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Cinema

Filme de mulher para mulheres, 'Adam' equilibra drama e doçura

Longa marroquino da estreante Maryam Touzani pleiteia vaga entre os indicados ao Oscar de filme internacional

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Adam

  • Quando Estreia nesta quinta (14)
  • Classificação 12 anos
  • Elenco Loubna Azabal, Nessrine Erradi, Daoua Belkhaouda
  • Produção Marrocos/França, 2019
  • Direção Maryam Touzani

Um filme de mulher sobre mulheres num país conservador como o Marrocos. "Adam", da diretora estreante e roteirista Maryam Touzani, é um retrato da busca por uma identidade feminina contemporânea na encruzilhada entre um machismo naturalizado, o chamado biológico da maternidade e o desejo de liberdade e independência da mulher.

Chamar o filme de retrato, neste caso, é mais do que uma figura de linguagem. O longa tem fotografia impressionante. As paredes puídas das casas pobres marroquinas em contraste com o colorido de roupas, panos e lenços das personagens remete à pintura barroca do holandês Vermeer e do italiano Caravaggio, em composições de luz e sombra.

O filme conta a história de Samia, uma garota do interior que, numa gravidez já muito avançada e abandonada pelo pai da criança, vaga pelas ruas de Casablanca com uma mala a tiracolo em busca de trabalho e de um lugar para dormir. 

Ela é acolhida, quase a contragosto, pela austera Abla, viúva e mãe de uma garotinha de oito anos, Warda, cujo nome foi escolhido por sua mãe em homenagem a uma adorada cantora popular marroquina que, desde a morte do marido, ela não consegue mais ouvir cantar. 

Mulher de olhar duro e semblante fechado, Abla mantém uma pequena padaria anexa a sua casa. Sua rotina monástica de dedicação ao trabalho e zelo especial pelos estudos da filha é alterada pela chegada de Samia, que bate à sua porta atrás de ajuda e cria laços imediatos com sua Warda.

O lugar de uma mulher grávida sem marido é tão vexaminoso naquela sociedade que Abla, após vencer a sua própria discriminação contra Samia, mente para vizinhos, fornecedores e clientes sobre a origem da nova moradora de sua casa: uma parente distante em temporada. 

A jovem Samia, pelo mesmo motivo, elabora um plano dolorido, ainda que racional: pretende dar o bebê para a adoção porque, segundo ela, sem um pai, ele será estigmatizado por toda a vida, condenado a uma existência menor. 

A questão é lógica. O bebê, adotado, teria uma família convencional e acesso a melhores oportunidades. Ela, ao retornar à casa dos pais, no interior, sem rastros daquela gestação indesejada, poderia recomeçar do zero, com potência total para se casar e construir a sua própria família convencional.

A realidade interna da menina-mãe-mulher se mostra mais complexa do que essa planilha. E levanta questões sobre o lugar da racionalidade diante do tal instinto materno.

Aclamado no Festival de Cannes e escolhido pelo Marrocos para pleitear uma vaga de filme internacional no Oscar, “Adam” transcorre sem sobressaltos, numa narrativa plácida e aconchegante. O envolvimento de Samia, Abla e Warda ganha contornos de cumplicidade, numa mistura envolvente de solidariedade, culinária e música —espécie de receita mágica que cativa e equilibra drama e a doçura.

Erramos: o texto foi alterado

A personagem viúva e austera se chama ​​Abla. O texto foi corrigido.

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