Rock soa cansado e o melhor do gênero está no underground, diz Lee Ranaldo

Ex-guitarrista do Sonic Youth, que toca em São Paulo, fala sobre novo disco e trilha de filme brasileiro que ele produziu

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São Paulo

Lee Ranaldo está tão familiarizado com o Brasil que perdeu a conta de quantas vezes veio ao país nos últimos anos. “Fiz amigos por aqui e amo demais esse lugar”, diz.

Um desses amigos é Gustavo Galvão, cineasta que conheceu o ex-guitarrista do Sonic Youth de maneira inusitada. A atriz brasiliense Ayla Gresta estava em um show de Ranaldo e mandou uma mensagem ao diretor. “Chama  ele para ser o nosso produtor”, brincou Galvão, em reposta.

Para a surpresa de todos, Ranaldo aceitou o convite para produzir a banda —e a trilha original— do filme “Ainda Temos a Imensidão da Noite”, que chega aos cinemas brasileiros no próximo dia 5.

O longa, dirigido por Galvão, acompanha uma banda punk, psicodélica e experimental de Brasília, da qual Gresta, a protagonista, interpreta a trompetista. Ranaldo trabalhou na confecção e na gravação das faixas originais.

“Gosto do enredo porque, de maneiras sutis, ele está falando de política e de poder no mundo contemporâneo”, diz o guitarrista. “Me interessei pelas músicas e queria voltar ao Brasil.”

Ranaldo também se apaixonou pela arquitetura de Brasília. A cidade, diz Galvão, é elemento crucial no filme, que ainda traz cenas em Berlim.

“Precisava de um espelho, e essas cidades têm muitas semelhanças”, diz o diretor. “Berlim foi reconstruída do zero nos anos 1950 e 1960, ao mesmo tempo em que Brasília surgiu. Os dois projetos foram baseados no modernismo.”

Galvão também vê as duas capitais “machucadas pela história”. No caso dos alemães, pela guerra. No caso do Brasil, pelo golpe militar poucos anos depois da construção de Brasília.

“Essas cidades ganharam personalidade quando a cultura jovem se manifestou, nos anos 1980”, diz.

A cena roqueira, que marcou Brasília naquela década, aparece decadente, como uma sombra, em “Ainda Temos a Imensidão da Noite”. Trinta anos depois, o gênero perdeu espaço nas rádios e na preferência dos jovens, no Brasil e no mundo.

Na visão de Ranaldo, conhecido pelo estilo “faça você mesmo” do punk, o rock está mais interessante longe dos holofotes da música de massa. “A maioria do rock mainstream soa cansado, velho e nostálgico. O que há de interessante está no underground”, diz.

O rock hoje é uma forma de arte velha. As pessoas estão trabalhando com batidas eletrônicas e computadores. O R&B e o hip-hop estão substituindo em popularidade. Mas, enfim, quando o Sonic Youth foi à Europa nos anos 1980, as pessoas já diziam que guitarras eram ultrapassadas.”

Ranaldo também está preparando um novo disco solo, “Names of North End Women”, previsto para fevereiro. Assinado por ele em parceria com o produtor Raül Refree, o álbum dá sequências à estética de “Electric Trim”, de 2017.

“Tem mais elementos eletrônicos, e também violões e percussão”, adianta. “É uma continuação, mas é muito mais experimental do que o último disco.”

É possível que Ranaldo mostre alguma das músicas novas no show que ele faz em São Paulo, no domingo (24), no festival TrêsPraUm, que acontece neste fim de semana na Associação Cultural Cecília.

O guitarrista também deve tocar alguma música de sua ex-banda, cujos antigos parceiros, ele diz, continuam se dando bem, apesar de não terem planos coletivos.

“Ouvi o disco da Kim Gordon e amei”, diz, sobre o elogiado “No Home Record”, que a ex-baixista do Sonic Youth lançou neste ano. “Estamos explorando áreas parecidas —mais produção musical do que uma banda tocando junta.”

Outro amigo antigo dele, o cantor Daniel Johnston, morreu neste ano. Herói da música lo-fi, ele sofria de esquizofrenia e transtorno bipolar.

“Fomos próximos no começo dele”, diz. “Tenho memórias boas e complicadas. Houve episódios em que tivemos que ajudá-lo, porque estava muito doente. Era um cara inocente com um grande dom. Deu uma boa contribuição.”

Ainda Temos a Imensidão da Noite

  • Quando Estreia quinta (5)
  • Onde Brasil, 2019
  • Classificação 16 anos
  • Elenco Ayla Gresta, Gustavo Halfeld, Steven Lange, Clemente Nascimento.
  • Direção Gustavo Galvão

8º Festival TrêsPraUm

  • Quando Sáb. (23) e dom. (24), das 16h à 0h
  • Onde Associação Cultural Cecília, r. Vitorino Carmilo, 449
  • Preço R$ 50 a R$ 70
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