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Após 'Coringa', Polanski e Baumbach, Veneza esfria com filmes decepcionantes

Festival teve largada quente, mas novas obras de Atom Egoyan e Roy Andersson não empolgam

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O ator Timothée Chalamet no tapete vermelho de 'O Rei', em Veneza
O ator Timothée Chalamet no tapete vermelho de 'O Rei', em Veneza - Piroschka van de Wouw/Reuters
Veneza

Após um começo fulgurante, o Festival de Veneza inicia sua reta final em estado de dormência. Já há dias que não se vê no Lido algum filme capaz de gerar o mesmo tipo de entusiasmo que um “História de um Casamento”, do americano Noah Baumbach, “J’Accuse”, do franco-polonês Roman Polanski, ou “Coringa”, do americano Todd Phillips.

Nesta terça, a principal decepção ficou por conta do egípcio radicado no Canadá Atom Egoyan, com seu “Guest of Honour”, uma história tão complexa quanto problemática sobre uma relação entre um pai e uma filha.

David Thewlis vive um fiscal de vigilância sanitária que é o terror dos restaurantes típicos em uma cidade multicultural do Canadá. Sua filha é uma professora de música que dá aula para adolescentes. Após um incidente ocorrido em uma turnê, a moça vai parar na prisão —e não demonstra muito interesse em sair de lá. O pai tenta entender o que leva a filha a agir assim.

Talvez seja a trama mais complicada exibida em Veneza até o momento —para se ter uma ideia, o filme intercala cenas que se passam em cinco tempos diferentes.

“Gosto de tentar entender como vivemos a partir de cenas que estão faltando”, disse Egoyan, em uma conversa com a imprensa que contou com relativamente poucos jornalistas. “Na nossa vida, precisamos preencher [as partes faltantes] com a nossa imaginação.”

Em outros tempos, o diretor de fato teria sido capaz de instigar o público com um roteiro cheio de brechas. Mas os tempos de filmes como “Exótica” (1994) parecem ter ficado para trás. O exercício mental de decifração que o Egoyan de hoje propõe não gera nada além de cansaço.

Mas ao menos o filme tem David Thewlis, que seria o favorito ao prêmio de ator não fosse por Joaquin Phoenix (“Coringa”) e Adam Driver (“História de um Casamento”). Mas como estes já foram premiados anteriormente em Veneza, o britânico tem chances na briga pela Coppa Volpi masculina.

Também nesta terça, o sueco Roy Andersson apresentou “About Endlessness”, filme com que tenta repetir o feito de 2015, quando levou o Leão de Ouro pelo inventivo “Um Pombo Pousou num Galho Refletindo sobre a Existência”.

Mais uma vez, ele reúne um apanhado de situações muito distintas que, de alguma forma, falam sobre as fraquezas humanas e a busca por compreender o sentido da vida. Com a habitual estilização de cenários em cores frias e com atores semiestáticos, o filme traz esquetes de nível de humor e tragédia variáveis.

Em uma das cenas, um garçom distraído derruba vinho na mesa de um cliente —e o trecho acaba aí. Em outra, bem mais pesada, um homem amarrado a um poste por um grupo suplica para não morrer.

Em espírito, “About Endlessness” e “Pombo” são filmes muito parecidos —alguém poderia retirar cenas de um e inserir no outro, e ninguém ia notar muita diferença. Mas falta desta vez sabor de novidade e um pouco de veemência na mensagem geral.

Ainda assim, o longa garante momentos impagáveis, como a cena em que um dentista mal-humorado se irrita com um paciente medroso. Sozinha, ela já valeria a sessão.

Fora da competição, o ator Timothée Chalamet causou frisson com as adolescentes do Lido ao apresentar “O Rei”. Ele interpreta o monarca Henrique 5º, que precisa deixar a vida boêmia e assumir ainda muito jovem o trono inglês. O cineasta australiano David Michôd usa um roteiro com base em peças de Shakespeare, mas com a preocupação de manter a conexão com o grande público moderno.

Até consegue, e Chalamet reforça que é um dos grandes talentos de sua geração. Mas o filme, que muitos tinham como aposta certa na disputa pelo Leão de Ouro, não foi exibido fora de competição à toa.

Em meio à pasmaceira, um documentário brasileiro, discreto numa mostra paralela, se destacou. “Babenco: Alguém Tem que Ouvir o Coração e Dizer: Parou”, dirigido por Bárbara Paz, viúva do cineasta, mostra os últimos anos da vida do diretor de “Pixote”.

Embora fale da morte de um homem, não é uma obra fúnebre – está mais próximo de uma celebração da vida e da criação. Este, sim, é um filme que merecia mais destaque na mostra italiana.

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