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Televisão Maratona

Série mostra jovem que foge de comunidade judaica ultraortodoxa

'Nada Ortodoxa' retrata bem o passado da protagonista, mas idealiza demais o presente

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Nada Ortodoxa

  • Classificação 14 anos
  • Elenco Shira Haas, Amit Rahav, Jeff Wilbusch
  • Produção Alemanha, 2020
  • Direção Maria Schrader

Imagine morar num lugar onde todos se conhecem, onde rola uma fofocaiada geral, onde não se tem acesso à internet. Só pode ser uma cidade muito pequena e isolada, né?

Não nesse caso. Trata-se do Brooklyn, em Nova York, mais especificamente de Williamsburg, epicentro artsy, hispster e cool. Lá também mora uma comunidade hassídica, de judeus ultraortodoxos, que vive totalmente (ou pelo menos tenta) desconectada do mundo ocidental. Todos falam iídiche, ritos religiosos são seguidos com rigor e às mulheres não cabe nada mais que cuidar da casa e dos filhos.

É nesse contexto que se passa “Nada Ortodoxa”, minissérie em quatro episódios, inspirada no livro de memórias da escritora Deborah Feldman, que fugiu dessa comunidade.

O primeiro plano da minissérie é bem instigante do ponto de vista emocional. Vemos Esty, a protagonista, olhando pela janela. Supomos que ela está à procura de algum tipo de liberdade. Logo entenderemos que ela pretende fugir do próprio entorno. Em geral, uma decisão forte e complexa
do protagonista acontece mais à frente na narrativa, para o espectador sentir junto o que levou a tal atitude. Nesse caso, não. A resolução já foi tomada, e nos resta entender por quê.

É uma escolha dramática arriscada e, aqui, funciona de um lado e erra a mão no outro.

A partir da fuga desesperada de Esty para Berlim, surgem duas subtramas, que andam em paralelo —os flashbacks até o momento de sua partida e as dificuldades enfrentadas por ela na capital alemã.

Ver e analisar, pela ótica feminina, como funciona esse tipo de comunidade, vivendo numa redoma dentro de uma metrópole, talvez seja a experiência mais interessante da série. A forma seca e subalterna como as mulheres são tratadas, o noivado arranjado, o ritual de casamento, a falta de privacidade e de voz própria.

Tudo isso é muito bem retratado. Fica explícito que todos precisam pensar e agir da mesma maneira. E Esty sempre se sentiu diferente, apesar de tentar viver, ao menos no início do casamento, como uma típica ortodoxa.

Já a outra parte da trama, bem… Berlim é incrível visualmente —e, a título de curiosidade, a série foi toda filmada lá, incluindo a parte americana. Mas fica difícil comprar o desenrolar da história ali, apesar de ter bons momentos e um evento final tocante.

A vivência de Esty na capital alemã parece romantizada demais. Ela chega, rapidamente fica amiga de uma rapaziada modernete ligada à música —que por acaso é uma de suas paixões reprimidas— e, com mesma velocidade, vai se achando como pessoa, tirando a peruca, comprando roupas, fazendo reflexões expositivas.

A sensação é de que o roteiro tem soluções fáceis, em vez de entrar no drama de fato. Um exemplo claro é quando ela vai usar o Google pela primeira vez na vida, o que poderia ter muitas implicações,
mas é resolvido com um diálogo de menos de um minuto.

Além disso, como a decisão dramática principal da protagonista ocorreu na primeira cena, suas escolhas não têm tanta força emocional em Berlim. Até mesmo a perseguição de seu marido, Yanky, ao lado de Moishe, o parente ovelha negra da comunidade, para trazê-la de volta ao Brooklyn, não gera tanta tensão.

Mesmo com seus problemas, “Nada Ortodoxa” merece ser vista pela riqueza cultural. Para quem quiser se aprofundar nesse assunto, existe o documentário “One of Us”, também da Netflix, que apresenta de forma detalhada, e mais realista, as dificuldades de se desligar de uma comunidade hassídica, principalmente para as mulheres.

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