Descrição de chapéu

Opressão feminina é abordada com sutileza em filme 'O Despertar das Formigas'

A metáfora dos insetos é, ainda que parcamente desenvolvida, importante para a narrativa

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O Despertar das Formigas

  • Quando Estreia nesta quinta (16)
  • Classificação 14 anos
  • Elenco Daniela Valenciano, Leynar Gomez e Isabella Moscoso
  • Produção Costa Rica/Espanha, 2019
  • Direção Antonella Sudasassi

Numa festa familiar, os homens falam de futebol e se sentam escarrapachados, enquanto as mulheres fazem café e bolo e se ocupam das crianças. 

Eis o mundo de Isabel, que se divide entre cuidar de Valery e Nicole, as duas filhas que tem com Alcides, e o trabalho de costureira. Fica claro desde cedo, em “O Despertar das Formigas”, que Isa não aceita de forma resignada os limites estreitos que se lhe impõem. 

Pequenos detalhes dão conta de mostrar as questões que ela já incorporou à sua rotina, como ter de trocar uma lâmpada de lugar para poder trabalhar à velha máquina de costura. 

Outros, porém, são mais difíceis de suportar, como os longos cabelos, sempre a cair-lhe na cara, que ela diligentemente afasta enquanto dá conta de suas lides, sob o calor úmido da Costa Rica, quase palpável para o espectador.

Antonella Sudasassi escapa com habilidade do registro discursivo, fiando-se nesses pormenores para construir o progressivo desconforto de Isa. Seria mais fácil, e é um deslize comum em primeiros longas, como este, pôr em palavras o que se quer dizer.

Contudo, como, sim, é um primeiro longa, há uma metáfora a querer passar uma mensagem que não se estabelece bem, não chega a se completar —a das formigas do título.

Enquanto os cabelos de que gosta Alcides vão se tornando cada vez mais um estorvo para Isa, as formigas surgem aqui e ali, mas parece que só ela as vê.

A presença dos insetos é, ainda que parcamente desenvolvida, importante.

É a partir do que ela acena, sem dizer totalmente, que a mudança se estabelece. 

Isa terá de se entender com seu corpo para que ele não seja colonizado pelo desejo alheio —principalmente pela ânsia de Alcides por mais um filho.

Quando se compreende que as formigas estão ali a representar a sexualidade, a metáfora parece quase tola —afinal, é um formigamento o que se sente, uma espécie de comichão, quando desperta o corpo?

Mas é um pecado menor num filme delicado, que constrói com eficácia visual a história de uma mulher erguendo-se em íntima e pequena rebelião. 

Sudasassi consegue fazer com que acompanhemos sua trama com empatia e interesse, poupando-nos de qualquer excesso grandiloquente. E, ainda assim, lembrando-nos de que, logo ali na esquina —não é preciso ir até a América Central—, há mulheres vivendo de forma quase orgânica um cotidiano em que a opressão se intrometeu em cada aspecto.

Se a diretora alcança isso sem que o espectador se sinta afrontado pelo seu desejo de compor uma tese, é porque aborda o tema com sutileza, algo cada vez mais raro. 

É um primeiro longa, de novo, e isso se nota na quase ingenuidade com que, também, enfrenta o que escolheu narrar. Mas, aqui, as boas intenções que nunca faltam às estreias se mostram promissoras.

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