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Televisão

Daniel Azulay e Turma do Lambe-Lambe marcaram infância de toda uma geração

No fim dos anos 1980, porém, um furacão chamado Xuxa acabou ofuscando seu sucesso na televisão

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São Paulo

“Corre, corre, corre, curriola, curriola, corre, corre, vem chegando o algodão doce...”

Essa musiquinha ingênua ainda deve tocar de vez em quando no cérebro de quem foi criança entre o final da década de 1970 e o começo da década de 1990. “Algodão Doce” foi o grande hit do desenhista e educador Daniel Azulay, que, naquela época, também apresentou diversos programas infantis, na Band e na extinta TV Educativa do Rio de Janeiro. O sucesso da canção gerou o bordão com que ele se despedia do público: “fiu, algodão doce pra vocês!”.

É curioso que “Algodão Doce” não tenha atravessado gerações, ou que a Turma do Lambe-Lambe —os personagens criados por Azulay, que chegaram a ter sua própria revistinha entre 1982 e 1984— não tenha se tornado fenômeno comparável à Turma da Mônica, de Mauricio de Sousa.

A culpa talvez tenha sido da própria dinâmica da televisão. Em 1986, um furacão mudou para sempre os nossos programas infantis: Xuxa, até então conhecida como modelo de revistas eróticas e namorada de Pelé. Com seu jeitão estabanado, a apresentadora falava de igual para igual com a criançada e aposentou precocemente as figuras maternas e paternas que comandavam as atrações do gênero. Daniel Azulay foi um deles. Depois de mais de uma década em evidência, ele só ganhou programas de existência breve na TV Rá-Tim-Bum e no canal Futura.

Daniel Azulay nasceu em 30 de maio de 1947, no Rio de Janeiro. Aos 21 anos de idade, já era cartunista profissional: assinava a tira “Capitão Cipó”, no Correio da Manhã. Em 1975 lançou a Turma do Lambe-Lambe, sua maior criação. O traço elegante remetia à chamada “linha clara” dos quadrinhistas belgas, e também revelava uma nítida influência de Walt Disney e dos desenhos animados das décadas de 1930 e 1940. Há algo de Betty Boop em figuras como a espevitada Damiana ou o palhaço Tristinho, de nome irresistível.

Damiana e seu namorado Pita talvez não escapassem à onda do politicamente correto. A aparência dos dois remete ao famigerado blackface —a prática, hoje condenada, de atores brancos se pintarem de preto para ridicularizar os negros. De qualquer forma, sempre reinou a harmonia entre a Turma do Lambe-Lambe, em que humanos convivem numa boa com uma coruja, uma vaca e uma galinha.

Os personagens foram para a TV, mas não em forma de desenho animado. Em seus programas, Daniel Azulay contava histórias com eles, ao mesmo tempo em que produzia ilustrações em tempo real. Ensinava técnicas complicadas de pintura e origami sem jamais perder a paciência com as crianças presentes no estúdio. Seu ar de professor ligeiramente amalucado desarmava os pestinhas.

O trabalho gráfico de Azulay não se restringiu ao universo infantil. Em 1972, colaborou com a criação da vinheta de aberta do Jornal Nacional. Em 1975, em plena ditadura militar, ficou em primeiro lugar em uma exposição de caricaturas na Grécia, por uma charge contra o autoritarismo. A charge só pode ser vista no Brasil dez anos depois, quando foi publicada no livro “Aos Trancos e Barrancos”, de Darcy Ribeiro.

Mas foi a Turma do Lambe-Lambe e o trabalho educativo que o consagraram no Brasil e no mundo. No auge do sucesso, os personagens estampavam camisetas, lancheiras, álbuns de figurinhas, selos postais, aerogramas e cartazes da Embratur. Azulay expôs suas obras na Europa, na América do Norte e em Israel. Acumulou prêmios e honrarias.

Desde 1989, mantinha a Oficina de Desenho no Rio de Janeiro, com quatro unidades na cidade e um site, oferecendo cursos para crianças e adultos. Também participou de inúmeras campanhas sociais.

Lutava contra a leucemia há alguns anos. Seu estado debilitado não foi páreo para o novo coronavírus: morreu na noite desta sexta (27), na Clínica São Vicente, no bairro carioca da Gávea.

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