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Flip

Como eu perdi minha fobia de Flip na fila sem fim que é Paraty

Em julho, a cidade fluminense parece uma sucursal do Playcenter à beira-mar

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Paraty (RJ)

Paraty é uma festa. Mentira, Paraty em julho parece uma sucursal do Playcenter à beira-mar.  E isso é um elogio, explico o porquê.

A Flip sempre foi pra mim uma fobia. Tinha mais medo da Festa Literária Internacional de Paraty do que de tarântulas.

Imaginava que a festa fosse uma festinha de homens de meia-idade discutindo o futuro da cultura brasileira enquanto riam amarelo e balançavam as cartolas que usavam junto com um monóculo.

Aglomeração de pessoas durante a Flip 2019, em Paraty - Mathilde Missioneiro/Folhapress

A Flip da minha imaginação era um lugar para pessoas que não sentem culpa ao olhar para a pilha de Piauís que comprou nos últimos seis anos, e que só foram vítimas de uma folheada desde então. Pessoas que compram a revistona e a leem com graça e elegância, das Esquinas à Despedida, enquanto tomam latte macchiato com o mindinho afastado da xícara.

Até junho de 2019, aceitaria um convite para ir ao Rock in Rio em Jacarepaguá, sob temporal e sobre três pés de lama, mas jurava que nunca poria o pé nas ruas de pedras tortas. Mas aí veio uma proposta de trabalho durante a Flip. E boleto fala mais alto que medo.

Eu acabei de chegar, mas já reconheço meu erro. Na 12ª hora da minha primeira Flip, me sinto mais na Festa da Uva de Jundiaí do que num café vizinho à Sorbonne. E isso é maravilhoso.

Logo na manhã de quinta, a Flip me presenteia com uma cena e tanto. A fila para pegar um autógrafo da antropóloga Aparecida Vilaça, autora do comovente livro “Paletó e Eu”, é de mais de uma hora. 

Mas o silêncio reina. Até que: “Ei, para de furar fila! Olha ela tentando furar fila!”, denunciou uma aposentada, puxando uma jovem pela manga do vestido florido. A entrona foi educadamente recriminada e voltou para o fim da fila, para a satisfação do senso de justiça de todos os presentes. Nada me deixa mais em casa que um barraco. 

A Flip é uma fila. Na abertura, havia gente se enfileirando para tudo. O Banana da Terra, restaurante de globais e acompanhados das letras, só tem reserva para o domingo. A Pastelloni, casa do pastel de 30 centímetros a R$ 12, tem 40 minutos de espera.

E gente é o antídoto do elitismo. Quanto mais gente descer a Paraty no inverno, melhor. Quanto mais mesas grátis e opções baratas de transporte e hospedagem, mais forte fica a Flip. O furdunço é termômetro do sucesso, coisa de que a literatura anda precisando é disso mesmo: olhos.

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