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'Hamlet' ganha tradução menos rebuscada de discípulo de Millôr

Poeta e membro da ABL, Geraldo Carneiro critica textos truncados das versões em português de Shakespeare

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Rio de Janeiro

Quando lançou a sua tradução de “Hamlet” em 1988, Millôr Fernandes escreveu no exemplar de um amigo a seguinte dedicatória: “Para Geraldo Carneiro. Cada geração tem o Millôr que merece”.

Era um estímulo para que Carneiro, 29 anos mais novo, fizesse no futuro a sua própria versão em português para a peça mais famosa de Shakespeare. O futuro chegou em 2019.

A edição em capa dura pode transmitir sisudez, mas o poeta e roteirista acredita que a principal característica de sua tradução seja a “tentativa de tornar as coisas simples”.

 

“Shakespeare é barroco às vezes e, em outras, escreve com grande simplicidade. Há tradutores que, talvez para construir uma espécie de reserva de mercado e mostrar que conhecem a sintaxe de um suposto Shakespeare, exibem um negócio truncado, esquisitíssimo”, afirma, sem citar nomes.

Mineiro que se mudou aos três anos para o Rio de Janeiro, Carneiro, 67, despontou na década de 1970 como compositor —em parceria com Egberto Gismonti, Tom Jobim e outros— e poeta ligado ao que se convencionou chamar de “poesia marginal” —termo que não lhe agrada.

Está na Academia Brasileira de Letras desde 2017, mas não reduz o comprimento do cabelo nem reveste de formalidade o que escreve.

“A geração à qual eu pertenço fez um esforço de ruptura com uma visão demasiado classicizante, asfixiante do fenômeno literário. Há gerações que fazem uma espécie de apartheid literário, querendo a literatura restrita a um grupo de iniciados.”

O convite para traduzir “Hamlet” veio do ator Bruce Gomlevsky, que pretende interpretar o atormentado príncipe da Dinamarca. Após cinco anos se desviando da missão, Carneiro realizou a empreitada neste ano, trabalhando oito horas por dia nos cinco atos da peça.

“Todas as escolhas foram em direção ao melhor entendimento”, diz ele, que, assim como está no texto original, alternou tratamentos em segunda pessoa (tu, vós) e em terceira (você, vocês). “Meu decassílabo é mais rígido do que o do Shakespeare. Mas às vezes o conceito é mais importante do que a métrica.”

O poeta só se apaixonou pela obra de Shakespeare quando tinha 29 anos e foi convidado para traduzir “A Tempestade”. Desde então, na íntegra ou em parte, já traduziu outras seis peças do dramaturgo inglês, além de 12 sonetos.

Montagem da Armazém Companhia para "Hamlet", de Shakespeare
Montagem da Armazém Companhia para 'Hamlet', de Shakespeare - Mauro Kury/Divulgação

Uma das obras é “Otelo”, da qual resultou a adaptação “Iago”, em cartaz no Sesc Copacabana, no Rio. Há alguns dias, ele tornou público que o texto que escreveu para o programa do espetáculo foi vetado por fazer analogias ao Brasil de hoje —o Sesc e os produtores não quiseram comentar.

“Nas peças de Shakespeare, inclusive ‘Hamlet’, há muita usurpação, ruptura e restauração. O Brasil, que tem sofrido várias rupturas e poucas restaurações, é muito propício para encenações de Shakespeare”, diz.

Para ele, a atemporalidade da história vem da “carpintaria teatral admirável” e da complexidade do personagem. Hamlet é um homem da Renascença que antecipa as contradições e angústias do homem moderno.

Carneiro deseja que a tradução, lançada agora por um escritório de advocacia, ganhe uma edição bilíngue.

Hamlet

  • Quando Lançamento no Rio nesta quarta (16), às 19h, na Livraria da Travessa - Leblon (av. Afrânio de Melo Franco, 290)
  • Preço R$ 49,90 (244 págs.)
  • Autoria William Shakespeare. Tradução: Geraldo Carneiro
  • Editora Maneira Advogados
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