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Com queda do consumo chinês, grifes buscam ar de nobreza para escapar da crise

Na recém-encerrada semana de desfiles em Paris, marcas se distanciam da moda de rua

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Paris

Você se lembra da invasão de moletons, tênis pesados e logos por todos os lados nas vitrines? Datou, morreu e foi enterrada pela moda.

O movimento de limpeza do guarda-roupa, que já se via ao longo das duas últimas temporadas, se confirmou nesta última semana de desfiles em Paris, recém-encerrada.

Ainda não está claro se foi por necessidade de criar atemporalidade para segurar as vendas —que, neste ano, sofrerão um baque com a desaceleração forçada do consumo chinês— ou se por puro cansaço visual, mas as marcas mais importantes da indústria preferiram o resgate dos casacos volumosos, calças de alfaiataria, vestidos de seda e saltos para dar um ar de nobreza às suas araras.

Mesmo aquelas grifes com as quais o pendor urbano combina tão bem, como a Lacoste, não respiram mais os ares da rua para conceber suas coleções. No caso da marca fundada pelo tenista René Lacoste, as quadras de tênis inspiraram a cartela que tinge os clássicos.

O marrom do piso do Tênis Clube de Paris, onde ocorreu a apresentação, o laranja, o off-white, o verde e o azul-marinho forraram blazers, calças presas a cordas e chemises de algodão fino.

Os losangos dos pulôveres, o “pied-de-poule” e o xadrez príncipe de Gales, comuns no armário dos tenistas do passado, caíram como luvas porque agora são estampas recorrentes nas passarelas.

Mesmo o crocodilo que identifica a etiqueta e é amado por brasileiros afeitos à camiseta polo, uma invenção da década de 1930 creditada à marca, aparece como um dos poucos traços de iconografia pop na coleção da estilista Louise Trotter.

O animal aparece pontualmente, maximizado em peças como uma camisa de seda combinada a uma calça folgada. A estilista inverteu a equação das polos, que em geral são mais casuais, para lhes dar verniz de luxo com golas feitas de couro.

Um dos pontos cruciais desta temporada de outono-inverno 2021 é a revisão do casual chique. Uma leitura superficial dos principais desfiles denota um pendor comercial das roupas.

Fáceis de deglutir, Dior, Saint Laurent, Celine, Hermès, Chanel e, no último dia, Miu Miu, deram vida nova a peças simples de usar, mas que vêm carregadas de detalhismo para as diferenciar nas araras.

Miuccia Prada levou conforto à coleção de sua Miu Miu, mais jovem do que a marca-mãe impressa em seu sobrenome. Ela reedita o termo “girlie”, ou menininha, vinculado à história da etiqueta e leva à passarela vários perfis de feminilidade do passado.

Das “femmes fatales” cinematográficas da estética noir, cheias de brilhos e casacos pesados, às colegiais americanas enfiadas em vestidos sem alça, agora amassados pelo tempo, ela ri do passado ao emular trajes aparentemente glamorosos, mas desgastados e desconstruídos, como se não aguentassem mais serem usados por tanto tempo.

Prada é uma provocadora, faz da roupa dita feia algo desejável. Mas aqui usa códigos de embelezamento, como aplicar pedrarias aos casacos de cashmere, cuja forma serve de casulo para os vestidos transparentes e as hotpants sexy.

O verniz militar que a estilista vem aplicando há dois anos em suas coleções, fruto de um interesse particular pelo estado de euforia da geopolítica, aparece em casaquetos, fraques e jaquetas com aviamentos dourados dos uniformes do Exército francês.

Entre as diversas referências ao cinema do passado —o espaço do desfile foi construído como uma sala de cinema de rua, com cadeiras vermelhas, tapete estampado e meia luz—, Prada pareceu fazer uma homenagem à atriz francesa Anna Karina, morta em dezembro passado.

O conjunto preto de saia preta e blusa com gola branca —bem ao estilo nouvelle vague de “Viver a Vida”, filme de Jean-Luc Godard de 1962 protagonizado pela atriz— aparece em meio à marcha de roupas inspiradas no pré e no pós-guerra, dois períodos de fantasia para a indumentária.

Essa fantasia, a vontade de olhar a roupa em seu sentido mais básico, definiu esta temporada de desfiles deformada pelo medo cego de um vírus. O escapismo sempre foi a fuga da indústria em períodos de crise, e, parece, não será diferente nesta que se avizinha.

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