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Discos revelam Taylor Swift e Lana Del Rey olhando para o umbigo

Cantoras largam os vícios do pop e se reencontram em álbuns intimistas costurados pelo mesmo produtor, Jack Antonoff

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Jack Antonoff tem muitos motivos para celebrar. O produtor é o principal nome por trás dos dois discos mais falados dos últimos dias —“Lover”, de Taylor Swift, e “Norman Fucking Rockwell!”, de Lana Del Rey.

Mesmo que nem tenham o desempenho esperado nas paradas, esses trabalhos representam um triunfo improvável no pop contemporâneo. Cada uma à sua maneira, as duas cantoras chegaram a obras sólidas abandonando a ideia de estarem na linha de frente do pop para entrar em empreitadas mais pessoais.

Taylor Swift no MTV Video Music Awards 2019 - Caitlin Ochs - 26.ago.2019

Tanto Swift quanto Del Rey lançaram há dois anos seus últimos discos antes dos álbuns de agora. No caso de Swift, seu “Reputation” parecia uma resposta a seus barracos. Em 2016, ela e Kanye West voltaram a brigar em público, sete anos depois do episódio em que o rapper invadiu o palco de uma premiação e interrompeu o discurso da cantora para defender a amiga Beyoncé.

No entanto, enquanto para Kanye e sua mulher, Kim Kardashian, a briga se resumiu a um verso —e subsequente aparição de uma “boneca” de Swift no clipe de “Famous”—, para a cantora, a briga foi muito mais.

Em “Reputation”, Swift evocou uma estética em preto e branco para se apresentar como alguém que não aceita desaforo. A principal figura do disco foi uma cobra, o emoji usado para desqualificar a cantora depois que Kardashian a desmentiu publicamente.

Swift vestiu a pele da cobra, e tentou fazer dela sua investida em direção ao hip-hop e também contra a imagem de cantora mais comportada do pop.

Para os padrões de Taylor Swift, “Reputation” teve uma recepção tímida. De certa forma, foi como se ela tivesse tentado fazer, sem sucesso, o que Ariana Grande conseguiu em “Thank U, Next”, disco debochado e festeiro que dominou o pop no primeiro semestre.

Em “ME!”, o primeiro clipe desta nova era, uma cobra se desfaz logo antes de uma profusão de cenas coloridas em que Swift ressurge —muito menos amarga. Foi o anúncio exagerado de seu retorno ao pop otimista de “Shake It Off”, que fez a cantora deixar de ser vista só como uma estrela de pop-country adolescente para ser alguém com algo a dizer.

Essa mudança aconteceu em “1989”, disco de 2014 que não só foi seu mais pessoal e aclamado, como marcou sua aproximação com Jack Antonoff.

O produtor —ex-namorado da criadora e estrela da série “Girls”, Lena Dunham—, ficou famoso à frente da extinta banda Fun, do hit “We Are Young”, de 2011, que foi um dos hinos do indie pop. Hoje, ele é o cara mais importante do pop feminino, trabalhando com gente como Lorde e St. Vincent.

Pelas cantoras, Antonoff é exaltado não como um gênio na confecção de arranjos, mas alguém capaz de deixar as artistas confortáveis e extrair delas o melhor. Tirando Swift, ele é a maior presença sentida no disco “Lover”, tanto em produção quanto em composição.

Não em vão, o disco resgata os temas pessoais de “1989”,  revelando uma Taylor Swift muito menos preocupada em se mostrar durona.

A sujeira eletrônica também dá lugar ao violão e aos sintetizadores suaves. Há não só um resgate do country, mas uma profusão de refrões leves e grudentos, além de baladas prontas para a trilha de qualquer comédia romântica —o que ela faz de melhor.

A participação do rapper Future, em “Reputation”, agora dá lugar às gigantes do country Dixie Chics e ao pop rock açucarado do Panic! At the Disco.

Uma das influências de Swift, inclusive, é Lana Del Rey. Além de compartilharem o produtor, as duas vêm se elogiando em entrevistas e não será surpresa se lançarem músicas juntas.

Mas, diferente de Swift, que se transformou ao longo dos anos, Del Rey continua a cantora triste e letárgica que despontou em 2012 com “Video Games”. Seu sucesso seguinte veio de maneira improvável, e ela se tornou uma diva pop sem soar de fato como tal.

Seu último disco, “Lust for Life”, foi uma empreitada mais ambiciosa. Del Rey reuniu um time de peso, que incluiu o renomado produtor Rick Nowels e alguns nomes do trap, como Metro Boomin. Além dos coprodutores e compositores, ela dividiu os microfones com os rappers A$AP Rocky e Playboi Carti.

Com maior habilidade do que Swift, Del Rey se aproximou das estéticas eletrônicas que estão em alta, ainda que sua presença —lírica, vocal e conceitual— seja tão única que fica difícil pensar que ela esteja deslocada ali.

Agora, em “Norman Fucking Rockwell!”, Del Rey aparece sozinha com seu piano —e Antonoff. Em entrevista ao jornal The New York Times, disse que gostava de trabalhar com o produtor porque ele trazia com agilidade soluções melódicas que a contemplavam.

Da capa ao nome do álbum —que cita o ilustrador famoso por plasmar a imagem definitiva da classe média americana no século passado—, ela vai ainda mais fundo nas referências a ícones da cultura pop. O disco lembra roqueiros, dos Beach Boys a David Bowie.

A Califórnia, paisagem constante no imaginário da cantora, retorna ainda mais forte, dando título a uma balada retrô. Se, em “Lust For Life”, Del Rey buscava a modernidade, agora, ela abraça a nostalgia e a atmosfera anos 1960 e 1970.

Ela também soa muito mais espontânea com as palavras —mesmo quando retrata a tristeza. Em “Hope Is a Dangerous Thing for a Woman like Me to Have – But I Have It”, ela se compara à escritora suicida Sylvia Plath e opõe a ideia de esperança ao sentimento de felicidade plena.

Se a influência de Jack Antonoff não é tão palpável em termos sonoros, ele tem importância central nos esforços de Swift e Del Rey. Com ele, Swift recupera e desenvolve seu pop otimista, além de flertar com o pop punk e o country. Já Del Rey aparece nos holofotes como nunca, exaltando a voz e o piano.

Depois de correr atrás da música negra —em que as inovações do pop de fato estão acontecendo—, as duas parecem à vontade ao se voltar para dentro em busca de uma estética independente. 

Ao deixar de perseguir a sonoridade mais popular entre os jovens americanos, elas —Swift aos 29 anos e Del Rey aos 34— também abrem espaço para desenvolver uma maturidade pop pouco vista entre as mais tocadas.

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