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Cinema

'Retablo' peca na fidelidade canina a regrinhas de roteiro

Longa foi o escolhido do Peru para concorrer a uma vaga ao Oscar

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Retablo

  • Quando Estreia nesta quinta (7)
  • Elenco Junior Béjar Roca, Amiel Cayo, Magaly Solier
  • Produção Peru/Alemanhã/Noruega, 2019
  • Direção Álvaro Delgado-Aparicio

Se não é fácil ser homossexual aqui na avenida Paulista, ou na rua Augusta. Se as pessoas são não raro atacadas, agredidas, por vezes mesmo mortas devido a suas tendências sexuais, que dirá de quem vive numa aldeola nos confins do Peru? Não se trata de uma mensagem de tolerância de “Retablo”, mas de uma constatação.

Seja qual for seus usos e costumes eróticos, o que primeiro chama a atenção neste filme de Alvaro Delgado Aparicio que chega após ganhar um Urso de Prata no Festival de Berlim do ano passado é que essa aldeia fica num lugar tremendamente bonito, beleza que o filme explora muito bem.

E esse senso estético parece se transmitir seja às pessoas do lugar, seja ao trabalho de mestre Noé, o artesão local, que aliás ensina as técnicas ao seu filho de 14 anos, Segundo.

A coisa vai andando para o perigoso terreno da lenga-lenga turístico-folclórica, quando Noé e Segundo tomam uma carona e, por uma cortina aberta na caminhonete, Segundo vê o pai em um ato sexual com o motorista.

Coisa muito discreta, que depõe a favor do filme e engendra um compreensível trauma no filho, que a partir de então recusa-se a estar perto do pai, a comer etc.

Qual o problema? É que isso acontece exatamente aos 30 minutos de projeção, como que para coroar o syefieldianismo (de Syd Field, autor de manuais sobre como escrever roteiros) que anima boa parte dos roteiristas mundiais. Eles desenvolveram o hábito de dividir o filme em atos, sendo que cada um dos atos deve ser coroado por um “ponto de virada”.

O primeiro “ponto de virada” é esse. Chocado, o menino descobre a bissexualidade do pai, mas a mantém em segredo.

É claro, essa surpresa poderia ter acontecido 15 minutos antes, poderia ensejar outros episódios, talvez mais interessantes. Mas a fidelidade canina ao cânone sdyfieldista se impõe, de maneira que teremos esperar o minuto 60 (pouco mais ou pouco menos) pelo fim do segundo ato, que leva ao desfecho do filme.

É nesse momento que a bissexualidade de Noé torna-se pública e podemos então caminhar para o ato final, onde desembocam as questões colocadas antes: o que de será do casamento de Noé, de sua relação com o filho, da relação dos familiares com ele e com os aldeões etc.

Em um filme com virtudes, entre elas a de representar a sexualidade de maneira discreta, sem atos escandalosos, a questão central se coloca de maneira pertinente. A questão formal, do roteiro, que aceita tolas regras de desenvolvimento dramático e produzem um final um tanto mecânico para o trabalho, em tantos aspectos convincente, do diretor estreante.

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