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'99% Invisible' já é um clássico dentro do universo dos podcasts

A voz do apresentador é a definição do cool, tipo um afago de camurça na nuca, escandida numa cadência joão-gilbertiana

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José Orenstein

Para quem está chegando agora no universo dos podcasts, o excesso de oferta pode ser intimidante. Em 2020, estima-se que existam 700 mil programas ativos —que respondem por 29 milhões de episódios. Por onde começar?

Como na literatura ou no cinema, não costuma ser um erro começar pelos clássicos. E uma antologia universal dos podcasts não poderia ser feita sem “99% Invisible”. 

Primeiro por causa da voz (em inglês). Felizmente a era do podcast democratizou isso. Não precisa ter vozeirão de barítono ou de locutor de rádio para criar um programa —sotaques, cacoetes, língua presa, tudo isso pode estar presente. O que interessa é o papo sussurrado dentro da sua cabeça através dos fones de ouvido ser fluido, autêntico, aprazível.

Pois a voz de Roman Mars, apresentador do “99% Invisible”, é a definição do cool, tipo um afago de camurça na nuca, escandida numa cadência joão-gilbertiana, só que em registro grave. Mas você não deve ouvir o podcast só pela voz do cara, embora ele certamente agrade o pessoal do ASMR, que busca o relaxamento pelo som. São as histórias que valem a pena.

Podcast '99% Invisible'
Podcast '99% Invisible' - Divulgação

A rigor, “99% Invisible” é um podcast de design e arquitetura criado em 2010. É atualizado semanalmente, com episódios que costumam durar entre 30 minutos e uma hora. Na prática, é um mergulho nos porquês e nos processos que estão por trás da construção e funcionamento de cidades, espaços e objetos cotidianos. 

O repertório é vasto. Tem o caso de um shopping secretamente ocupado por artistas, num episódio que reconta a história por trás desses onipresentes centros de consumo. Tem o episódio sobre as prosaicas e essenciais rampas de acesso que cortam o meio-fio para ligar asfalto e calçada.

Tem também a história de Usonia, utopia urbanística que o arquiteto Frank Lloyd Wright chegou a colocar em prática. E ainda uma deliciosa visita guiada pelos corredores serpenteados do Guggenheim, museu que Wright projetou em Nova York.

Claro, é um podcast feito no privilegiado e afluente microcosmo californiano de São Francisco, na bela Oakland, no qual predomina uma temática americana, além de um certo olhar às vezes deslumbrado para as coisas. 

Mas há ótimos episódios que vão além das fronteiras dos Estados Unidos, como o que conta o caso de Fordlândia, na Amazônia, ou o que narra a aventura do artista Isamu Noguchi na criação de playgrounds públicos.

É raro, mas alguns dos episódios acabam entregando menos do que prometem. Um recente sobre a importância da sombra nas cidades, a partir do caso de Los Angeles, está abaixo da média.

Sobre as obras clássicas, Italo Calvino disse certa vez que eles nunca terminam aquilo que tinham para dizer —ou seja, podem e devem ser revisitados. A cada vez, revelam novos sentidos. Os quase 400 episódios de “99% Invisible” estão aí ao alcance dos ouvidos para provar.

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