Séries de TV jogam holofotes sobre derrotas de promotores americanos

Com casos reais, produções apresentam enxurrada de questionamentos sobre a eficiência da Justiça americana

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OLHOS QUE CONDENAM
Cena da série 'Olhos que Condenam', em exibição na Netflix - Divulgação
São Paulo

​Linda Fairstein, Dan Patterson, Marcia Clark, Freda Black e Ken Kratz. Esses são alguns nomes de promotores que, para o bem ou para o mal, ganharam projeção por causa de casos que assumiram e acabaram virando personagens de séries na TV. Estão em obras que, baseadas em fatos, jogam luz sobre conflitos éticos associados à Justiça e expõem histórias trágicas resultantes de acusações polêmicas.

Não é de hoje que casos jurídicos reais, bem como histórias de crimes conhecidos, costumam levantar a audiência dos canais. O streaming investiu num segmento ainda mais específico, com interesse particular em acusações e resultados que não convenceram muito a opinião pública. 

A promotora Linda Fairstein  acabou com uma boa dor de cabeça depois da estreia, em maio, de “Olhos que Condenam”, série de Ava DuVernay baseada na história de cinco adolescentes negros condenados injustamente por um estupro cometido no Central Park no fim dos anos 1980.

Depois da estreia da série, ela sofreu ataques nas redes sociais e perdeu cargos em instituições beneficentes. Fairstein, que também é escritora, viu a venda de seus livros despencar, até que seu editor deixou de representar a sua obra. Em “Olhos que Condenam” a promotora é interpretada por Felicity Huffman.  

A obra mostra como cinco adolescentes foram coagidos a se acusar mutuamente e depois levados a confessar um crime. A sentença deles só foi suspensa em 2002 porque um homem assumiu a autoria do estupro que os levara à prisão.

No mês passado, Fairstein escreveu um artigo para o Wall Street Journal dizendo que a série de quatro episódios continha distorções sobre o caso e a difamava. Ela conta, por exemplo, que durante o interrogatório que deu base para a acusação, os cinco jovens não deram depoimento sem a presença de seus pais nem ficaram sem comer.

Ainda sem data para chegar ao Brasil, “The Act”, que estreou nos Estados Unidos pela Hulu em março, também cria controvérsia sobre o trabalho de Dan Patterson. Ele saiu vitorioso num caso de 2015 em que uma menina, Gypsy Rose, deu orientações para seu namorado matar a mãe dela, Dee Dee Blanchard, a facadas.

Neste caso específico, causou comoção pública a informação de que Rose por anos sofreu diversos tipos de abuso nas mãos de sua mãe. 

Patterson alegou que a natureza do crime era incomum e acabou negociando com os advogados de Rose uma pena também incomum. Pela lei do estado de Missouri, onde ela morava, a menina deveria ser condenada a prisão perpétua. A garota pegou dez anos de cadeia —e dizia que se sentia mais livre na cela do que ao lado da mãe. Seu namorado pegou prisão perpétua. 

A promotora responsável pela acusação no caso de O. J. Simpson, jogador que matou sua mulher e um amigo dela, Nicole Brown Simpson e Ronald Goldman, em junho de 1994, viveu um caso de declínio profissional causado por uma absolvição. 

O crime já foi retratado em uma série americana da FX, e o tema voltou a dar base a uma nova série, “The Fix”, que estreou em junho na AXN e tem como protagonista a promotora do caso, Marcia Clark, na série chamada de Maya Travis.

Romantizada, a obra tem como mote a derrota de Travis no tribunal numa acusação contra uma celebridade. 

Clark foi severamente criticada por seu trabalho. Um dos mais emblemáticos trabalhos sobre o caso é o livro “Outrage: The Five Reasons Why O. J. Simpson Got Away with Murder”, em que outro promotor, Vincent Bugliosi, aponta várias falhas da acusação. 

Depois do resultado, Clark deu entrevistas à imprensa americana dizendo que a repercussão midiática do caso atrapalhou o seu trabalho. Ela afirmou à revista Vogue que se tornou “famosa de uma forma perturbadora”.

“The Fix”, que tem Clark no time de produtores executivos, faz uma adaptação dos fatos e opera como uma espécie de resposta às críticas que ela ouviu. O personagem que corresponde a O.J. Simpson na trama volta a cometer um crime anos depois, para enfim ser condenado à prisão. O jogador, da mesma forma, foi preso por participar de um assalto a banco em 2007.

Outra promotora que se tornou muito famosa, não só pelos casos em que trabalhou, mas por uma vida conturbada e pelo uso intenso de álcool, foi Freda Black. Ela foi peça central no documentário “Staircase”, do cineasta francês Jean-Xavier de Lestrade, que estreou há 15 anos e passou a ser exibido pela Netflix desde o fim do ano passado. 

O filme fala do julgamento de Michael Peterson, condenado por assassinar sua mulher, Kathleen. Na versão dele, ela havia caído da escada que havia na mansão deles. 

As investigações do caso concluíram que as lesões que o corpo de Kathleen apresentavam não era compatíveis com a história de que ela teria sofrido uma queda. Eram bem mais graves e tinham características de espancamento. 

O que põe o caso —e o trabalho da promotoria— em suspeição, contudo, é que as filhas do casal declararam diversas vezes que acreditavam na inocência do pai. O filme usa imagens gravadas a pedido do próprio Peterson, que tinha a intenção de usar os registros como uma arma contra
o julgamento que sofreu.

“Making a Murderer”, de 2016, também surge para pôr uma pulga atrás da orelha do espectador. O documentário revela uma série de problemas no trabalho da acusação empreendida por Ken Kratz no julgamento que condenou Steven Avery por assassinato. Pelo documentário, é difícil acreditar que houve justiça.

O filme passa um atestado de descrédito na Justiça americana. Depois de deixar a prisão, Avery se vê novamente acusado de cometer um crime que diz não ter cometido. 

Em entrevistas à imprensa americana, Kratz disse que, depois que a série foi lançada,  foi atacado nas redes e chegou a receber ameaças de morte.  

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