Tiago Iorc rompe sumiço de quase dois anos com o lançamento de novos discos

Músico quebrou recorde no streaming após sumiço, um detox virtual, segundo os seus amigos

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São Paulo

Em algum momento do segundo semestre do ano passado, Roberto Pollo levou Tiago Iorc para um passeio pelas praias de Malibu, na Califórnia. “Foi um dia ótimo. Conversamos sobre os anseios e planos de vida de cada um”, recorda o produtor e multi-instrumentista brasileiro, que hoje comanda um estúdio em Los Angeles.

Eles se conheciam de trabalhos anteriores, mas não tinham uma relação próxima. A partir dali, se reuniram para gravar “Laços”, música tema do filme “Turma da Mônica” agora nos cinemas. O encontro deles foi o pontapé inicial do álbum “Reconstrução” e, mais tarde, de “Acústico MTV” —os mais novos trabalhos de Iorc.

A Califórnia, algumas praias brasileiras e regiões de cachoeiras foram os destinos escolhidos no passado pelo cantor brasiliense de 33 anos, depois que ele anunciou que iria se “ausentar dessa vida instagrâmica que nos consome para descobrir novos medos”.

No dia 20 de outubro, Iorc começa a primeira turnê depois do sumiço, encerrando um ciclo de quase dois anos completamente afastado da vida pública. Mesmo que não retorne às redes sociais —de onde continua longe— e siga sem dar entrevistas, o cantor será visto pelo público pelo menos durante os 14 shows que já estão agendados.

As apresentações são relacionadas ao “Acústico MTV”, a ser lançado neste mês, mas as músicas vêm de “Reconstrução”, álbum surpresa que Iorc lançou no começo de maio, quebrando o silêncio e causando alvoroço nos fãs.

No streaming, o sucesso foi imediato. Iorc se tornou o artista a ter mais músicas entre as 50 mais ouvidas do Spotify em menos tempo, emplacando 13 faixas no ranking em um dia. Também em 24 horas, os 13 clipes no YouTube alcançaram 12 milhões de acessos —hoje, o filme, que é a soma dos vídeos, já chega aos 40 milhões.

Segundo levantamento da Playax, empresa que mede audiência com base em dados, ele ganhou entre 300 mil e 400 mil novos ouvintes nas plataformas de streaming só na semana de lançamento do disco. Nas rádios, foi de um mínimo de 312 execuções diárias (a menor audiência foi de 350 mil ouvintes), em março, a um pico de mais de 1.100 (com audiência máxima de 900 mil pessoas em um dia), em maio.

Do ponto de vista comercial, o sumiço e a volta surpresa foram rentáveis. Mas, segundo Pollo, números são secundários. “Nunca foi objeto da minha vivência com o Tiago. Pode ter influenciado, mas [o sumiço] era algo de que ele precisava.”

Para o produtor, que nunca foi usuário de redes sociais, foi uma desintoxicação virtual. “Apesar da saturação a que ele estava exposto, não existia esse jogo do Instagram quando era um garoto e começou. Foi muito importante esse ‘detox’. Ele está vivendo algo que o mundo ainda vai entender.”

Na abertura do disco, “Desconstrução”, Iorc canta sobre uma mulher que “queria um pouco de atenção”, mas “encontrou a própria solidão”. Com uma levada que remete à clássica “Construção”, de Chico Buarque, a música apresenta essa fuga —concretizada na terceira faixa em “Deitada nessa Cama”, em que ele sugere o sumiço.

Além da alegoria, “Desconstrução” revela ainda uma conexão maior com a música brasileira. “Lembro de levá-lo a uma cachoeira ouvindo Cartola, comecei a botar Baden Powell”, conta Pollo.

Mesmo com o sucesso dos primeiros anos —os três discos em inglês e de sonoridade folk que ele fez entre 2008 e 2013—, Iorc considera que sua carreira nasceu para o público brasileiro em “Troco Likes”, de 2015, quando ele abraçou de vez a língua-mãe. Não é à toa que o repertório do “Acústico MTV” tem só músicas novas.

“Troco Likes” também estabeleceu Iorc como celebridade da música pop. Nesse período, ele viveu bons momentos, como “padrinho” da dupla Anavitória, e também um término bastante noticiado com a atriz Isabelle Drummond —logo depois do clipe de “Amei Te Ver”, em que Bruna Marquezine abraça Iorc de topless.

Toda a realização de “Reconstrução” girou em torno de algum tipo de afastamento. Em praias brasileiras, Iorc mandava composições a Pollo pelo WhatsApp. No período em estúdio, nos Estados Unidos, a dupla —que assina quase todos os instrumentos— pouco saía à noite. Os passeios eram sempre em praias ou cachoeiras. Até mesmo os ensaios para o “Acústico” foram numa casa em região afastada.

“O Tiago é sensorial, o negócio é entender a sensação da música. O que frustra ele é seguir um processo metódico”, conta Pollo. “Eu ia recebendo as músicas no celular e propondo roupagens de arranjos.” Além das melodias de violão e das letras otimistas pelas quais Iorc é conhecido, o novo álbum explora uma maior variedade de arranjos e tem mais momentos tristes e reflexivos.

Em março, enquanto Pollo mixava e masterizava o disco —com a ajuda do companheiro de estúdio, o experimente produtor e engenheiro de som Mario Caldato Jr.—, Iorc “fugiu” de novo, desta vez para rodar o filme.

“Ele queria fazer com quatro ou cinco pessoas no máximo”, conta Rafael Trindade, diretor de fotografia. Além dos dois, a equipe teve a atriz Michele Alves, a roteirista María Elena Morán e eventuais assistentes.

O grupo dividiu entre si as funções, da direção de arte à iluminação, passando pelo roteiro e pela operação dos equipamentos. “Passávamos cinco horas do dia produzindo e filmávamos em outras quatro”, lembra Trindade.

Gravados em 15 dias, os 13 vídeos de “Reconstrução” mostram um relacionamento que envolve um período de paixão intensa, mas desemboca em melancolia. Iorc e Alves dividem a tela em cenas quentes. No YouTube, os fãs notaram a voltagem sexual do filme.

O vídeo de “Tangerina”, que mostra os lábios de Alves com batom laranja num close despudorado, foi apelidado de “boquete poético”. “Gente do céu, ele transou muito nessa folga”, brinca um dos comentários mais curtidos.

Mas, para Trindade, “Desconstrução” é o que incorpora melhor o conceito do filme. “Traz essa personagem jovem em frente ao espelho, e a grande revelação no final de que ela também é um manequim”, diz.

Onde está Tiago Iorc? A esta altura, não sabemos. Depois do boom do lançamento de “Reconstrução”, ele voltou a sumir. Postou uma foto com as datas da turnê, mas logo depois apagou o registro.

Se a reclusão será uma constante na carreira dele a partir de agora também ainda é difícil prever. De todo jeito, seu sumiço se tornou um caso curioso da música pop brasileira em tempos de Instagram.

Ao mesmo tempo em que conseguiu tempo e espaço para preparar o seu mais ambicioso disco, Iorc transformou o hiato em audiência, usando o mistério como fetiche. Para além de suas motivações existenciais, Tiago Iorc fez do ciclo de “Reconstrução” um grande momento “oi, sumido”.

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