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Thriller político mostra luta silenciosa para expor programa de tortura da CIA

Adam Driver é burocrata obstinado no longa, que teve dificuldades para ser financiado em Hollywood de super-heróis

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São Paulo

Parceiro frequente do diretor Steven Soderbergh, o roteirista Scott Z. Burns teve que correr para filmar "O Relatório", que agora chega aos cinemas.

O thriller, sobre os esforços de um assessor parlamentar (Adam Driver) para denunciar um programa de tortura implementado pela CIA, a Agência Central de Inteligência, durante a Guerra do Iraque, teve seu orçamento inicial reduzido em US$ 10 milhões (R$ 40 milhões), e foi rodado em apenas 26 dias, contra os 50 originalmente previstos, segundo a publicação Vanity Fair.

A razão para tanta pressa, diz Burns, é a mesma que vem suscitando críticas de pesos-pesados como Martin Scorsese, Francis Ford Coppola, e até mesmo o brasileiro Fernando Meirelles, diretor de "Cidade de Deus". Hollywood não quer investir em histórias que não sejam de super-heróis.

"Vivemos numa época em que as pessoas decidiram que filmes deveriam ter muitas coisas explodindo", afirma Burns, que assinou os roteiros de "O Ultimato Bourne" e "O Desinformante!", entre outros. "Mas é lamentável gastar tanto tempo com os mesmos personagens e franquias."

O cineasta acha que a situação é ainda pior para os thrillers políticos. Em tempos de polarização, ele diz que a indústria teme afastar parcelas consideráveis do público potencial ao tratar do tema. "Mas meu filme não é sobre a esquerda versus direita, e sim certo versus errado."

De fato, na trama não sobra nem para o ex-presidente, o democrata Barack Obama.

O longa alterna passado e presente ao retratar os seis anos da batalha de Daniel J. Jones para divulgar um documento em que revelava as técnicas de tortura adotadas pela agência de inteligência americana no Oriente Médio pós-11 de setembro.

Contratado por um comitê bipartidário para analisar centenas de páginas de documentos do órgão, Jones é trancado numa sala sem acesso a internet ou privado de entrevistas com profissionais que atuaram no programa --os primeiros de muitos obstáculos burocráticos impostos pela agência.

Mesmo assim, descobre detalhes pavorosos o suficiente para encher quase 7.000 páginas de um relatório preliminar, que ninguém, do diretor da CIA ao chefe de gabinete da Casa Branca, quer ver publicado.

Adam Driver em cena de "O Relatório" (2019), de Scott Z. Burns
Adam Driver em cena de "O Relatório" (2019), de Scott Z. Burns - Divulgação

Seus únicos aliados são a senadora Dianne Feinstein (Annette Bening), que preside o comitê e navega pela realpolitik com mais fluência do que o protagonista, e sua própria obstinação.

Nesse sentido, a escolha de Driver para o papel foi fundamental, afirma Burns.

O ator, que tem no breve currículo experiências com nomes como Steven Spielberg, os irmãos Coen e Spike Lee, e é cotado para o Oscar pela última parceria com Noah Baumbach, "História de um Casamento", serviu na marinha antes de migrar para o cinema.

"Ele entende como funciona uma hierarquia. E é extraordinariamente obsessivo. Ele me ligava à noite para mudar a ordem de duas palavras no texto, e chegava nas filmagens compreendendo cada uma de suas falas", conta Burns.

Driver e os outros integrantes do elenco, que inclui astros como Jon Hamm, Michael C. Hall e Matthew Rhys, conviveram com Jones em pessoa durante as filmagens. Ele também foi uma das principais fontes de Burns para a elaboração do roteiro.

O diretor afirma que o assessor é uma versão real de seus ídolos ficcionais, personagens como Erin Brockovich (de "Erin Brockovich, uma Mulher de Talento") e Frank Serpico (de "Serpico"), que lutaram contra sistemas a princípio inabaláveis. "Ele é um super-herói, mas o único poder dele é conseguir ler muito", diz Burns.

O cineasta ainda escreveu e produziu outro thriller político recente, "A Lavanderia", produção do Netflix assinada por Soderbergh e protagonizada por Meryl Streep. Também ele se inspira num caso real, o escândalo dos Panama Papers, que revelou como um escritório de advocacia panamenho ajudou clientes a lavar dinheiro, escapar de sanções e evitar impostos.

Está na hora de os americanos descobrirem essas narrativas? "Os Estados Unidos, mas o Brasil também. É preciso mais transparência e prestação de contas para com a sociedade", responde Burns.

O Relatório

  • Quando Em cartaz
  • Classificação 16 anos
  • Elenco Adam Driver, Annete Benning e John Hamm
  • Produção Estados Unidos, 2019
  • Direção Scott Z. Burns
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