Descrição de chapéu The New York Times

Vendas de livros infantis disparam com crianças aprendendo de casa

Cadernos de atividades encabeçam lista da Amazon enquanto resto do mercado editorial afunda

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Nova York | The New York Times

O livro mais vendido na Amazon no momento vem com um certificado de conclusão para os leitores. “Ótimo trabalho! Você é o número um!”, ele diz.

É um livro de atividades de 320 páginas para crianças de entre três e cinco anos de idade, concebido para ajudá-las a dominar formas, cores e letras do alfabeto, e recentemente disparou para o topo das listas de mais vendidos, superando romances de sucesso como “Um Lugar Bem Longe Daqui” e “Pequenos Incêndios por Toda Parte”.

“Tão divertido! E também ajuda com o estudo caseiro das crianças, nesses tempos de Covid-19”, afirmou um comprador em uma resenha que dava cinco estrelas a uma publicação do tipo.

Não surpreende que livros como esse estejam subitamente sendo vendidos em grande quantidade. Escolas em todo o território dos Estados Unidos estão fechando as portas num esforço para desacelerar a difusão do coronavírus, e milhões de pais se veem presos em casa com crianças entediadas e irrequietas. E além de alimentar e entreter os filhos, os pais agora também precisam pensar em educá-los.

Escolas de todo o país criaram salas de aula virtuais, mas muitos pais parecem estar se voltando a soluções analógicas. As vendas de livros de exercício de escrita e leitura, livros de atividades, fichas de estudo e guias para experiências científicas caseiras dispararam depois do fechamento das escolas.

As vendas de livros infantojuvenis de não ficção nas categorias de educação, referência e linguagem subiram em quase 40%, na semana encerrada em 14 de março, de acordo com a NPD BookScan. Entre os títulos mais vendidos estão “Big Kindergarten” (para o jardim de infância) e “Big Second Grade” (destinado a alunas do segundo ano), da School Zone Publishing. “Pedidos feitos por pais não param de chegar”, disse Jonathan Hoffman, presidente e presidente-executivo da School Zone.

A performance dessa categoria de títulos contrasta com a da maioria das editoras, para as quais este é um período péssimo. As vendas de livros físicos de todas as categorias caíram em 10% no período, uma queda provavelmente causada pelo fechamento de empresas e pelas medidas de distanciamento social. A ficção infantil registrou queda de vendas de 15% na semana encerrada em 14 de março, e a ficção adulta caiu em 4%, de acordo com a NPD.

Como outros negócios, o setor editorial vem sofrendo abalos com o tumulto econômico causado pela pandemia. Com o fechamento de shopping centers e um número crescente de governos estaduais ordenando o fechamento de empresas não essenciais, grandes cadeias de livrarias como a Barnes & Noble estão enfrentando problemas. Cada vez mais livrarias independentes estão fechando as portas temporariamente e dispensando empregados.

Cerca de metade dos títulos na lista de cem livros físicos mais vendidos pela Amazon são livros infantis e livros de atividades, com títulos como “Little Kids First Book of Why” (primeiro livro de perguntas para as crianças) e “Awesome Science Experiments for Kids” (experimentos científicos incríveis para crianças).

“Esse é um nível de demanda que não havíamos visto antes”, disse Dan Reynolds, presidente-executivo da Workman Publishing, que publica livros educacionais como "Brain Quest" (desafio do cérebro) e a série "Big Fat Notebook" (caderno grande e gordo).

Nas últimas duas semanas, a Workman ordenou novas tiragens da ordem de 3 milhões de cópias, para títulos dessas duas séries, a fim de atender a grandes pedidos da Amazon, Barnes & Noble, Costco, Target, Walmart e livrarias independentes, bem como pedidos vindos do Canadá e do Reino Unido, disse Reynolds. A editora também pediu mais 985 mil cópias de sua série de livros de atividades "Paint by Sticker" (pinte com adesivos).

Demonstração da aula de colorir livros de pintar, ministrada pelo artista plástico e professor Walter Miranda em seu ateliê no bairro do Sacomã, em São Paulo - Olga Lysloff - 14.jul.2015/Folhapress

Rene Holderman, comprador de livros infantis para a livraria Third Place Books, em Lake Forest Park, no estado de Washington, disse que os clientes começaram a comprar títulos da série "Brain Quest" e livros de arte e artesanato depois que as escolas públicas e privadas do estado receberam ordem de fechar, em 13 de março. Um cliente gastou US$ 200 (R$ 1.020) em livros de atividades para crianças em uma só visita, disse Holderman.

O interesse dos compradores era tão forte que Holderman criou uma bancada para exibir livros de atividades e de artesanato para crianças na loja, que fechou provisoriamente na tarde de segunda-feira depois que o governador decretou que as pessoas ficassem em casa.

A editora Scholastic viu uma disparada nas vendas de suas séries "Scholastic Early Learners", "Bob Books" e em suas fichas de estudo. Elas cresceram 70% durante a semana encerrada em 14 de março, se comparadas ao mesmo período no ano passado, disse uma porta-voz.

A Scholastic e outras editoras de livros infantis também decidiram oferecer mais materiais gratuitos aos pais e professores. No começo do mês, a editora relaxou as restrições de uso de seus livros e permitiu que professores e escritores os lessem em voz alta online pelo restante do atual ano letivo. Também criou um site de acesso gratuito chamado Scholastic Learn at Home que inclui tarefas de leitura, escrita e raciocínio para crianças em idade escolar.

Desde o lançamento do site, em 17 de março, ele contabilizou cerca de 30 milhões de visualizações de páginas.

Lauren Tarshis, vice-presidente sênior e editora chefe da Scholastic Classroom Magazines, disse que quando as primeiras escolas fecharam, no começo de março, a companhia começou a preparar recursos para educadores que teriam de criar currículos para aulas online rapidamente, bem como para os pais que se veriam na situação de ensinar os filhos em casa.

“Você não só se vê subitamente transformado em professor como tem de administrar um grande estresse, enquanto trabalha de casa”, ela disse.

Noemi Fleming, que trabalha para uma companhia de software e vive em Columbus, no estado de Ohio, adquiriu alguns livros "Brain Quest" para a filha Viviana, de cinco anos, cuja pré-escola particular fechou.

Fleming e o marido, que trabalha na área de tecnologia da informação no Departamento de Defesa americano, se revezam cuidando de Viviana durante o dia, e instalaram seus computadores na sala de brincar da filha, onde os três ficam sentados na mesma mesa. Enquanto os pais enviam emails e trabalham de casa, Viviana enche cinco ou seis páginas de seu livro de atividades "Brain Quest". “Ela diz que esse é seu trabalho”, afirma Fleming.

A mãe conta que foi necessário algum esforço para convencer sua filha a levar a sério as tarefas do livro de atividades e para que ela deixasse de rabiscar as páginas todas. “Nós lhe contamos uma mentirinha inofensiva”, disse Fleming. “Dissemos que o professor verificaria o livro.”

Tradução de Paulo Migliacci

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