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Artes Cênicas

Em meio à inundação de lives, peça 'Fleabag' é o que resta de teatro

Espetáculo, exibido no streaming, lembra stand-up, mas elo maior é com ironia existencial de monólogos de Spalding Gray

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Não fosse a pandemia, Phoebe Waller-Bridge poderia ter recebido o Olivier de melhor atriz do teatro londrino, há três semanas. A premiação só deve sair agora no final do ano.

A indicação é referente à temporada de despedida de "Fleabag", o solo feminista ou "bad feminist", como ela fala, que disparou a carreira da fascinante atriz e autora, agora também produtora e "showrunner".

O espetáculo encerrou em setembro uma sequência intermitente de seis anos em diversos teatros, começando pelo Festival Fringe de Edimburgo, na Escócia, e terminando no West End de Londres, onde foi filmado no teatro Wyndham's.

Lembra por vezes um stand-up, mas seu elo maior é com a ironia existencial dos monólogos do ator e autor americano Spalding Gray, até porque, como ele, ela se mantém sentada quase o tempo todo e tem a solidão, afinal, como seu tema maior.

E a personagem Fleabag, "saco de pulgas", expressão usada para pessoas desagradáveis, não é a própria Waller-Bridge, como nas comédias stand-up. É uma invenção sua, ainda que ela também tenha uma irmã mais velha e uma madrasta.

Viciada em YouPorn, Fleabag se masturba descontroladamente, provoca todos à volta e é assombrada pela melhor amiga, que se matou, como se descobre, porque foi traída por ela.

Em pouco mais de uma hora, adianta praticamente toda a primeira temporada da série britânica de mesmo nome, que acaba de receber Emmy e Globo de Ouro, entre outros prêmios da televisão americana.

O espetáculo foi ao ar em setembro no projeto de teatro ao vivo do National de Londres —e é o vídeo editado dessa apresentação que saiu há duas semanas via internet, em meio à pandemia.

Neste momento em que as salas estão fechadas e se amontoam "lives" amadoras que não estão à altura dos artistas nem do público, inclusive aquelas de maior produção como a recente homenagem aos 90 anos do compositor Stephen Sondheim, é o que resta de mais próximo do teatro.

No site Soho Theatre On Demand, o aluguel de 48 horas sai por £ 4, perto de R$ 28 pela cotação mais recente, e o dinheiro vai para entidades de apoio a atores em dificuldade e para o sistema britânico de saúde, NHS, entre outros.

É talvez o melhor que se possa alcançar com a filmagem de um monólogo, com câmeras de diversos ângulos e inúmeros closes, para dar maior agilidade de edição ao vivo, além de outras com plateia a partir do fundo, explorando reações.

A qualidade resulta em parte dos mais de dez anos de experiência do National com seu NT Live. Em contraste com as câmeras limitadas de notebook das "lives" do confinamento, são até oito câmeras comandadas por um diretor em apresentação única, ao vivo, após dois ensaios.

Mas em "Fleabag" é Waller-Bridge o que realmente importa, sua inteligência sarcástica, seu olhar cúmplice e malcriado agora o tempo todo no público, em diálogo contínuo, não mais eventual como nos apartes da série.

Entre o ultraje e a tristeza, perseguindo uma dor que só vai se revelar no final, em sua atuação é possível vislumbrar um pouco além do fenômeno ou da celebridade global em que se transformou.

No Brasil, ela ocupou as principais plataformas –na Amazon, com a série "Fleabag", na Netflix, com "Crashing", no Globoplay, com "Killing Eve", em que não atua, mas escreveu e produziu, e agora na HBO, em que acaba de estrear "Run".

Nesta última, volta a trabalhar com Vicky Jones, diretora de "Fleabag" no palco, ambas também produtoras. Mas são elas antes de mais nada autoras, como indica o nome de sua companhia, DryWrite, escrita seca.

Fleabag

  • Onde ondemand.sohotheatre.com
  • Preço Aluguel por 4 libras (cerca de R$ 28)
  • Autor Solo escrito e interpretado por Phoebe Waller-Bridge
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