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Teatro Oficina exibe na internet 'Os Sertões', sua obra mais ambiciosa

Como faz quando enfrenta obstáculos, grupo volta os olhos ao seu repertório, enquanto resiste veto à criação do Parque Bixiga

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Fechado em casa, Zé Celso, que faz 83 anos na segunda (30), está às voltas com a próxima montagem do Oficina. Ao lado de Catherine Hirsch, Marcelo Drummond e o assistente Beto Eiras, estuda qual peça colocar em cena quando passar o surto.

Está entre adaptar "A Queda do Céu", do xamã ianomâmi Davi Kopenawa, e um novo Oswald de Andrade, "A Morta", ou talvez "Esperando Godot", de Beckett, que já dirigiu no Rio.

O espetáculo que vinha enchendo o teatro, a nova montagem de “Roda Viva”, de Chico Buarque, foi suspenso na véspera do retorno pós-Carnaval, por causa do vírus. Junto, saíram de cartaz —e perderam a bilheteria— os mais de 60 artistas e técnicos envolvidos. No mesmo dia, o prefeito “Tuma/Covas”, como descreve o diretor, vetou o Parque Bixiga aprovado pela Câmara, para o entorno do Oficina.

Como faz sempre que enfrenta obstáculos maiores, como o incêndio do teatro em 1966, o grupo volta os olhos ao próprio repertório, como forma de levantar recursos e fazer um balanço, para projetar os próximos passos.

Desta vez não são remontagens, mas a transmissão online do ciclo de cinco peças que, para muitos, é a obra mais ambiciosa do Oficina não só do período posterior à reabertura do teatro em 1993, mas desde o surgimento na São Francisco em 1958: “Os Sertões”.

A primeira peça foi ao ar no último sábado (21) via YouTube, em transmissão acompanhada de um chat com atores como Camila Mota e Igor Marotti, câmera ao vivo do Oficina. “A Terra” é aquela em que o diretor definiu como seria todo o ciclo, estabeleceu suas bases.

Estão lá as palavras torturadas de Euclides da Cunha, reproduzidas e representadas ao detalhe obsessivo, num espetáculo que é musical quase de ponta a ponta, durante suas três horas. A composição começou em 1989, daí as inúmeras canções acumuladas, compostas pelo próprio Zé e também por Celso Sim, Denise Assunção, Karina Buhr, Letícia Coura, Marcelo Pellegrini, Tom Zé, Zé Miguel Wisnik.

Também está lá a permanente resistência do teatro, desde 1980, no conflito de terras com Silvio Santos, alegorizado naquele dos sertanejos de Antônio Conselheiro, vivido por Zé Celso. É dele a direção geral, mas a equipe nos créditos finais se estende por mais de uma centena de nomes, a começar do diretor do filme, Tommy Pietra.

Construído a partir de diferentes apresentações na primeira década dos anos 2000, permite apreciar com calma alguns dos artistas que ajudaram a dar forma ao novo musical brasileiro do Oficina —contrastante com as franquias da Broadway a três quadras dali, no teatro da Time for Fun. Assim é com o samba e o cavaquinho de Coura, o trumpete e o humor de Guilherme Calzavara, a voz doce a apaixonante de Adriana Caparelli.

Mas o grande impacto de “A Terra”, na trajetória do próprio Oficina, é espelhar aquilo por que passou Euclides, ao cobrir a Guerra de Canudos e perceber que o brasileiro não era aquele branco, do Sul,
mas outro, mestiço e forte.

O Bixigão, o movimento social organizado então pelo grupo no bairro, dirigido pela atriz Sylvia Prado, levou à cena ou à pista do Oficina jovens atores como Ariclenes Barroso e Jaqueline Braga, crianças que explodiram de vez a diversidade no elenco. Muito da alegria que se percebe ao longo da apresentação se deve a eles, que cantam, dançam, brincam.

Hoje adultos, vários estiveram no chat ao vivo, na primeira apresentação, inclusive Jaqueline. Chat que volta para “O Homem”, no filme dirigido por Fernando Coimbra que vai ser transmitido em partes a partir de amanhã.

“A Terra” e os demais que forem subindo vão se manter no ar até o final da quarentena. Depois de “Os Sertões”, outros estão sendo programadas, desde “Ham-let” e “Cacilda” até, quem sabe, “O Rei da Vela”.

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