Descrição de chapéu The New York Times

Descobri pela internet que meu ex está namorando a Lady Gaga

Pode rir se quiser, todo mundo riu; mas é verdade

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Lindsay Crouse
The New York Times

Eu estava comendo uvas da bodega sentada à minha mesa, certa manhã recente de segunda-feira, me preparando para encarar a caixa de entrada, quando meu celular começou a apitar.

“Cheque o Facebook”.

“Cheque o Twitter”.

“Você está bem?”

Era uma emergência. Meu ex-namorado, descobri, tinha uma nova namorada.

Lady Gaga.

Pode rir, se quiser. Todo mundo que conheço riu.

Mas é verdade. Enquanto eu assistia ao Super Bowl na TV em Nova York, os dois estavam abraçados no camarote dela no Hard Rock Stadium, em Miami. Os paparazzi registraram quando ele saiu de lá em companhia de Lady Gaga –ela estava usando cabelos cor de rosa e paetês no contorno dos olhos.

A coluna de fofocas do The New York Post publicou um estudo em profundidade sobre o novo “homem misterioso” de Lady Gaga. O site Refinery29 anunciou que ela estava usando “o acessório mais quente da moda em 2020: um namorado normal”.

A história foi publicada pelo Daily Mail, Business Insider e People, onde minha mãe leu sobre o casal depois de pegar uma cópia da revista na biblioteca local.

Namorei esse homem misterioso e completamente normal por sete anos. Nosso relacionamento durou por toda a faculdade e mais alguns anos, depois. Uma canção popular da época falava em uma pessoa “apaixonada em um romance ruim”.

Como você pode adivinhar pelo fato de que jamais ouviu falar de mim, não sou famosa.

Assim, de repente eu pareço estar aderindo involuntariamente ao culto a celebridades (sim, sei que existem outros termos para isso). Mas não há muita maneira de evitar.

As redes sociais estão tão incorporadas à cultura, em 2020, que deixaram de ser um suplemento ou mesmo um vício. São apenas uma extensão acelerada da maneira pela qual os seres humanos sempre se comportaram. Vivemos em uma cultura de atualização constante. E se você gostaria de cancelar sua assinatura, bem, isso não é possível.

Não sigo o meu ex nas redes sociais. Éramos “amigos” no Facebook e mais tarde, estávamos em um “relacionamento”. Depois que terminamos, percebi que eu estava “bloqueada” de seu perfil. E fomos adiante. Não faço buscas sobre ele no Google há muito tempo (juro). Mas este mês fui exposta a tudo que se sabe sobre seu novo relacionamento, horas depois de ele ter sido revelado.

De algumas maneiras, esse é o arco natural, mesmo que absurdo, da vida adulta de minha geração. Em uma cascata vertical de fotos, acompanho os ex-namorados de amigas curtindo a gravidez das mulheres bem apessoadas com quem prefeririam se casar.

Às vezes sei o nome dos filhos resultantes –filhos que com certeza nunca conhecerei, mas cujas fantasias no Halloween, de princesa ou pirata, vou ver de qualquer jeito. Vejo as árvores de Natal, castelos de areia, e as mesas postas em suas casas, em ocasiões especiais. Às vezes alguém some, as imagens de jantares desaparecem: o sujeito está solteiro de novo. E eu continuo acompanhando, em uma forma de audiência passiva mas não desinteressada.

No passado, as celebridades nos obcecavam, e agora nos obcecamos uns pelos outros. Uma década atrás, eu talvez assinasse a US Weekly. Hoje nem preciso: tenho "a parada de pessoas" em meu celular. Misturo celebridades “reais” a pessoas que conheço, e posso selecionar tudo isso da maneira que preferir. Quando vi um post de Lady Gaga no Instagram, ela estava sentada no colo de seu novo namorado.

Amigos nossos da época de faculdade curtiram a imagem –assim como três milhões de outras pessoas.

Se você já buscou no Google informações sobre o novo par de um ex (seja honesto), é provável que tenha jogado um jogo consigo mesmo. Ou você está só curioso, o que é saudável, ou você quer fazer uma comparação. O ideal talvez seja que a vida do ex não tenha melhorado sem você. Neste caso, porém, tudo se inverte: como posso me comparar com alguém como Lady Gaga?

Em lugar de pensar “por que não eu?”, quando os vejo juntos, penso: “Essa era eu”. Isso demole a ilusão da celebridade.

No começo, fiquei abalada. Quando um amigo me procurou em minha mesa para discutir o assunto, minha voz tremeu. Quem quer discutir um velho relacionamento no escritório, um dia depois do Super Bowl? Por isso, decidi esperar até o meio-dia. Mas reconsiderei.

Lady Gaga é maravilhosa. Comparar-se a ela é muito motivador, e recomendo que todo mundo tente, não importa qual seja o relacionamento da pessoa com o atual namorado dela.

Pelo menos foi isso que eu fiz.

Por exemplo, eu ia usar, provavelmente pela 27ª vez, um vestido preto que comprei em uma liquidação anos atrás, para ir a um evento naquele final de semana. Mas Lady Gaga jamais o faria. Nunca tive uma roupa que custe mais do que gasto nas compras em uma semana –enquanto ela é uma mulher que usa um vestido feito de carne no tapete vermelho.

Fui a uma loja bacana que nunca havia visitado e experimentei alguma coisa. A vendedora perguntou qual era a ocasião, e respondi que havia descoberto no Facebook que meu ex estava namorando com Lady Gaga. Ela me olhou de cima abaixo, e disse: “Hummm. Mesmo?”

Sim.

O vestido era caro demais mas eu o comprei ainda assim. Por que eu aceitaria menos do que Lady Gaga?

Fui a um café. Quando perguntaram se queria um café grande, respondi que sim. Para o evento: eu queria fazer maquiagem? Nunca tinha feito, mas sim. E, sim, cílios postiços também. Quando recebi elogios por email, copiei meu chefe? Sim. Aceitei fazer a apresentação que estava me deixando ansiosa, no trabalho? Sim. Sim, sim, sim.

O ponto é que Lady Gaga está vivendo a vida ambiciosa que sempre dizemos que as mulheres devem buscar. Lembro-me de ter lido, provavelmente no Instagram, ela aconselhando: “Não deixe que ninguém no mundo lhe diga que você não pode ser exatamente quem é”. É fácil, à medida que envelhecemos, encontrar o que existe de melhor naquilo em que nos tornamos, tirar o máximo disso –e talvez até encarar a situação com alguma complacência.

Mas se Lady Gaga pode fazer o que quer, e declarar o que quer, por que não eu? Por que não permitir que “ser exatamente quem sou” signifique tentar ser o melhor que eu puder? Lady Gaga continua a se desafiar, tentar coisas novas, prosperar.

Pelo menos é o que vejo em meu celular, o lugar em que todos convergimos.

Recentemente, alguém me enviou uma foto que me mostra dançando com meu noivo em um casamento, e a postei no Instagram. Vi o namorado de Lady Gaga entre os nomes das pessoas que viram a foto, e percebi que somos iguais: desconhecidos, sorrindo diante de uma tela.

Tradução de Paulo Migliacci

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