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Com 'Parasita', Hollywood reconhece que inovação no cinema vem do oriente

Novidade veio num ano em que indicados estiveram muito acima da média habitual

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A surpresa não foi pequena, embora tenha sido praticamente a única da noite.

“Parasita” conseguiu, para resumir, o que nem Itália, nem Japão, em seus melhores dias, conseguiram: ser o centro de uma cerimônia destinada, até aqui, a celebrar Hollywood, seu estilo de filmes, sua força mercadológica. Com “Parasita”, o Oscar reconhece que o eixo principal da inovação cinematográfica vem, e há décadas, da Ásia.

Ao tratar de conflitos do desenvolvimento atrasado e veloz da Coreia do Sul, Bong acertou na mosca: falou ao mundo inteiro dos desequilíbrios demenciais do capitalismo contemporâneo.

Mas convém não esquecer, neste momento, sobretudo, a grande enchente que assola Seul e alaga a casa da família pobre: é também dos desequilíbrios climáticos brutais contemporâneos que “Parasita” trata.

Toda essa novidade veio num ano em que os indicados estiveram muito acima da média habitual. Pelo menos “O Irlandês”, “Coringa”, “História de um Casamento” e “Era Uma Vez em... Hollywood” destacaram-se recentemente, para não falar da proeza, mais técnica do que outra coisa, de “1917”.

Seja como for, era tido como favorito por muitos desde que levou, também surpreendentemente, o Globo de Ouro.

As frases da noite, no entanto, não foram para Bong nem para nenhum outro premiado.

Estavam no diálogo de abertura entre Steve Martin e Chris Rock. Martin começa dizendo que o Oscar mudou muito em 92 anos. Rock rebate: “Sim, no primeiro não havia nenhum negro indicado. Neste ano há um.”

Pouco depois, Rock aponta para Mahershala Ali na plateia e lembra que ele já ganhou dois Oscars: “Sabe o que significam os prêmios quando ele é parado pela polícia? Nada.”

A plateia ri, mas o mal-estar americano (e não só) já está no ar: o racismo é central demais para não ser lembrado. Aliás, se existe um filme esquecido neste Oscar é “Nós”, o magnífico terror de Jordan Peele, não por acaso um cineasta negro.

Se absurdos acontecem todo ano no Oscar, desta vez “Ford vs. Ferrari” concorrer a melhor filme supera todas as demais.

Ele ter ficado com melhor montagem apenas confirma a superstição de que filme bem montado é filme com muitos cortes rápidos.

É difícil incluir na categoria dos absurdos o fato de “O Irlandês” não ter levado nada, nem mesmo a estatueta de melhor montagem para Thelma Schoonmaker.

Talvez isso se deva à língua comprida de Martin Scorsese, que foi dizer que filme de super-herói não é cinema. Pode não ser, mas é o que hoje sustenta a indústria. Portanto, imperdoável.

Entre as atrizes, Renée Zellweger levou o maior prêmio fazendo bem a Judy Garland de “Judy”. Já Laura Dern ficou com o prêmio de melhor coadjuvante por “História de um Casamento”, onde faz uma detestável advogada. E ser detestável era o objetivo do papel. Mas poderia ter lembrado, nos agradecimentos, David Lynch, que lhe deu tantos papéis, inclusive no último “Twin Peaks”.

Entre os atores, seria um escândalo se Joaquin Phoenix não tivesse ganho. Faz tempo que ele é um dos melhores atores americanos, mas em “Coringa” se superou (até no quesito sacrifício físico, que tanto entusiasma a premiação).

Brad Pitt ganhou como melhor coadjuvante. Poderia ter sido qualquer outro. Ganhou o mais simpático, vamos dizer assim, e ninguém dirá que houve injustiça na escolha.

As mulheres se queixaram da ausência de Greta Gerwig por “Adoráveis Mulheres”. Mas desta vez não dava mesmo pé. O estranho é “Adoráveis Mulheres” ter entrado na lista.

Elas dominaram, em troca, em melhor documentário, onde o Brasil inclusive estava representado por “Democracia em Vertigem”. Saímos de mãos abanando outra vez. Resta o consolo de o destaque dado ao filme servir para mostrar ao mundo o funcionamento capenga da nossa democracia.

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