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Artes Cênicas

'Lazarus' vale pelas canções de Bowie, nem tanto pelo enredo

Criada pelo músico pouco antes de sua morte em 2016, peça tem Jesuíta Barbosa e Bruna Guerin

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Lázarus

  • Quando Qui., sex. e sáb., às 21h; dom., às 18h
  • Onde Teatro Unimed - Al. Santos, 2.159
  • Preço R$ 120 a R$ 180
  • Classificação 16 anos

A melhor maneira de apreciar “Lazarus”, que está abrindo um novo e aconchegante teatro de 250 lugares, é se deixar levar pelas imagens e pela interpretação da música, como num show elaborado, em que cada canção é uma peça fechada em si mesma.

Duas das mais célebres canções de David Bowie, selecionadas por ele para o espetáculo, ajudam a ilustrar o conflito entre buscar uma narrativa e negá-la quase o tempo todo. O músico inglês morreu há três anos, um mês após estrear o musical com velhos sucessos e quatro inéditas.

Bruna Guerin interpreta “Life on Mars” num papel que é como uma musa ou uma alucinação do protagonista Thomas Newton —o mesmo “homem que caiu na Terra” do filme estrelado por Bowie 
em 1976, agora mais velho, solitário e bêbado.

A letra e tudo o que cerca a cena têm pouca relação com a trama, e o melhor a fazer é mergulhar na reinterpretação entrecortada da canção pop, pela voz emocionada da atriz, acompanhada tão somente por baixo acústico.

A arriscada direção musical de Maria Beraldo e Mariá Portugal, sob direção geral de Felipe Hirsch, é uma das boas coisas de “Lazarus”, que em várias passagens se propõe a ampliar exponencialmente o estranhamento de Bowie.

Outra canção, “Changes”, é mais integrada à história, facilitando a sua assimilação, aproximando o espectador, mas ao mesmo tempo mais superficial e de menor risco formal, mais pop.

É como se os autores Bowie e Enda Walsh não soubessem qual caminho escolher, entre as canções e a narrativa, e tomassem os dois, confundindo o público —que também pode escolher, vale repisar, e deveria ficar com as 18 canções, encadeadas como numa “playlist”, desistindo da história.

As letras do músico inglês nunca foram especialmente simples ou claras, mas isso jamais reduziu o seu encantamento. Visto no primeiro fim de semana da temporada, o musical não chega a tanto, causando momentos de alienação em suas mais de duas horas, talvez precisando de mais ritmo e integração.

Até os quatro ou cinco personagens centrais parecem estar em dimensões diferentes, ensimesmados, caso do Thomas entorpecido de Jesuíta Barbosa, replicando Bowie do cabelo aos gestos truncados, estes ao que parece tirados do vídeo conhecido de “Heroes” —que é projetado no final.

Já a interpretação vocal pelas atrizes é invariavelmente qualificada e envolvente, sem desperdiçar uma  só canção, o que não se pode dizer dos atores.

Também os instrumentos se mesclam ao espetáculo. Seria possível assistir a quase toda a apresentação voltado para Mariá Portugal, que toca bateria à direita da boca de cena, com concentração e arrebatamento.

Registre-se que o elenco, no dia visto, parecia estar ainda aprendendo a lidar com o piso móvel erguido pelos diretores de arte Daniela Thomas e Felipe Tassara, que toma grande parte do pequeno palco.

Com um espelho ao fundo e projetando vídeos e estrelas, é outra das coisas boas de “Lazarus”, como uma miragem da nave que Thomas Newton tanto busca, para escapar daqui.

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