Alok, o DJ mais pop do país, foi batizado por guru indiano e viveu em cortiço hipster

Filho de DJs, ele trabalhou em boate em Londres e superou depressão antes de virar coqueluche da classe média e da TV

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retrato do DJ

O DJ mais famoso do Brasil, Alok Divulgação

São Paulo

Alok, o DJ, não conhecia até uma semana atrás, a música “Evidências”, uma das canções mais populares do Brasil, da dupla sertaneja Chitãozinho & Xororó. “Fui conhecer agora, acredita nisso? A galera pediu na live, fui ver e toquei sem saber a letra.”

Transmitida em parte pela Globo, sua live no último fim de semana alcançou 27 milhões de pessoas na TV, com luzes e pirotecnia, além da música, na sacada de sua casa, em São Paulo. No YouTube, Marília Mendonça e Jorge & Mateus bateram recordes com mais de 3 milhões de acessos.

Mais do que mostrar a diferença de alcance entre TV e YouTube, a transmissão apresentou o DJ para muita gente que não o conhecia. Mas Alok não ficou famoso agora.

retrato do DJ
O DJ mais famoso do Brasil, Alok - Divulgação

O ápice de seu sucesso aconteceu há quatro anos, quando ele lançou a música “Hear Me Now”, um pop com piano no estilo Coldplay e assobios que não saem da cabeça, e a faixa acabou sendo ouvida em todo o mundo. Desde então, ele só ficou mais conhecido.

Alok também se apresentou no Rock in Rio no ano passado e agradou tanto que é o único nome confirmado na próxima edição do festival. Mais do que isso, costuma transitar entre festivais de funk e de sertanejo, faz sucesso na Ásia e já teve suas músicas lançadas por um selo holandês.

Mas a história de como um DJ de música eletrônica chega a um espaço tão tradicional como o horário nobre da Globo não é tão improvável quanto sua própria trajetória.

“Para mim, o que é natural às vezes não é para você”, diz Alok, em quarentena, em seu estúdio caseiro em São Paulo, falando pelo Zoom sobre a criação incomum que teve na infância. “Era minha realidade, não achava que era fora da curva. Só comecei a entender isso quando entrei de fato para a sociedade, com 12 anos.”

Ele fala sobre quando se mudou de Alto Paraíso, na Chapada dos Veadeiros, para Brasília. Lá, começou a frequentar um ambiente mais urbano. Nascido em Goiânia, em 1991, Alok Petrillo teve uma vivência bastante incomum, incluindo o período nas cachoeiras e outro na Holanda, quando ele, a mãe, a tia e o irmão gêmeo moravam numa espécie de cortiço cosmopolita, ocupando um hospital abandonado.

Foi essa viagem que mudou a história da família. Adriana Peres Franco, mãe do DJ, trabalhava limpando banheiros numa balada chamada Trance Buddha. Ao mesmo tempo, sua tia começou a namorar um funcionário de gravadoras.

“Ela gostava do som, e o cara dava vinis a ela”, diz Alok. “Um dia, meu irmão quebrou o violão de um cara que morava ali. Meu pai, que tinha ido até lá, deu a guitarra dele e trouxe os vinis. É literalmente isso —largou a guitarra pelo vinil.”

Sua mãe, Adriana, ou DJ Ekanta, e seu pai, Juarez Achkar Petrillo, o DJ Swarup, acabaram sendo pioneiros do psy trance, estilo de música eletrônica, no país. Eles fundaram e tocam até hoje o Universo Paralello, festival eletrônico com pegada hippie e alternativa que acontece todo ano na praia de Pratigi, na Bahia.

Quando Alok foi a Brasília, os pais já eram separados. “Foi quando comecei a entender que, na real, de onde eu vim que era diferente. As pessoas apontavam o dedo e eu caí nessa armadilha. Comecei a querer um pai que tivesse uma vida normal. Perguntavam ‘seus pais fazem o quê?’, e eu dizia que eram DJs. ‘Como assim DJs?’ Aí comecei a mentir que meu pai era empresário.”

Ele se lembra da casa em que morava nessa época. “Era meio hippie mesmo. Não tinha sofá, era só tapete. Som alto. Meu pai chegando na hora que a gente estava acordando.”

O nome de Alok, assim como o do irmão, e os codinomes de DJ dos pais, foram dados pelo guru espiritual Osho, hoje bastante conhecido pela série “Wild Wild Country”. “É uma visão distorcida. Igual a minha história contada por alguém que não gosta de mim”, ele diz, sobre a produção da Netflix. Em viagem à Índia, os pais de Alok encontraram Osho, que sugeriu os nomes.

A primeira vez que Alok discotecou foi aos nove anos, e o ambiente de festas, a vida de DJ e os programas de produção sempre foram próximos. Mas ele chegou a cursar dois anos de relações internacionais antes de seguir a carreira de DJ.

“Chega uma hora que você passa a questionar. Meu pai passando dificuldades, minha mãe passando dificuldades, todos os amigos DJs deles passando dificuldades. Será que eu vou seguir esse caminho?”

Alok e o irmão, Bhaskar Petrillo, foram a Londres com a ideia de se estabelecer na cena com o duo Logica, tocando psy trance. Mas a aventura não durou muito —Bhaskar desistiu da ideia. “Eu queria ser mais comercial e ele queria ser mais underground.”

