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Clima dos relatos breves de Silvina Ocampo é marcado pelo grotesco

Contos evocam algo que está fora de lugar, ou pelo surgimento de aspectos risíveis em situações que não sugerem tal reação

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A Fúria

  • Preço R$ 69,90 (224 págs.)
  • Autoria Silvina Ocampo. Trad. Livia Deorsola
  • Editora Companhia das Letras

Parte substancial dos contos de Silvina Ocampo se situa em ambientes fechados. É inevitável, em decorrência do fato de que “A Fúria” foi publicado há 60 anos, considerar o cerceamento social a que mulheres eram submetidas, embora nem sempre os protagonistas de Silvina sejam mulheres. Às vezes são crianças, têm sexo indefinido ou são animais.

Outra grande escritora argentina de sua geração, Norah Lange, tão menosprezada e em idêntica medida genial como Silvina, também escrevia romances que se restringiam a espaços interiores. 

De aspecto inevitavelmente sexista, a situação da casa como aprisionamento feminino está na raiz da tradição gótica, basta lembrar da Mina Murray de “Drácula” (1897), ou de suas descendentes Rosemary Woodhouse (“O Bebê de Rosemary”) e Wendy Torrance (“O Iluminado”).

No conto “As Fotografias”, a convalescente Adriana, de quem o leitor sabe só que sofreu um acidente, é submetida a uma festa caseira para ser fotografada em sessão excruciante à qual não sobrevive. Já em “A Casa de Açúcar”, Cristina, mulher tão apegada às superstições que não consegue viver, se muda para uma casa e passa a ser visitada por estranhos que a confundem com a antiga moradora, uma mulher de comportamento “reprovável” que morreu no hospício.

O clima dos relatos brevíssimos de Silvina é marcado pelo grotesco, que evoca “algo que está fora de lugar” (na definição do crítico Mark Fisher), ou pelo surgimento de aspectos risíveis em situações que não sugerem tal reação.

Em “Mimoso”, a protagonista leva seu cãozinho que morreu recentemente para ser embalsamado por um homem grosseiro, que a canta descaradamente, provocando risos desconfortáveis no leitor. Os desfechos dos relatos quase sempre terminam em morte ou assassinatos esfuziantes.

Cria do surrealismo, a ficção de Silvina tem parentesco direto com a prosa de Leonora Carrington (1917-2011), uma das duas mulheres presentes entre 43 homens na “Antologia do Humor Negro” de Breton, escritora e pintora britânica que, assim como sua congênere argentina, ousou tirar a máscara que a salvaria da hostilidade do conformismo.

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