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Artes Cênicas

Antonio Pitanga comove em peça 'Embarque Imediato', governada pela palavra

Dois personagens estão presos naquela sala de aeroporto e só lhes resta falar um com o outro

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Embarque Imediato

  • Quando Qui., sex. e sáb., às 21h. Dom., às 18h. Até 8/3
  • Onde Sesc Consolação, r. Dr. Vila Nova, 245, São Paulo
  • Preço R$ 12 a R$ 40

Antonio Pitanga é um ator excepcional, não apenas pelo modo como injetou vitalidade nas personagens que viveu, mas também por carregar consigo uma história de luta por uma angulação negra no teatro e, sobretudo, no cinema brasileiro.

Em “Embarque Imediato”, ele interpreta um velho africano numa sala de retenção alfandegária de um aeroporto internacional. A larga sabedoria milenar do personagem ecoa na grandeza histórica do ator octogenário.

Antonio Pitanga contracena com seu filho, Rocco Pitanga, que interpreta um petulante acadêmico, estudioso de Bertolt Brecht, em viagem para um congresso na Alemanha. Ele se encontra retido na mesma sala após perder passaporte e identidade.

A peça assinala o contraste entre o velho africano e o jovem cosmopolita. Um abismo enorme os afasta: as roupas, os movimentos, a visão de mundo, a forma como cada um lida com o tempo.

Em paralelo, o texto assinala a proximidade que há entre eles. O jovem acadêmico vai colocando em crise suas certezas e vive uma espécie de processo de aprendizagem ao longo da peça. Como se fosse encontrando, no velho, fragmentos de sua identidade e uma imagem perdida de si —algo que ganha dimensão comovente pelo fato de serem pai e filho contracenando.

Mas essa dialética entre distância e aproximação é sempre anunciada textualmente. “Embarque Imediato” é um espetáculo governado pela palavra.

Segundo o dramaturgo Aldri Anunciação, trata-se de uma “peça-debate”. Mas o conceito soa como um subterfúgio para justificar fragilidades da obra, como a desatenção para a objetividade da cena ou a dificuldade do discurso em se reverter em vida teatral.

O texto de Anunciação apresenta uma estrutura que vem se tornando bastante comum na dramaturgia mais atual no Brasil: situações de confinamento que paralisam o tempo “lá fora” e abrem espaço para longos exercícios retóricos.

Em “Embarque Imediato”, os dois personagens estão presos naquela sala de aeroporto e só lhes resta falar um com o outro. Com o tempo, a situação deixa de importar e os diálogos vão se transformando em dilatados monólogos. O resultado é um tipo de atrofiamento da realidade teatral do espetáculo.

A encenação de Márcio Meirelles, por exemplo, fica à reboque da literatura, parece estar sempre em função da enunciação textual. Cenografia, movimentos de luz e projeções aparecem como um aparato coadjuvante, fugazes ilustrações do que está sendo dito.

Sem lastro, a força do argumento concreto vira abstração, falatório, repetição, déjà vu. É algo a que nem o magnetismo de um ator visceral como Antonio Pitanga consegue resistir.

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