O DJ acabou não conseguindo as apresentações solo que queria. “Estava cheio de shows lá fora, minha música estava no top três global de psy trance num site que era referência. De repente, me vi trabalhando no bar. Não tinha mais a dupla, meu pai tinha tomado muito prejuízo no Universo Paralello, estava quebrado. Trabalhava na mesma balada em que eu tinha tocado.”

De volta ao Brasil, há dez anos, ele iniciou o projeto que leva seu nome. Foi quando começou a se aproximar mais do pop e do house. A música que mudou sua vida era uma composição indie do músico Zeeba —vocalista da faixa do DJ, de 2016— que se transformou nas mãos de Alok.

Com mais de 300 milhões de acessos no YouTube e outros 400 milhões no Spotify, “Hear Me Now” se tornou um dos poucos hits brasileiros a ultrapassar fronteiras continentais.

Chegou ao top 200 do Spotify de 45 países, incluindo os Estados Unidos e vários da Europa. Fora o sucesso dele na China, onde faria turnê neste ano —fama que, junto ao nome, fez com que ele fosse confundido com gringo muitas vezes.

A música foi rejeitada por grandes gravadoras no Brasil, até que ele a ofereceu ao selo holandês Spinnin’. “DJ nacional lançar música por eles era algo inalcançável”, diz. A faixa acabou transformando a vida de Alok, não só por viabilizar a carreira, mas pela carga emocional envolvida em seu lançamento.

“Achava que era muito pop. Era um som que eu queria fazer, no estilo Coldplay, mas tinha medo de ser julgado pela cena. Foi depois de ‘Hear Me Now’ que comecei a tocar no [festival sertanejo] Villa Mix, a migrar para outros lugares. Foi ali que falei —vou fazer uma parada minha, do meu coração.”

Dois meses antes da faixa sair, Alok vivia sua última crise de depressão. “Tive algumas depressões meio punk na vida. Sempre vinha a mesma pergunta —o que vem depois da morte? Não tinha resposta. Na minha última depressão, percebi que não estava com medo de depois da morte, eu já sabia que existe algo. Eu queria saber o sentido da vida.”

“Hear Me Now” foi a entrega definitiva de Alok ao pop, quando ele percebeu que se sentia mais realizado em animar uma plateia enorme do que estar na vanguarda de algum movimento. Hoje, seus sets contam até com remixes de músicas brasileiras muito conhecidas, de Alceu Valença a Legião Urbana —além de Chitãozinho & Xororó.

O sucesso de Alok é resultado de transformações da música pop. Está atrelado ao crescimento de DJs muito populares no mundo, de David Guetta a Tiësto, que passaram a ocupar o centro do palco. Festivais de música eletrônica mainstream, como o Tomorrowland, vieram ao Brasil, enquanto o Lollapalooza começou a dedicar palcos maiores só ao gênero.

Por aqui, os DJs são centrais em movimentos populares como o funk 150 BPM carioca e o do funk-rave paulista.

Hoje, Alok tem pouca relação com o underground de onde veio e onde ainda estão os pais —nem com a cena de festas de techno e house dos grandes centros urbanos do país.

“Ele não entraria tocando o set dele no circuito underground. Não teria espaço, a não ser com outro tipo de som”, diz o DJ carioca Millos Kaiser, que integrava a dupla e a festa Selvagem.

“Ele ganhou esse espaço por uma série de fatores, mas cumpre muito bem esse papel de maior DJ do Brasil. E ele desejou estar lá —o que faz toda a diferença. Tem muitos DJs muitos bons que não querem estar nesse espaço. Não querem ir ao ‘BBB’, estar na Globo.”

Mesmo assim, Alok continua emplacando no circuito mainstream da música eletrônica. Até criou o selo Controvérsia para lançar suas músicas menos comerciais, enquanto mantém parcerias com as grandes gravadoras para as mais pop.

Hoje, ele ajuda 20 mil crianças em países da África. Acredita em Deus, é fã de Chico Xavier como humanista e crê que sua missão —tal qual o significado do seu nome— é iluminar as pessoas, levar alegria a elas com sua música. Também não usa drogas. Tomou ayahuasca duas vezes —uma quando tinha nove anos de idade— e bebe vinho de vez em quando.

“Não tem como esconder isso [o uso de drogas]. É a minha verdade. Não julgo quem usa, acho que é uma escolha individual. Venho de uma criação em que tive acesso a tudo, nunca foi um tabu. Então, nunca tive curiosidade de ir atrás porque não era nada proibido.”

Seu perfil, é inegável, o torna palatável a espaços mais tradicionais como a Globo e eventos de classe média, longe do estereótipo de libertinagem ainda atrelado ao circuito eletrônico.

O objetivo é fazer música eletrônica para todos —as crianças e os idosos, os sóbrios e os crentes. “Acima de tudo, as pessoas seguem o Alok não porque é eletrônico ou forró. É pelo Alok, a pessoa”, diz o DJ, falando em terceira pessoa. "Não precisa ser espírita para curtir o Chico Xavier. Não precisa gostar de droga nem de eletrônica para curtir o Alok.”

Erramos: o texto foi alterado

Uma versão anterior deste texto informava que a live de Alok transmitida pela TV Globo ocorreu num domingo. O evento foi num sábado. A informação foi corrigida. 

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