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Livro sobre Massao Ohno teve pesquisa criteriosa, mas falta biografia

Obra tem composição caprichada, embora seja notável a ausência de informações de sua vida pessoal

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Massao Ohno, Editor

  • Preço R$ 180 (322 págs.)
  • Autor José Armando Pereira da Silva
  • Editora Ateliê


“Massao Ohno, Editor” é fruto de pesquisa aprofundada e criteriosa do historiador José Armando Pereira da Silva sobre a atividade editorial de Massao Ohno, desde as suas primeiras produções, a partir de agosto de 1959, até as últimas, já em 2010, o ano da morte do editor. A riqueza e a beleza plástica do material reproduzido são valorizadas pela composição caprichada do volume.

Para não dizer que a obra é perfeita, senti falta de dados biográficos de Ohno. Eles não são marginais à sua produção —basta ver a predominância de nipobrasileiros com quem ele trabalhava, bem representada por outro grande editor, Jiro Takahashi, que escreve a orelha desse livro.

Cena do filme 'Massao Ohn' - Marjorie Sonnenschein

Também teria sido interessante conhecer a deriva esquisita de Ohno desde a odontologia. Embora compreensivelmente Pereira da Silva se concentre nas obras, autores e projetos gráficos, tive dificuldade até para encontrar a data de nascimento dele.

É bem sabido que praticamente tudo o que aconteceu de menos óbvio em poesia em São Paulo, durante os anos 1960 e 1970, passou de algum modo pelas mãos de Ohno, leitor entusiástico e designer de gosto refinado. Ele editou boa parte daquela que ficou conhecida como Geração 60, publicada no volume “Antologia dos Novíssimos”, de 1961, e cujo núcleo está documentado no belo filme de Ugo Giorgetti “Uma Outra Cidade”.

Roberto Piva, Antonio De Franceschi, Décio Bar, Cláudio Willer, Eunice Arruda, Lindolf Bell, Eduardo Alves da Costa, Neide Archanjo, Jorge Mautner, Bruno Tolentino, Álvaro Alves de Faria, Rodrigo de Haro, Carlos Maria de Araújo, Renata Pallottini, Hilda Hilst, entre tantos outros, foram todos editados por Massao Ohno.

Sua figura sedutora de samurai estava tão acima das disputas locais que, no mesmo ano de 1962, publicou “Antologia Noigrandes 5”, dos concretistas, e “Lavra, Lavra”, de Mario Chamie.

Ohno também editou muita gente que posteriormente teve carreira acadêmica reconhecida, como Roberto Schwarz, István Jancsó, Carlos Vogt, Carlos Felipe Moisés, Rubens Rodrigues Torres Filho e Manuela Ligeti, o que talvez traduza um momento da história intelectual brasileira no qual a universidade e a cultura literária estavam mais afinadas.

O núcleo do interesse de Pereira da Silva, porém, não é apenas literário, mas também plástico, como era o de Massao, que tinha em suas produções a colaboração de alguns dos melhores artistas em atividade no Brasil.

No período inicial da editora, que é o mais destacado no livro, trabalham com ele figuras como João Suzuki, Acácio Assunção, Cyro Del Nero, além de artistas de origem japonesa, como Manabu Mabe, Tomie Ohtake, Kazuo Wakabayashi, entre outros.

Pereira da Silva também se ocupa da produção editorial de Ohno ligada ao cinema, a sua associação com a editora carioca Civilização Brasileira, entre outros assuntos. Mas surpreendente mesmo é saber que Ohno atinge a casa dos mil títulos publicados.

Peço licença para encerrar a resenha com dois testemunhos pessoais. O primeiro é que, quando iniciei a organização das “Obras Reunidas” de Hilda Hilst, falei com Ohno e ele foi talvez a pessoa mais animada e encorajadora que pude encontrar. Nem por um segundo se preocupou com o fato de alguém estar começando novas edições das obras que havia editado. Mesmo porque sabia que nada tiraria delas nem o pioneirismo nem a beleza insuperável da sua produção gráfica.

O segundo é que toda vez que a própria Hilda Hilst terminava um livro e logo surgia o nome de Ohno para editá-lo, ela invariavelmente se queixava, a despeito da amizade genuína, de que ele, após fazer os livros, escondia-os debaixo do próprio colchão. Dizia isso sempre de maneira hilária, encenando o desdém de Ohno com a distribuição dos livros que editava magnificamente.

De fato, essa maneira de Ohno conceber a edição de livros, inteiramente dedicada à criação gráfica, e esquecido da distribuição e de outros aspectos do negócio, aparece no livro de Pereira da Silva, que o descreve como um editor de “espírito boêmio”, em que prazos, distribuição e prestação de contas não eram o seu forte. Era um editor-artista, para o qual o livro é a obra. E basta.

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