaz, nos dois filmes que dirigiu. Me parece que se trata menos de uma questão de desenvolvimento de um caráter do que de um hábil recurso para desenvolver sua ficção.

Em “Um Homem Fiel”, Abel é não só fiel como dócil o bastante para ser mandado de cá para lá ao longo do filme. Assim, quando, logo de cara sua companheira, Marianne (Laetitia Casta), o informa de que vai ter um filho de seu melhor amigo e pretende morar com ele, Abel desaparece de sua vida.

Quando o marido de Marianne morre, nove anos depois, e ela faz um aceno a Abel, ele volta. Quando ela sugere que Abel se afaste e comece a transar com Ève, a irmã menor do finado marido, ele vai. Essa docilidade é tremendamente funcional, pois permite que os demais personagens girem em torno dele e construam suas histórias.

Marianne, para começar, tem um quê de mistério e outro de obviedade. Ou antes, ela consegue fazer do óbvio um mistério: bem francesa, ela pode oscilar entre dois amores por anos, mas a maneira como trata o assunto, como uma evidência, é justamente o que faz seu mistério.

Depois há Joseph, o filho de Marianne. Um garoto com tino tão desenvolvido para resolver intrigas policiais como para criá-las. Graças a isso, ele é que dirá a Abel que Marianne envenenou o marido.

Verdade? Fantasia infantil? Daí sairá boa parte do suspense do filme. A Ève devemos o lado psicológico do suspense: desde adolescente é apaixonada por Abel. Um amor persiste nove anos depois! Um amor obsessivo, portanto. Capaz de abrir guerra à cunhada para obter o amor de Abel.

Abel no meio disso tudo funciona como uma ausência que permite aos demais personagens existir. Uma habilidade, sem dúvida, do belo roteiro que Jean-Claude Carrière escreveu com Garrel. Mas isso não explica tudo. Garrel não apenas deu sequência a um personagem (Abel já vem de seu primeiro filme) e nem só misturou vários gêneros no desenvolvimento de seu filme, como trouxe os melhores referenciais para si: Claude Chabrol (não por acaso autor de “A Mulher Infiel”), mestre das atmosferas, e Eric Rohmer (dos “Contos Morais”).

Sim, porque ao fim de tudo “O Homem Fiel” é um conto moral, isto é, a história de um compromisso. Louis Garrel vai fundo neste filme em que, no mais, dirige muito bem o elenco —ainda que ele próprio, em determinados momentos, soe um pouco fácil: problema muito menor num filme muito interessante. 

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