Descrição de chapéu
Televisão Maratona

'Ramy', dramédia sobre um muçulmano nos EUA, vale a maratona

Seriado que rendeu Globo de Ouro ao protagonista é engraçado e muito bem realizado

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Ramy

  • Elenco Ramy Youssef, Amr Waked, Mohammed Amer
  • Produção EUA, 2019

Ramy, o personagem, acabou de transar com uma menina judia. Ela cai no sono, ele vai pé ante pé até o lixinho do banheiro, pega a camisinha usada e a enche de água para ver se não tem nenhum furo. Ela entra no banheiro e o encontra nesta cena. Furiosa e confusa, pergunta se seria tão terrível assim se ela engravidasse, afinal estava implícito que ele seria a favor do aborto.

Envergonhado, Ramy responde "sou a favor de a gente não ter que fazer essa escolha". A menina o manda embora, e esse é o fim de mais um dos encontros amorosos desse jovem de 28 anos, alter ego do comediante americano filho de imigrantes muçulmanos Ramy Youssef.


Na série, o protagonista é muito parecido com o seu criador, diretor e ator principal, como a linha de séries que começa em "Seinfeld", passa por "Louie" e desemboca em "Master of None", de Aziz Ansari, com a qual tem mais em comum.

Mas, diferentemente de todas elas, em "Ramy" o personagem central não é um comediante, então não há cenas em clubes de comédia, como nas outras. Aliás, a comédia é um não assunto, acontece naturalmente nos diálogos e nas situações em que o personagem central e os secundários se encontram.

E essas situações são quase todas inéditas nos seriados de TV, porque um personagem como Ramy simplesmente nunca existiu. Um americano de primeira geração, filho de uma mãe palestina e um pai egípcio, que tenta ser um muçulmano praticante, ou mais ou menos praticante, ao mesmo tempo em que experimenta as situações de vida de todos os garotos de sua idade.

Ele não bebe, mas faz sexo antes do casamento. Não aceita ecstasy em uma festa, mas experimenta maconha. Reza, acredita em Deus, mas não segue o comando de lavar bem os pés antes de entrar na mesquita. Despreza o tio rico e antissemita, mas vai trabalhar para ele quando perde o emprego em uma start-up que vai à falência.

Ramy escolhe suas namoradas pela vida, mas aceita a sugestão dos amigos de olhar um aplicativo tipo Tinder só de muçulmanos. Quando, em um momento, se sente sozinho e perdido, pede aos pais que arrumem uma menina muçulmana para experimentar esse negócio de namoro arranjado. Exultante, a mãe pergunta "coberta ou descoberta?". Descoberta, ele opta, referindo-se ao hijab, véu usado pelas mais ortodoxas.

É entre as duas realidades que ele navega, procurando um caminho que ainda não está traçado. Aproveita as brechas de uma família machista, que nunca pergunta a ele aonde vai à noite, ao contrário do que faz com a irmã mais nova, para viver mais ou menos como um jovem comum em Nova Jersey nos nossos tempos. Mas também segue a fé dos pais, muito mais que sua irmã, que o acusa de ser um farsante.

O que faz "Ramy" ser um dos seriados mais interessantes lançados recentemente, no entanto, não é o perfil do protagonista, mas o fato de que é um ótimo produto –bem escrito, bem pensado, bem acabado. Isso fica óbvio lá pelo quarto episódio, um dos melhores dessa leva de dez.

Nele, Ramy tem um flashback e nos leva com ele à manhã de 11 de setembro de 2001, quando todas as relações que o então pré-adolescente tem com seus amigos são chacoalhadas. De repente, ele começa a ser visto como um potencial inimigo de todos. Em uma cena hilariante, um dos meninos da escola fala para ele, entregando uma folha que estava caída no chão: "Vai atrás daquela árvore, se masturba e traz a folha de volta para provar que você não é um terrorista".

No final deste quarto episódio, que vou deixar sem mais nenhum spoiler, não há telespectador que não se convença que está diante de uma das melhores novidades recentes no streaming. E só melhora.

A série pode ser vvista pela serviço de streaming Hulu.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.