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Drake volta soturno em disco com clima e passinho da quarentena

Crooner da era do AutoTune, rapper canadense se vê solitário na mixtape 'Dark Lane Demo Tapes', que traz hit do TikTok

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Dark Lane Demo Tapes

Vestindo um moletom preto, Drake cobre todo o rosto na capa de “Dark Lane Demo Tapes”, seu mais recente lançamento, deixando só os olhos à mostra. A imagem, além de fazer referência às máscaras usadas durante a pandemia de coronavírus, é granulada e esverdeada, como uma foto analógica, e reflete o clima da nova mixtape do cantor.

Numa era em que formatos de discos estão cada vez mais fluidos —além de álbuns, Drake já lançou playlists e mixtapes, por exemplo—, o rapper embala 14 faixas como prévia de um novo disco de inéditas, previsto para este ano. Pouco ambiciosa, a mixtape parece reunir faixas que não entrariam num álbum oficial do rapper, mas mostram onde está sua cabeça numa época de isolamento social.

drake com moletom cobrindo o rosto quase todo
Capa de mixtape 'Dark Lane Demo Tapes', do rapper canadense Drake - Reprodução

Em “Dark Lane Demo Tapes”, Drake destaca seu lado mais soturno, num lançamento mais alinhado a “After Hours”, disco recente do conterrâneo The Weeknd, do que ao pop animado de Dua Lipa, para ficar em álbuns deste ano. Também remete aos trabalhos menos pretensiosos do cantor, como “More Life”, de 2017, do que a seu disco mais recente, “Scorpion”, de 2018.

Na faixa “Chicago’s Freestyle”, ele conta com os vocais doces do cantor de R&B Giveon enquanto procura contatos antigos no celular, lamentando os próprios hábitos tóxicos em romances. Na triste e atmosférica “Not Too You”, com backing vocals de Chris Brown, Drake se vê sozinho e até carente, criando cenas com as quais muita gente deve se identificar na quarentena. “Confiar em quem?”, ele pergunta. Depois repete que a situação “dói profundamente”.

Em “When to Say When”, o rapper recupera as vozes agudas do sample —uma edição acelerada da música “Sounds Like a Love Song”, de Bobby Glenn, de 1976— originalmente usada em “Song Cry”, clássico triste de Jay-Z de 2001. Enquanto pesa a fama e as próprias conquistas, ele—numa das muitas letras autorreferentes— diz que “encho as paradas com minha dor”.

Drake é um crooner da era do AutoTune, um cantor romântico moderno, que não tem vozeirão e geralmente está mais inconformado com os amores não correspondidos ou relacionamentos que deram errado do que celebrando as próprias paixões.

Em “Dark Lane Demo Tapes”, há mais do Drake sereno das antigas “Passionfruit”, “Too Much” ou “Jungle” do que a celebração da vida de “God’s Plan”, suas faixas dançantes com Rihanna ou o pop chiclete de “Hotline Bling” e “In My Feelings”. Mesmo o Drake confiante de “Legend” e “Started From the Bottom”, entre outras, dá as caras poucas vezes na mixtape recém-lançada.

Depois de cerca de uma década de sucesso mainstream, a estética de Drake já está tão inserida no pop que é difícil saber o que é influenciado por ele ou o que ele pega de outras pessoas. O canadense é conhecido por surfar no sucesso de tendências do pop, de apostar no dancehall porque Justin Bieber teve sucesso com a estética a gravar um remix recente de “Ela É do Tipo”, do funkeiro brasileiro Kevin O Chris.

Agora, ele chama Playboi Carti, trapper minimalista de Atlanta, que empresta sua estética, com uma textura vocal alienígena para “Pain 1993”. Em “Demons”, conta com os MCs Fivio Foreign e Sosa Greek para uma incursão pelo drill —estilo de trap influenciado pela música eletrônica britânica— de Nova York.

Há ainda uma colaboração pouco inspirada com Future em “Desire”, e o momento mais animado da mixtape é “D4L”, típico trap de Atlanta com Future —novamente—, Young Thug, graves robustos, sons de sirene e melodia sintética.

Dono de uma produção prolífica, Drake sabe que tem de continuar lançando músicas para multiplicar seus números e se manter no reinado das paradas pós-streaming. Mas, no meio do sentimentalismo e a atmosfera nebulosa, há um verdadeiro hit.

“Toosie Slide”, pop leve e dançante, parece ter sido feita para o TikTok. O clipe da música, já com mais de 70 milhões de visualizações, traz Drake sozinho e em quarentena, fazendo em sua mansão os passinhos que viralizaram na plataforma de vídeos curtos.

“Posso dançar como Michael Jackson”, ele canta, e depois anuncia os passos da dança. “Pé direito para cima, pé esquerdo desliza.” Parece um pagodão baiano do fim dos anos 1990, só que sem o bom humor, o apelo da percussão e o calor.

Em “Toosie Slide”, na verdade, Drake faz o passinho da quarentena —lento, frio, bobo e solitário. De certa forma, ele está novamente cantando os tempos em que vivemos.

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